" Nos anos 50, Urbano, um faquir que jejuava trinta dias encerrado numa urna de vidro, esteve em Curitiba.
UM FAQUIR EM CURITIBA ANTIGAMENTE
" Nos anos 50, Urbano, um faquir que jejuava trinta dias encerrado numa urna de vidro, esteve em Curitiba.
Instalou-se num terreno baldio da esquina da Ébano Pereira com a Avenida João Pessoa, numa improvisada construção de madeira, mal e porcamente apoiada nas bordas do canal do Rio Ivo, cujo fedor de carniça se harmonizava e complementava a esquálida figura do faquir dentro de uma caixa de vidro.
O caixão de vidro era fechado por inúmeros cadeados, cujas chaves, que se presumiam únicas, ficavam sob guarda dos notáveis da cidade; chefe de polícia, prefeito, jornalistas, garantindo a lisura do jejum.
Seja por pura picardia, seja porque considerássemos sua fome ostensiva uma concorrência desleal a nossa, intimista, mas não menos intensa, Urbano conquistou instantaneamente a antipatia dos estudantes da CEU, a casa do Estudante Universitário, então localizada na Avenida, entre o Cine Ópera e o 'show-room' do faquir.
Cotizamo-nos e, na seção de 'Perdidos e Achados' da Gazeta, publicamos um anúncio: "Perdeu-se uma carteira de dinheiro no trajeto entre o Cine Ópera e o Restaurante Elite. Quem devolvê-la será regiamente recompensado. Procurar o faquir Urbano".
Depois criamos uma comissão de fiscalização que, revezando-se, vigiava o faquir 24 horas por dia. Passados alguns dias, devido ao alto custo da operação, para não falar no sono e na preguiça, a comissão de fiscalização dissolveu-se...
Num sábado de madrugada, voltando o Ernani Farias e eu de algumas incursões na 'Zona da Coréia', paramos no Bar Triângulo, compramos um cachorro quente e fomos comê-lo na tenda do faquir. A urna de vidro repousava sobre dois cavaletes cobertos por veludo vermelho. Dentro dela, vestindo um pijama de seda preta com gola "roulé"nbranca e sapatilhas vermelhas, o faquir repousava numa cama de pregos e acariciava uma jibóia.
À primeira dentada no cachorro quente, o cheiro da mostarda espalhou-se pelo recinto... O Urbano ficou mais amarelo ainda, virou o rosto para o lado e, com um grunhido agônico capotou. A assistente chamada Íris, com sotaque argentino, nos expulsou aos berros.
No dia seguinte formalizou uma queixa à presidência da CEU, que nos proibiu de repetir a proeza sob ameaça de expulsão.
Hoje, quarenta anos passados, ao reunir estas lembranças, uma dúvida tardia me assalta:
- Como é que eles faziam para dar comida para a jibóia ? "
(Texto do engenheiro Paulo da Nova, publicado em Histórias de Curitiba)
Paulo Grani
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