quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Hare Krishna

 Hare Krishna

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O Turistória começa a explorar um  novo mundo e trazer um pouco mais de compreensão e respeito para manifestações religiosas que temos em Curitiba...
Decidimos começar a explorar essa lacuna cultural-religiosa com os Hare Krishna, pois em uma cidade majoritariamente cristã, poucos sabem sobre a religião com origens hinduístas que distribui mais de 200 (duzentas!) refeições todos os dias para quem precisar.  

Pois bem, cá estamos nós em pleno centro histórico, na esquina das ruas Treze de Maio e Duque de Caxias, observando a fachada de um prédio com construção antiga, porém muito colorido e marcado com ilustrações, símbolos e versos pouco familiares. 

Ao tocar a campainha, logo somos atendidos por um prabhu (mestre) sorridente, dizendo “Hare Krishna” como se fosse um bom dia, ou um olá. Percebemos ali que aquele prédio é mais do que um templo de uma religião desconhecida, é um oásis cultural que quase ninguém enxerga.  
As roupas, os cabelos, os adornos, as cores em tom laranja-coral e bordô, a disposição dos móveis e o comportamento das pessoas ali dentro é algo que não existe do portão pra fora. Ao entrar, nos apresentamos e copiamos ao máximo alguns ritos, como tirar o calçado para visitar o altar, amarrar os cabelos e dizer "Hare Krishna" a todos que ali estavam.  
Tudo ali tem um significado milenar. O sândalo, o incenso, o fogo e até o vasinho de planta, que de início pensamos ser "apenas" um enfeite, é também considerado sagrado e representa a manifestação do amor puro e a devoção a Krishna.

A plantinha em questão é o Tulasi, ou manjericão sagrado, pertence à mesma família do “nosso” manjericão comum e é uma das plantas mais antigas entre as cultivadas para adoração e culto ao sagrado. Além de estar espalhada por todo o templo, ela também está representada na pintura com argila na testa dos devotos e no colar de contas feito com a madeira do Tulasi. Representando o Sagrado, essa planta também protege o corpo que é considerado um templo e morada de Deus. 

Todos no templo parecem sempre muito atarefados. As tarefas ali desempenhadas são todas oferecidas a Krishna, e consistem em cantar mantras, dançar e banquetear, o que, a princípio, parecem funções bem fáceis, mas tudo isso é feito de maneira específica, com horários muito regrados, sempre seguindo as escrituras do Bhagavat-gita, livro sagrado traduzido do sânscrito, em votos de profunda renúncia aos bens materiais que, segundo eles, nada ajudam a se reconectar com a energia sagrada de Krishna.  


Além da renúncia aos bens desnecessários, os devotos de Krishna, como também são chamados, seguem uma série de preceitos muito curiosos, como a restrição alimentar com alimentos que possam induzir a algum tipo de alteração mental ou comportamental. Eles não consomem álcool nem nenhum tipo de drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas. Tudo isso é para que suas mentes estejam sempre atentas, sem nenhum tipo de distração para que possam se manter conectados com a energia divina. 


Foto: Leitura do Bhagavad-gita em cerimônia diária. Ao fundo, altar fechado para que as divindades se alimentem ao som de mantras e trechos das escrituras sagradas.

Os mantras são cantados diariamente várias vezes ao dia, e representam uma ponte entre o mundo material e o espiritual, podendo ser comparado a uma oração. Para eles o mantra mais importante é o Maha Mantra, ou o mantra da felicidade: “Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna Krishna, Hare Hare / Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare”, que é cantado várias vezes, diariamente, antes do nascer e do pôr do Sol, assim como a leitura de textos sagrados em sânscrito e o oferecimento de suas atividades a Krishna.  
Ao olhar de fora, a maneira como eles vivem e se comportam diante de uma sociedade totalmente diferente, parece ser radicalmente oposta ao que costumamos acreditar no “mundo real”. No templo, as crianças vestidas com panos coloridos e sinais na testa, pintados com argila, correm e brincam com os instrumentos, nas cerimônias, elas participam com muita liberdade e naturalidade, sem o compromisso de completar todos ritos de forma exata e sem repreensão dos adultos ao fazerem “coisas de criança”.

Vaishnavi, moradora do templo e devota, diz que as crianças são criadas juntas, participando das celebrações e ritos, aprendendo . Para eles, o alimento é a coisa mais essencial para qualquer ser vivo, por isso é considerado sagrado e oferecido diariamente ao Deus Krishna e suas deidades (personalidades de Krishna que se manifestam em avatares, algo parecido com os santos).  
 A comida é abundante e criteriosamente preparada pelos devotos para que não possua ingredientes que despertem nada mais do que “sattva” ou bondade. Tipos de alimentos como a carne e vegetais da família da cebola e do alho, são acusados de despertar paixão e ignorância (“raja” e “tama”) e não são considerados bons para o exercício da religião, pois despertam alterações comportamentais e/ou distrações, além de prejudicar o Karma (lei natural de ação e reação).  
Parte da ajuda para realizar a distribuição diária de refeições e manter o funcionamento do templo vem da ISKCON (Sociedade Internacional da Consciência de Krishna), mas o templo conta também com a ajuda de doações e com o dinheiro arrecadado através da venda de livros ligados à cultura Hare Krishna. 
As duas logos carregam o desenho que também é feito na testa dos devotos com uma argila sagrada. Esse símbolo em "U" com uma folha em baixo significa os pés de Krishna como uma flor de lótus e a folha representa o Tulassi, 
Os livros são financiados pela Bhaktivedanta Book Trust editora que também traduz e distribui os livros para os templos ao redor do mundo. Assim como a ISKCON, ela foi fundada por A.C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada, o homem responsável por modificar o hinduísmo e torná-lo uma religião mais próxima dos povos do ocidente com tradução do Bhagavat-gita para várias línguas.  

No final da visita ao templo, o que pudemos ver e entender é que o grande papel dos Hare Krishna é mostrar como a nossa “vida real” de estresse, boletos e problemas sociais severos, pode ser mais “leve” quando optamos por viver com menos, sendo mais caridosos e buscando um equilíbrio entre as nossas necessidades e as necessidades que o mundo nos impõe. É claro que ninguém está aqui sugerindo que todos larguem suas casas e vivam em um templo onde tudo é dividido, mas pensar no próximo (seja ele humano ou de outra espécie) faz bem não só para quem o faz.  

Bora ser mais caridoso e consumir menos, pra ajudar as pessoas ao redor, pra não pesar nas contas do bolso, nem do planeta??? 

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