quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

POR TODA RIACHUELO - FINAL

 

POR TODA RIACHUELO - FINAL

















E hoje a última sequencia de edificações da rua Riachuelo, dessa vez entre a Praça 19 de Dezembro e a rua 13 de maio. 

Mais uma vez se repete uma grande variedade de estilos, cores e ocupações, com destaque para elementos art déco e com mais destaque ainda, em minha opinião, para o Cine Passeio, um exemplo fabuloso de uma ação da prefeitura para requalificar um prédio, transformando-o num centro cultural, dando nova vida à um antigo quartel que ficou por muitos anos desocupado.

CIRCULANDO PELA ALAMEDA DR. CARLOS DE CARVALHO - 1

 

CIRCULANDO PELA ALAMEDA DR. CARLOS DE CARVALHO - 1















Quando chegamos do norte do Paraná em 1978, meu pai me matriculou no Colégio Estadual Rio Branco no Batel onde estudei da sexta à oitava série. No que hoje seria o ensino médio, passei a estudar no Colégio Positivo da Ângelo Sampaio e o terceirão fiz no antigo Positivo da Desembargador Mota.

Durante os três anos em que estudei no Positivo, todos os dias caminhava desde à minha casa no Edifício Asa até a escola, pela Alameda Dr. Carlos de Carvalho. 

Ontem refiz esse caminho desde o Edifício Asa até a Praça da Espanha e fui fotografando os prédios. Muitos dos prédios antigos lá permanecem e outros novos surgiram. A esmagadora maioria do comércio da época não resistiu ao tempo, à exceção do Au-Au e do Restaurante Bologna, que mudou de lugar. 

Foi uma viagem de volta à um tempo do qual tenho muitas boas e doces recordações. 

Amanhã mais imagens e um pouco sobre a pessoa que dá nome à rua.

CIRCULANDO PELA ALAMEDA DR. CARLOS DE CARVALHO - 2

 

CIRCULANDO PELA ALAMEDA DR. CARLOS DE CARVALHO - 2
















E finalizando o meu caminho entre o Edifício Asa e a Praça da Espanha (onde eu cruzava em diagonal até a Saldanha e então chegava na Ângelo e no Positivo), várias edificações que hoje compõem a Carlos de Carvalho, iniciando hoje com a antiga fachada do que um dia foi a Sociedade União Juventus até a Praça da Espanha.

E sobre a pessoa que empresta seu nome à rua, encontrei o que segue:

Carlos Augusto de Carvalho (1851-1905) nasceu e faleceu no Rio de Janeiro. 

Em São Paulo se formou na faculdade de Direito da USP, com 22 anos. Entre os anos de 1878 a 1879 foi chefe de polícia do Paraná no governo do seu amigo Dr. Rodrigo Otávio. Assumiu o governo do Paraná entre março de 1882 e maio de 1883. Sua renúncia aconteceu sob pressão popular, no movimento chamado “revolta do vintém”. Apesar disso, defendeu o Paraná na época da disputa pelo território do Contestado. 

Foi Presidente da província do Pará, em 1885; Ministro do Exterior do Marechal Floriano, em 1890; e em 1904 serviu o Ministério do Exterior, como árbitro no tribunal Brasileiro-Boliviano. Ainda no final do século XIX, concluiu seu mestrado e doutorado em Direitos Humanos e Direito Internacional no Brasil e na Europa. Fonte: Curitiba Space.

Histórias de Curitiba - A Guerra que não houve

 

Histórias de Curitiba - A Guerra que não houve

A Guerra que não houve
Antonio Rossi

O ano era o de 1957.
O Colégio Estadual do Paraná surgia imponente defronte à Avenida João Gualberto, com sua piscina monumental e seu ensino ministrado com competência.
Ao lado, bem ao lado, separado apenas pela Avenida Luiz Leão
- então com extensão de apenas uma quadra - estava a CEU, a casa do Estudante Universitário, recém-transferida da Avenida João Pessoa para o novo prédio, construído dentro da área do Passeio Público.
Quase quatrocentos moradores da CEU vindos dos mais diferentes pontos do Paraná e até mesmo de outros Estados (Santa Catarina tinha dezenas de representantes; São Paulo seguia atrás) preparavam o seu futuro graças à visão e apoio de D. Hermínia Lu-pion, esposa do Governador Lu-pion, verdadeira madrinha e anjo da guarda dos estudantesa universitários de nosso Estado.
Ali conviviam os futuros médicos, engenheiros, advogados, farmacêuticos e dentistas, principalmente, as chamadas "profissões nobres"das décadas de 50 e 60. Por ali passaram algumas gerações de profissionais liberais que ainda hoje encontram espalhados pelo Brasil inteiro e embora a CEU de hoje pareça não exercer a atração que tinha sobre todos nós naqueles tempos "heróicos", ela ainda agora está aí, oferecendo teto e alimentação para os estudantes do interior.
Pois os "universitários"da-queles tempos românticos tinham diariamente um espécie de "compromisso": ficar, entre 12 e 13 horas, na esquina da Luiz Leão com a João Gualberto "flertando" com as meninas estudantes do Colégio Estadual. E muitos namoros tiveram início naquela esquina e quem sabe até inúmeros casamentos tiveram como ponto de partida a troca de olhares naquele lugar em que os moradores da CEU ficavam recostados na "cerca de concreto"do Passeio Público enquanto as estudantes por ali passavam em direção ao Colégio, sempre com uma troca de olhares e um sorriso nos lábios.
E de certa forma a receptividade das garotas era compreensível, pois ali se encontravam os futuros médicos, advogados, engenheiros, etc, e que já tinham em parte delineado o seu futuro.
Diferente, bem diferente dos alunos do Colégio Estadual que ainda teriam que enfrentar a dura prova do vestibular e, conseqüentemente, não tinham ainda, uma "posição definida".
Mas, se meninas gostavam do "flerte" (depois denominado de "paquera"e de hoje, o que seria?...) o mesmo não acontecia com os meninos que sentiam o peso da concorrência que consideravam desleal, pois tirávamos deles as suas colegas de escola.
O resultado não se fez esperar: alguns alunos do Colégio Estadual declararam "guerra"aos moradores da CEU e prometeram uma invasão da Casa.
Tudo com hora e dia marcado.
Avisados de que a invasão seria numa determinada noite, os moradores da CEU que não participavam dos namoros e flertes não quiseram nem saber e deixaram a nós a responsabilidade pela "defesa"e se-
gurança da Casa.
Os tempos eram realmente românticos: nenhum de nós sequer pensou em revólver ou faca.
Ficamos aguardando, escondidos por detrás do pequeno muro que ainda hoje existe na frente da Casa, com pequenos porretes para defendermos "nossa"Ca-sa.
Defronte, no Colégio Estadual, a algazarra era enorme e a tentativa de invasão parecia iminente.
De repente, sem que ninguém soubesse quem avisara, chega uma tropa de Cavalaria da Polícia Militar e dispersa os estudantes do Colégio Estadual, que já se encontravam na rua na frente da CEU. Nós, dentro de nossa residência, ficamos na condição de vítimas e ainda recebemos a proteção da P.M.
A guerra tão anunciada não houve e, no dia seguinte, o flerte e o namoro continuaram na esquina da Luiz Leão com a João Gual-berto, ficando apenas registrado na memória de tantos quantos participaram da quase-batalha que, já naqueles tempos, os homens brigavam pelas mulheres...

Celso Antonio Rossi é Diretor da Faculdade Estadual de Direito do Norte Pioneiro (Jacarezinho).

Histórias de Curitiba - Boca de Fornalha

 

Histórias de Curitiba - Boca de Fornalha

Boca de Fornalha
Ennio Marques Ferreira

Já havia traçado um esboço desta narrativa alguns meses atrás.
As anotações, que se perderam, estavam em uma pasta de documentos no assento de meu carro.
Este, por sua vez, havia sido deixado, certa manhã, em um desses movimentados estacionamentos do centro da cidade.
Pois não é que um distraído cidadão infiltra-se com maior tranqüilidade no citado estabelecimento e leva o carro com pasta e tudo, numa boa, sem ser ao menos presssentido pelos zelosos funcionários da casa? O furto do meu Gol, porém não passa de um mero apêndice da historieta principal.
Esta se passa na Curitiba de 1954, quando a cidade era ainda uma tranqüila capital interiorana, mas já com evidências de uma apreciável qualidade de vida que bons e sucessivos prefeitos souberam preservar e aprimorar.
Por volta das nove e meia de uma noite de inverno, havia deixado meu pequeno apartamento de solteiro na Saldanha Marinho, disposto a enfrentar uma sessão qualquer de cinema.
Ninguém nas ruas, apenas meus passos faziam algum ruído.
Ar parado, céu limpíssimo, frio seco penetrando por baixo das calças, prenuncio certo de geada no dia seguinte.
Alcançando a Visconde de Nácar, antes de cruzar a Carlos de Carvalho, seguia pela calçada oposta ao escuro prédio de apartamentos que ali existia na época.
Era um bloco compacto, de uns três andares, construção não muito requintada, que ocupava, se não me engano, todo o lado direito da quadra.
Em dado momento, ao me voltar para o tal prédio, fui surpreendido por uma visão no mínimo surrealista: entre as centenas de janelas fechadas, enfileiradas, estava uma, no primeiro pavimento, escancarada e vibrando em chamas.
Uma verdadeira boca de fornalha, um nítido retângulo amarelo-fogo em contraste com a escuridão da fachada.
Perplexo, meu primeiro pensamento foi chamar os bombeiros.
Uma possível demora porém, poderia trazer resultados trágicos.
Resolvi, então, procurar ajuda na redação de "O Estado do Paraná", que ficava bem perto, na Vicente Machado a poucos metros da Praça Osório onde, naquela hora, estariam fechando a edição do dia seguinte.
Aos berros, conclamei o pessoal do jornal a me acompanhar.
Seguiram-me, apressadamente, o Freitas, o Puglieli, o Aurélio e vários outros.
Atguns minutos após estávamos arrombando a porta do apartamento a ponta-pés.
Adiante da sala, o quarto da frente onde línguas de fogo lambiam o sofá-cama, cortinas, vernizianas e ameaçavam outros móveis.
Muito esforço e muitos baldes d'água foram necessários para que o grupo debelasse o fogaréu. O vilão teria sido um cigarro que, deixado aceso, caíra do cinzeiro, fazendo o estofamento do sofá arder vagarosamente, antes que as chamas surgissem e se alastrassem.
Ainda hoje, ao me recordar deste insólito e nunca antes divulgado episódio - não percebido nem mesmo pelos vizinhos do lado -fico a imaginar a incrível surpresa do notívago morador, chegando de madrugada, ao deparar com a porta violentamente arrombada, seu quarto destruído pelo fogo e pela água, sem ninguém para dar qualquer explicação...

Ennio Marques Ferreira é crítico de arte e foi diretor do Museu de Arte do Paraná.

Histórias de Curitiba - Os mercados de Curitiba

 

Histórias de Curitiba - Os mercados de Curitiba

Os mercados de Curitiba
Moyses Paciornik

Junto ao murinho do Alto São Francisco, perto do qual morávamos, o capinzal crescia mais abundante, mais viçoso, não me refiro às muralhas que lá estão, mas a uma extensa base de pedras, de cerca de um metro de altura, que, há tempos, desmancharam.
Quando a gente era criança, lá por 1920, Curitiba tinha tres mercados. O Mercado da Praça 19 de Dezembro, tendo de um lado as casas dos Tourinho e, do outro, o bonito bambuzal da "Doitche Schule"(Escola Alemã), Colégio Progresso, depois da guerra. A guriza-da encantava-se com o garboso galo de ferro que encimava a cumieira do Mercado.
Ao soprar o vento, mudava de posição. Só faltava cantar.
Corria a lenda de que, de madrugada, ele cantava para acordar a clientela.
O Mercadinho ficava onde hoje é o largo Dr. Baima, frente ao Scavolo.
Era uma construção que nos parecia circular.
Para chegar a uma de suas lojinhas ou botequins, vindo da Dr. Pedrosa, subia-se por uma escada de seis degraus. O acesso do Batei era ao nível da rua, sem degrau.
Uma vez, meus primos, Rodolfo, Chico e Salmo.
Um deles tinha um tostão.
Comprou um caju para os tres. A diarréia que os atingiu levou dois dias para sarar.
Caju desgraçado!
Havia um terceiro mercado, um super super-mercadão.
Simpático, querido. O melhor do mundo.
Mercado a domicílio.
Eram a Catina, Pina, Gina, Pieri-na, Joana, Tereza, Angela, dos Cu-man, DaTEstela, Perussi, Tulio, Budel, Bartapelle, Braganholo, que, madrugada alta, largavam de suas chácaras em Santa Felicidade e, pela estrada de barro, vinham em fila em direção à cidade. Lá pelas sete alcançavam o calçamento de paralelepípedos da Jaime Reis, na altura do Alto São Francisco. Nós, meninos, escondíamo-nos atrás do murinho e esperávamos.
Ali era a parada obrigatória das carroci-nhas.
As heróicas condutoras desciam e, do lado do muro, fingiam arrumar as mercadorias.
Todas usavam saias muito largas que chegavam quase até o chão. A meninada as via separar os pés e, deliciada, ouvia, abafados pelo viçoso capim, o '‘schiii" do líquido que se derramava gostoso.
Tendo que enfrentar uma jornada de muitas horas, ali seria a última oportunidade, a cidade não oferecia nenhuma comodidade, como, aliás, ainda hoje não oferece.
Aliviadas, elas partiam para atender nossas mães que, alertadas pelas vozes já conhecidas, as esperavam à porta.
- Olha a batata doce! Milho verde! Radicce! Escarola!
- Compre cenoura, salsa, alface, repolho...
- Oi a galinha! Frango! Ovos frescos!
- Oi a lenha picada.
Na volta, a parada das car-rocinhas vazias, ou carregadas de trouxas de roupas para lavar, era no capoeirão, frente à Caixa de Água Velha, junto à chácara dos Macedo, onde o capim também crescia sadio, exuberante.
Elas formavam o terceiro mercado de Curitiba, o Mercadão que o progresso e a transformação de Santa Felecidade em Centro Gastronômico - Artesanal acabaram por acabar.
Hoje, por mais que a gente se esforce, não consegue ouvir aqueles pregões queridos:
- Olha a batata doce!
Mercadão da Colônia, melhor mercado do mundo.

Moyses Paciornik é médico e escritor.

Histórias de Curitiba - A Amante argentina

 

Histórias de Curitiba - A Amante argentina

A Amante argentina
J. J. Figueiredo Lima

Bem que o Contista advertira - "janeiro é o menos cruel dos meses". Pois foi num abafado mês de janeiro, patroa e filharada na praia, que a viu pela primeira vez no inferninho esfumaçado da Westphalen, já madrugada alta.
Tinha bem uns tres ou quatro ba-bosos cortejadores em volta, e não era para menos.
Seria, disparado, a mulher mais bonita do salão, quiçá de todos os inferninhos da rua.
Ainda assim, ele só se interessou quando lhe ouviu a voz. O sotaque não deixava margem para dúvida - era portenha.
Os olhos dele brilharam a mão tremeu derrubando metade da dose. "Será minha", jurou para si mesmo. "Minha amante argentina!"
Algumas quantas noites de assédio respeitoso, um primeiro e tímido sorriso, muitas doses pagas e - principalmente - a carteira recheada aberta displicentemente em sua frente e pronto. A conquista, ou fosse lá o que aquilo fosse, estava consumada.
Para encurtar a história, juntos escolheram para ela a Kitinete para alugar, compraram móveis, o som, enxoval, uns vestidos... E juntos trocaram mil juras de exclusividade.
Chamava-se Natália, de apelido "A Monumental". Exagero, viu ele logo na primeira manhã resplandecente em que saíram juntos.
Bonitinha, sim, mais nada.
Um pouco burrinha, também, embora gostasse de empilhar livros na cabeceira da cama.
Da primeira vez que a conheceu, bi-blicamente, reparou ainda que o corpo da moça nem de longe lhe fazia justiça ao rosto bonitinho.
Sobrava uma gordurinha aqui, um mapa em alto relevo de estrias acolá. Ainda assim, o sotaque era genuíno.
Era argentina.
Sua amante argentina.
Para encurtar a história, e pela segunda vez, ela certamente o teria levado à falência, como toda amante argentina que se preza, e ele teria adorado, não fosse um detalhe.
Acontece que fidelidade era um termo que não constava no dicionário da moça, tanto no português como no castelhano. E aproveitava a mais não poder para engordar a poupança com encontros a torto e a direito no apartamento que ele lhe montara.
Ele pode ter sido o último a saber, mas soube, eis que os amigos existem, entre outras, justo para essas coisas - primeiro se aproveitam, depois contam.
Tramou, então, uma vingança perversa.
Um belo dia, no meio da semana, convidou-a para um churrasquinho no Parque Barigüi.
Mas não levou carne.
Mo parque escolheu a churrasqueira mais distante, mato a dentro.
Alí, a pretexto de um jogo amoroso, não teve dificuldade para dominar sua amante argentina, amordaçá-la e amarrá-la.
Do porta-malas do carro tirou um ferro desses de marcar gado, com um "V" na ponta, e pôs no fogo.
Quando o ferro estava incandescente, tres vezes o aplicou no rosto da moça, uma na testa, duas nas bochechas.
Quando ela voltou a si do desmaio, ele proclamou: "Pronto, agora e para todo o sempre está marcada com três "V". "V" de vaca, de vagabunda e de vigarista.
Deixou a moça ali mesmo e foi para casa.
Naquela mesma noite, lua nova, a última amante argentina foi vista zanzando pelo Passeio Público.
Da "Ilha dos Namo-rados"pulou para o fosso de água suja, morreu afogada.
Dia seguinte, na roda de curiosos, o espanto da doméstica que por ali passava:
- "Morreu como, em água assim tão rasa?"
Mais rasa foi a cova que lhe deram no enterro de indigente, lá no Santa Cândida, longe, muito longe, do Santo Cruzeiro das Almas.

J.J Figueiredo Lima é engenheiro.