quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

A fábrica da Matte Leão Jr: uma indústria ervateira que virou templo religioso

 A fábrica da Matte Leão Jr: uma indústria ervateira que virou templo religioso

https://www.turistoria.com.br/a-fabrica-da-matte-leao

Muitos curitibanos sabem que o antigo complexo fabril da Matte Leão Junior S.A foi posto abaixo, e que sobre suas ruínas foi construído um gigantesco templo religioso da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). Aos que não sabem, esse artigo pode ser uma boa porta de entrada nesse debate.

 

Ao ler um texto do Turistória sobre a Matte Leão demolida, o leitor que nos conhece imagina a grande tristeza, para não dizer revolta, que acompanha estas palavras aqui escritas. Jamais deixaremos de defender a preservação do patrimônio histórico do Paraná, não importam as circunstâncias.

 

Mas, antes de falarmos propriamente do que já não existe, vamos dar um passeio na história da empresa Matte Leão Jr.



Origens da Matte Leão Júnior

 

Em 1901, Agostinho Ermelino de Leão Júnior abriu a firma ervateira, a Leão Jr. S.A. Leão Júnior era filho de Agostinho de Ermelino de Leão, conhecido personagem curitibano. Leão Júnior inicialmente montou escritório na rua Riachuelo, mas seu engenho, a Fábrica Santo Agostinho, ficava na cidade de Ponta Grossa. Pouco tempo depois, em 1907, o empresário veio a falecer e o negócio foi comandado por sua esposa, Maria Clara Abreu de Leão.

 

Cabe registrar aqui uma grande história: nesse período em que Maria Clara tocou a firma de erva-mate, Maria Dolores Leão Fontana (irmã de Leão Jr.) administrou o engenho de seu marido, Francisco Fasce Fontana, e a Baronesa Maria José Correia, esposa do Barão do Serro Azul, também liderou a indústria do seu companheiro. Ambos os ervateiros haviam falecido, este último assassinado.

 

Depois de dois incêndios em Ponta Grossa, a Fábrica Leão Jr. foi transferida para o bairro Portão, em Curitiba, e após outro incêndio para o bairro Rebouças. Ali foi construído, em 1930, um grande complexo fabril em frente a Fábricas Fontana S.A., entre a Av. Getúlio Vargas e a Rua Piquiri. Fido Fontana, primo de Leão Júnior, administrava o engenho vizinho.

 

Nessa época, já estavam à frente da Fábrica Leão Jr. Altivir Ferreira Abreu, e o filho de Maria Clara, homônimo ao pai (pela quarta geração).



Crescimento da Matte Leão Júnior

 

A fábrica do Rebouças era gigantesca, a maior e mais moderna do Brasil. A erva-mate chegava sapecada e moída dos ervais e moinhos do interior, onde a família tinha largas extensões de terra. Depois de extraída, então, a erva era ensacada e transportada de balsa pelo rio Iguaçu até Porto Amazonas, cidade nas imediações de Palmeira. Daí o produto era levado de trem, em trilhos próprios da empresa, até a fábrica, onde posteriormente era beneficiada, colocada em barris para exportação ou mesmo em latas para venda. Para chegar ao Porto de Paranaguá, a erva-mate era deslocada em lombos de burros e carroças pela estrada da Graciosa (hoje, isso é feito de trem), sendo por fim alojada em navios cargueiros que seguiam para o Chile, Argentina e Uruguai. O que não era exportado era vendido nos armazéns do Paraná e em demais estados do sul.

 

Em toda essa cadeia de produção, milhares eram os operários e operárias que trabalhavam, desde a extração nos ervais até o empacotamento e chegada nos pontos de distribuição. Graças a eles, que por muitas vezes contestavam as condições de trabalho oferecidas (como na greve de 1917), na década de 20 a Leão Júnior S.A liderou a produção mundial de erva-mate, chegando a 5 mil toneladas por ano.

 

Para chegar a esses números, a empresa decidiu abrir um negócio inovador. O Uruguai, a Argentina e o Chile eram os maiores compradores da erva de chimarrão Leão. Entretanto, o maior país consumidor, a Argentina, decidiu proibir a importação de mate já embalado, para poder aumentar os ganhos das próprias indústrias nacionais. Então, a exemplo da Fábricas Fontana, a Leão Júnior abriu um engenho próprio argentino, passando a exportar a erva-mate para si mesma, mas a granel, e não pronta para o consumo.

 

Apesar disso, a importação de erva-mate pelos países do Cone Sul praticamente cessou (e assim permaneceu até os dias de hoje). Por isso, a Leão Júnior apostou em dois mercados: 1. a venda para o mercado interno, e 2. a produção de chá. Em 1938 surgiu o famoso chá Matte Leão, que nada mais era do que mate queimado (na época vendido em latas). No ano de 1973, as latas foram substituídas pelos sachês nos sabores natural e limão. Uma década depois, foi lançada a linha de chás de ervas de camomila, cidreira, erva-doce, boldo, hortelã, frutas, flores e, também, o chá preto. O sucesso foi tanto que logo o produto foi comercializado em copinhos.

 

O resultado disso foi a substituição completa da erva de chimarrão pela produção de chá, produto que deu início à marca Matte Leão. Desde então, a empresa domina 90% do mercado de chás do Brasil — estando à frente da sua vizinha Fontana, que, embora fosse a primeira a produzir chá e ainda sim mantivesse a erva de chimarrão, alcançou menores patamares de vendas.



A venda da Matte Leão Júnior e do seu prédio histórico

 

Depois de 106 anos comandada pela família Leão, a Matte Leão Júnior foi vendida para a Coca-Cola, em 2007. Passados dois anos, a fábrica já se encontrava no município de Fazenda Rio Grande, na região metropolitana de Curitiba. Desde 2012, chama-se Leão Alimentos e Bebidas.

 

De resto, poderíamos simplesmente escrever: o antigo e histórico complexo fabril do Rebouças foi vendido, demolido e assim se perdeu um pedaço da história do Paraná. Entretanto, esse processo foi um pouco mais complexo, e aqui tentaremos ser justos com todos os lados desse imbróglio.

 

As perguntas que você, leitor, deve estar fazendo são as seguintes: houve tentativas de preservação da fábrica da Matte Leão? Como conseguiram demoli-la? Se não houve tentativas, por quê?

 

Bom, o complexo fabril não era uma Unidade de Interesse de Preservação (UIP), e muito menos um patrimônio histórico tombado. Para torná-lo uma UIP, o poder municipal poderia ter agido, sim, mas a requisição para tal cabe a pessoas físicas ou jurídicas, isto é, à sociedade civil. Nesse caso, possivelmente foi a família Leão quem não requisitou. Então, ao vender o seu patrimônio, o município não teve como contestar o que seria feito do antigo prédio, já que não tinha a prerrogativa ou o direito de preservá-lo.

 


Mas o que disse o poder público sobre a demolição?

 

Tanto o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba quanto a Fundação Cultural de Curitiba foram contra a demolição, realizada pouco depois que a família vendeu o terreno, em 2010. Ambos os órgãos reafirmaram a importância histórica da antiga fábrica dos Leão, que foi testemunha e, ao mesmo tempo, responsável pelo desenvolvimento do Paraná através da erva-mate. Segundo ambos, trata-se de um patrimônio histórico que mantém preservadas memórias e a identidade de Curitiba. Hoje, porém, tudo isso está soterrado, levando junto consigo importantes fontes do passado.

 

Essas declarações até têm fundamento, pois a zona industrial do bairro Rebouças, da qual a fábrica fazia parte, integrava um antigo projeto de revitalização da prefeitura. Desde que foi criada a Cidade Industrial de Curitiba na década de 70, boa parte dos complexos industriais do Rebouças foi desativada, como a Fábrica Fontana. Então, o município quis transformar esses espaços em áreas turísticas e culturais, como foi feito no Sesc Pompeia, em São Paulo. Por isso, a Fundação Cultural transferiu alguns de seus departamentos para um antigo moinho da Rua Piquiri, visando acelerar o processo de restauração do “Soho Rebouças” - nome do projeto de revitalização.

 

Havia até um grande projeto destinado a revitalizar o engenho da Matte Leão Jr., de autoria do escritório “Jaime Lerner Arquitetos Associados”, que previa a construção de prédios comerciais e residenciais que respeitassem a antiga estrutura da fábrica ainda conservada.

 

Contudo, já que não havia proteção legal do complexo, em maioria a família decidiu vender a fábrica a quem fez a melhor oferta. Neste caso, Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus, saiu vencedor. O negócio girou em torno de 32 milhões de reais, 7 milhões a mais do que o valor venal do terreno - de acordo com o jornal Gazeta do Povo.

 

Depois disso, a prefeitura em si não fez resistência ou mesmo contestou a demolição do prédio. Na realidade, além do profundo silêncio das autoridades, atualmente não há contradição entre o projeto anti-histórico da IURD e a prefeitura (como já vimos aqui em texto sobre a Sociedade Protetora dos Operários).

 

Tanto é que, há dois anos, foi assim que a prefeitura de Curitiba se expressou quanto ao bairro Rebouças: “Este bairro central, que recebeu as primeiras indústrias da cidade, necessita se desenvolver social e economicamente, com investimentos que atraiam uma densidade maior tanto de moradores, quanto de usuários urbanos daquele espaço”. Ou seja, nenhum empreendimento de preservação histórica está previsto.


O que restará

 

A única coisa que sobrou da demolição foi um antigo prédio administrativo da Matte Leão Jr. em art déco, que fica na quadra ao lado da antiga fábrica, além de alguns galpões. São agora patrimônios da IURD, mas com uma diferença: essas edificações são Unidades de Interesse de Preservação. Por isso, o IPPUC fez um projeto de revitalização, já em execução.

 

Legado

 

Em plano mais evidente, o descaso com a preservação de memórias e patrimônios históricos prejudica a própria Matte Leão. Os motivos são óbvios. Enquanto a antiga fábrica estava de pé no centro da cidade, a marca ocupava um grande espaço no imaginário curitibano, algo que pode perder força com o tempo. Já em um pano de fundo, quem perde é Curitiba, pois uma herança importante de sua história é negada e esquecida. A sua identidade, e a consciência histórica de sua população, enxuga-se com mais essa ausência.

 

Para além disso tudo, soterramentos históricos como esse evidenciam a desimportância atribuída à cultura da erva-mate no Paraná, que é até hoje o maior estado produtor. A própria emancipação do Estado (em 1853), o surgimento de importantes instituições, como a sua maior universidade (UFPR), além da ferrovia e dos municípios portuários, são derivações do poder econômico trazido por esse produto ao Paraná.

 

De modo sutil, sabe-se que ocorre um processo desindustrialização em curso no Brasil, com um enfraquecimento de sindicatos, associações operárias e, consequentemente, de direitos trabalhistas. O intuito parece ser o de fragilizar a classe trabalhadora, tornando-a cada vez mais impotente para lutar pelas suas garantias, já não tão garantidas assim.

 

Nesse caso, a demolição de fábricas tradicionais, assim como de agremiações operárias (onde milhares de trabalhadores já deixaram parte de suas vidas) e sua completa desaparição do centro e de bairros movimentados da cidade, fica parecendo uma investida contra a memória operária e a preservação da história de suas lutas.

 

Tomara que não estejamos certos.


Texto e pesquisa de Gustavo Pitz

Fonte de pesquisa:  


https://www.gazetadopovo.com.br/haus/reacao-urbana/saiba-como-seria-o-projeto-de-revitalizacao-da-matte-leao/?fbclid=IwAR0J8kZLqazIF75jq0pJdXvSnzsrNErh1tK71E8a7LPqxObexpdMeLCaB5A


https://www.gazetadopovo.com.br/haus/arquitetura/unico-predio-restou-matte-leao-restaurado-curitiba/?fbclid=IwAR0jjSBIAugw1ZHfpTKMHp5KLKl5uk_97z1mGwS5NCO2imkpb_BRb3aic9o


https://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/sem-defesa-fabrica-da-matte-leao-comeca-a-ser-demolida-4bgldsza3ohv4cvcgx2vvms7i/?ref=link-interno-materia


https://arquivoarquitetura.com/044#6595-6599-galeria-044-5ff4a347d320e-p2


http://www.circulandoporcuritiba.com.br/2011/09/matte-leao-sua-historia-e-o-desmanche.html

O Solar do Barão e o Barão - histórias redescobertas

 O Solar do Barão e o Barão - histórias redescobertas

https://www.turistoria.com.br/o-solar-do-barao-e-o-barao-historias-redescobertas

O Solar do Barão resguarda inúmeras histórias. Algumas são bem conhecidas e até famosas; outras relampejam para serem descobertas.

 

Uma breve história do Solar do Barão

 

Comecemos pelo conhecido. Atualmente, o Solar do Barão é sede da Fundação Cultural de Curitiba. Desde 1975, a prefeitura é proprietária desse casarão, que tem mais de 140 anos de história. Ele fica na rua Carlos Cavalcanti, 553.

 

Como o próprio nome sugere, o Solar do Barão remonta ao período imperial brasileiro, quando o título nobiliárquico de barão era concedido pelo imperador. Na época, ser barão representava ascensão e reconhecimento social, pois a outorga desse título significava a definitiva entrada da pessoa à nobreza. Para recebê-lo, porém, era necessário ter posses, prestígio político e ilustre ascendência, ou seja, fazer parte da elite da sociedade.

 

Uma das tantas posses do Barão sobre o qual estamos escrevendo era o Solar, residência de sua família. Ser chamada de “solar” simbolizava a luxuosidade da casa, pois somente assim eram nomeados os palacetes dos grandes proprietários.

 

Seu primeiro proprietário foi Ildefonso Pereira Correia, mais conhecido como Barão do Serro Azul. Ildefonso era o maior exportador de erva-mate do Brasil, um grande político e intelectual do segundo Império. Já estabelecido em Curitiba e reconhecido como "Comendador Ildefonso” — honraria que recebeu antes do título de Barão — o ervateiro quis fazer jus ao prestígio adquirido e resolveu construir uma casa ‘de cair o queixo’.

 

A construção começou em 1880 e somente foi finalizada em 1884, às vésperas da visita da princesa Isabel e de Conde D'Eu a Curitiba, em dezembro daquele ano. Tratava-se de um palacete de três andares colado à rua, em estilo eclético mas com nítidos traços neoclássicos. São doze janelas frontais, 4 em cada andar, com 2 bonitas sacadas. Chamam atenção os detalhes das janelas, que remontam à fachada do Partenon, as colunas gregas e a vistosa eira. Como a casa era em frente à rua, sua entrada ficava na lateral.

 

Desde a inauguração, passaram a frequentar e se hospedar no palacete diversas personalidades, como foi o caso da Princesa Isabel. O local era sede de reuniões políticas, de negócios e se tornou até cenário de guerra. Por isso, ter uma casa requintada era fundamental. Não por menos, no mesmo período outras tantas mansões foram construídas por grandes proprietários em Curitiba, como a Mansão das Rosas.

 

Pela primeira vez desde emancipado, o Paraná viu crescer em seu solo um grupo de poder e posse que contribuiu para a entrada da província no mapa do Império. Foi por isso que Dom Pedro II visitou a terra das araucárias (sua primeira e única visita) em 1880. Com o aval imperial, esse grupo, composto principalmente por ervateiros e exportadores, passou a se fazer notar cada vez mais. Demonstrar poder era fundamental, e o Solar do Barão foi uma consequência direta dessa expressão.

 

Engana-se quem acha que o Solar se restringe a um palacete. Na verdade, ele é um complexo com três casas e dois pátios de entrada. Ao lado direto de quem vê da rua, há uma casa menor, o solar da Baronesa, ao que tudo indica construída para ser residência de Maria José Pereira Correia, a Baronesa do Serro Azul, já viúva do Barão, e seus filhos. A residência segue o estilo do palacete, embora tenha apenas um andar.

 

Do outro lado do complexo, à esquerda do palacete, há outro prédio, mas de dois andares. Ele é mais recente, tem um estilo menos garboso e foi construído enquanto o exército brasileiro ocupou o local, entre 1912 e 1975. Ali foi feita outra entrada. 

 


De quartel a espaço artístico

 

Em 24 de setembro de 1975, o jornal Diário da Tarde noticiava que o 5o regimento militar do exército havia se transferido para o bairro Pinheirinho, após negociações com a prefeitura. Com isso, o antigo QG do centro, “popularmente conhecido como Solar do Barão do Cerro Azul”, diz a notícia, passava a ser do município.

 

Segundo o jornal, o general de então disse que o Solar “já teve a sua época. Hoje ele cedeu sob o peso do progresso. Sua acomodação já está muito acanhada para abrigar o desenvolvimento da unidade e estamos limitados pela pressão urbana”.

 

O jornal ainda informou que o prédio era “um dos orgulhos de Curitiba”, e que foi comprado pelo 5o Distrito militar em 1912 por 150 contos de réis.

 

Felizmente, a fala do general não se materializou. Não só o Solar se manteve em pé, como foi reformado e passou a servir a funções mais humanísticas. O restauro foi finalizado em 1983, bem no seu centenário.

 

Inicialmente, pretendia-se fazer do Solar um museu de Curitiba, mas a ideia mudou. Logo ele se tornou o Museu da Gravura, com inúmeros artefatos históricos da cidade, e depois foi dedicado também a outras artes gráficas, sediando assim o Museu do Cartaz, a Gibiteca (no solar da Baronesa) e o Museu da Fotografia. Após a ocupação pela Fundação Cultural de Curitiba, neste espaço são realizadas inúmeras atividades culturais da cidade. Desde então o Solar se chama Centro Cultural Solar do Barão.

 


Ironias da história

 

A trajetória do Solar do Barão revela um importante aspecto sobre a preservação do patrimônio histórico em Curitiba. Tal qual outros locais da cidade, o Solar do Barão se manteve em pé porque foi do exército, e porque o poder público o comprou e resolveu reformá-lo. Graças a isso, hoje ele é um Patrimônio Cultural tombado pelo Paraná, e uma Unidade de Interesse de Preservação (UIP). Outros tantos prédios históricos nem sequer se tornaram uma UIP — pois poucos são os proprietários que se interessam pela preservação.

 

Mas não estamos elogiando aqui a atuação do exército na preservação do Solar. Pelo contrário, o fato da antiga casa do Barão do Serro Azul ser uma unidade do exército é uma grande ironia, pois foram militares que o mataram.

 

Como já falamos aqui anteriormente, Ildefonso Pereira Correia foi assassinado covardemente por soldados legalistas (do exército brasileiro), não se sabendo a mando de quem, em 20 de maio de 1894. Estavam tropas do exército federalista em Curitiba, os maragatos, e o Barão foi um dos principais responsáveis pelo acordo de paz entre os curitibanos e os soldados de Gumercindo Saraiva.

 

Depois que Curitiba foi recuperada pelo governo de Floriano Peixoto, o Barão foi considerado cúmplice dos federalistas, e não o oposto. Assim, sob o pretexto de ser julgado no Rio de Janeiro, o Barão do Serro Azul foi morto dentro do trem na Serra do Mar, e jogado ladeira abaixo. Por décadas, ele continuou sendo tratado como traidor, até a sua memória ser justamente recuperada.

 

Sua família, entretanto, sofreu com os efeitos da perseguição pública. E esse talvez tenha sido o motivo da “venda” do Solar do Barão e do Solar da Baronesa ao Exército, em 1912, por um preço abaixo do normal. Com isso, foi extorquida não só a memória do Barão, como também as suas posses.

 


O Solar do Barão e o Barão, histórias que se completam

 

Não se podia tocar no nome "Barão do Serro Azul”. Quando se falava nele, até a grafia aparecia errada, com “Cerro” ao invés de “Serro”, como se traidor da pátria não pudesse ser chamado pelo nome correto. Curiosamente, poucos chamavam o Solar de “Solar do Barão”.

 

Mesmo durante o Império, dizia-se “palacete do excelentíssimo commendador Ildefonso Correia” ou “ilustrissima residencia do Barão”. Nos jornais, a primeira vez que o nome “Solar do Barão" apareceu foi, pasmem, em 1975, após a compra pela prefeitura. Até então, só se dizia “QG do centro”.

 

Conforme novos estudos e biografias do Barão do Serro Azul foram lançados, a visão de que ele havia colaborado com os federalistas caiu por terra; a memória do Barão do Serro Azul ganhou contornos justos. Ao mesmo tempo, talvez para redimir os erros do passado, a prefeitura passou a chamar a casa do Barão de “Solar do Barão”. O sucesso foi tamanho que a ideia pegou, e hoje o Solar, tanto pela sua existência quanto pelo seu nome, ajuda a manter viva a história de Ildefonso Pereira Correia e de sua família. Hoje, é o único paranaense homenageado no Panteão da Pátria, em Brasília.

 

A construção de uma outra história do Barão do Serro Azul permitiu que novas passagens dele, de sua família e de sua casa fossem desenterradas. Das cinzas ressurgiu o Solar do Barão, assim reconhecido. Mas ainda há muito o que ser descoberto. São quantos os patrimônios históricos de Curitiba cuja história ignoramos?

 

Atualmente, um novo processo de restauração já está em curso para o Solar do Barão. Novas descobertas e revelações históricas vêm sendo preparadas para os curitibanos para o período pós-pandemia.