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sábado, 17 de dezembro de 2022

Histórias de Curitiba - Brincalhão até a morte

 

Histórias de Curitiba - Brincalhão até a morte

Brincalhão até a morte
José Cadilhe de Oliveira

Foi inegavelmente um homem feliz.
Ferroviário de profissão, trabalhou na "sua querida Rede", como sempre dizia, por quarenta anos.
Mas exerceu inúmeras outras atividades, desde vendedor até "guarda-livros", função atualmente conhecida como contabilista, que teve num orfanato.
Foi ainda treinador de futebol - dirigiu por muito tempo o poderoso Ferroviário.
Todavia se realizava mesmo era no carnaval, quando saia, invariavelmente, pela "Embaixadores da Alegria", fantasiado de Rei.
Nunca chegou oficialmente a ser "Momo" da folia curitibana, mas, com toda segurança, sempre se apresentou com fantasia mais rica e bela que o Rei oficializado para o Carnaval da cidade.
Com "sua querida Rede" envolveu-se em inúmeros episódios tragicômicos.
Lembro quando botou para correr um diretor da Rede que , segundo ele, fazia de tudo para atrasar sua aposentadoria.
Prometia ao diretor um "corridão e surra em via pública". Não deu outra.
Logo que se aposentou encontrou com o diretor em uma tradicional farmácia, em pleno centro de Curitiba. O ilustre engenheiro, que conhecia as façanhas de seu ex-subordinado, saiu correndo pela rua XV tentando chegar ao escritório da Rede, no Edifício Garcez.
Para escapar entrou no Braz Hotel, na época com a primeira porta-giratória do Sul do Brasil, como faziam questão de anunciar.
Não teve surra mas o corridão... Outra vez aprontou com outro colega da Rede, também figurão, de cargo elevado. É que corria a fama que a esposa de nosso protagonista era excelente qui-tuteira. Não raros foram os amigos que desfrutaram de almoços preparados por D. Olímpia.
Chegou o dia em que Agostinho (era o apelido desse colega da Rede ) reclamou um convite, logo aceito pela brincalhona figura.
Quando se aproximava perto da casa, nosso focalizado falou: "Não avisei a Olímpia e ela pode não estar trajada para receber um estranho.
Sabe como são as mulheres...".Assim, pediu para Agostinho que esperasse do lado de fora, até que fizesse um sinal de que
tudo estava preparado.
Dado o sinal, Agostinho avançou e tocou a campainha.
Foi atendido pela empregada que disse: "O senhor é quem vem para almoçar?
Então espere um pouquinho". E logo voltou com um prato e uma colher de sopa. "Taí, pode sentar na soleira da porta". Os gritos de Agostinho ainda ressoam pelos arredores da casa, próxima à Igreja do Guadalupe. O restabelecimento da amizade levou seis meses e isso graças a interferência dos colegas.
Tudo, porém, sem almoço reparador...
Este era Nélson Gonçalves, homônimo do famoso cantor.
Ele chegou a promover espetáculo até o final de sua vida.
Quando morreu, foi velado em sua própria casa, nesta época situada na Rua Comendador Macedo.
Minutos antes da saída do féretro, correria geral.
Os amigos que aguardavam na calçada logo pensaram que mais uma peça teria pregado Nélson Gonçalves.
Foi um grande susto. E que como a casa estava repleta de gente o assoalho cedeu e afundou com a multidão por cima.
Ninguém saiu ferido, salvo algumas ligeiras escoriações. O enterro seguia apressadamente e Nélson foi sepultado dignamente.
Todos diziam que este fato foi a "última"proeza dele.
Figura cômica que pelo modo de encarar a vida marcou época e deixou saudades.

José Cadilhe de Oliveira é advogado.


Fonte: Historias de Curitiba Paraná.