quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Histórias de Curitiba - A Guerra que não houve

 

Histórias de Curitiba - A Guerra que não houve

A Guerra que não houve
Antonio Rossi

O ano era o de 1957.
O Colégio Estadual do Paraná surgia imponente defronte à Avenida João Gualberto, com sua piscina monumental e seu ensino ministrado com competência.
Ao lado, bem ao lado, separado apenas pela Avenida Luiz Leão
- então com extensão de apenas uma quadra - estava a CEU, a casa do Estudante Universitário, recém-transferida da Avenida João Pessoa para o novo prédio, construído dentro da área do Passeio Público.
Quase quatrocentos moradores da CEU vindos dos mais diferentes pontos do Paraná e até mesmo de outros Estados (Santa Catarina tinha dezenas de representantes; São Paulo seguia atrás) preparavam o seu futuro graças à visão e apoio de D. Hermínia Lu-pion, esposa do Governador Lu-pion, verdadeira madrinha e anjo da guarda dos estudantesa universitários de nosso Estado.
Ali conviviam os futuros médicos, engenheiros, advogados, farmacêuticos e dentistas, principalmente, as chamadas "profissões nobres"das décadas de 50 e 60. Por ali passaram algumas gerações de profissionais liberais que ainda hoje encontram espalhados pelo Brasil inteiro e embora a CEU de hoje pareça não exercer a atração que tinha sobre todos nós naqueles tempos "heróicos", ela ainda agora está aí, oferecendo teto e alimentação para os estudantes do interior.
Pois os "universitários"da-queles tempos românticos tinham diariamente um espécie de "compromisso": ficar, entre 12 e 13 horas, na esquina da Luiz Leão com a João Gualberto "flertando" com as meninas estudantes do Colégio Estadual. E muitos namoros tiveram início naquela esquina e quem sabe até inúmeros casamentos tiveram como ponto de partida a troca de olhares naquele lugar em que os moradores da CEU ficavam recostados na "cerca de concreto"do Passeio Público enquanto as estudantes por ali passavam em direção ao Colégio, sempre com uma troca de olhares e um sorriso nos lábios.
E de certa forma a receptividade das garotas era compreensível, pois ali se encontravam os futuros médicos, advogados, engenheiros, etc, e que já tinham em parte delineado o seu futuro.
Diferente, bem diferente dos alunos do Colégio Estadual que ainda teriam que enfrentar a dura prova do vestibular e, conseqüentemente, não tinham ainda, uma "posição definida".
Mas, se meninas gostavam do "flerte" (depois denominado de "paquera"e de hoje, o que seria?...) o mesmo não acontecia com os meninos que sentiam o peso da concorrência que consideravam desleal, pois tirávamos deles as suas colegas de escola.
O resultado não se fez esperar: alguns alunos do Colégio Estadual declararam "guerra"aos moradores da CEU e prometeram uma invasão da Casa.
Tudo com hora e dia marcado.
Avisados de que a invasão seria numa determinada noite, os moradores da CEU que não participavam dos namoros e flertes não quiseram nem saber e deixaram a nós a responsabilidade pela "defesa"e se-
gurança da Casa.
Os tempos eram realmente românticos: nenhum de nós sequer pensou em revólver ou faca.
Ficamos aguardando, escondidos por detrás do pequeno muro que ainda hoje existe na frente da Casa, com pequenos porretes para defendermos "nossa"Ca-sa.
Defronte, no Colégio Estadual, a algazarra era enorme e a tentativa de invasão parecia iminente.
De repente, sem que ninguém soubesse quem avisara, chega uma tropa de Cavalaria da Polícia Militar e dispersa os estudantes do Colégio Estadual, que já se encontravam na rua na frente da CEU. Nós, dentro de nossa residência, ficamos na condição de vítimas e ainda recebemos a proteção da P.M.
A guerra tão anunciada não houve e, no dia seguinte, o flerte e o namoro continuaram na esquina da Luiz Leão com a João Gual-berto, ficando apenas registrado na memória de tantos quantos participaram da quase-batalha que, já naqueles tempos, os homens brigavam pelas mulheres...

Celso Antonio Rossi é Diretor da Faculdade Estadual de Direito do Norte Pioneiro (Jacarezinho).

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