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quarta-feira, 15 de março de 2023

A CASA ELFRIDA LOBO, POR ELA MESMO.

 A CASA ELFRIDA LOBO, POR ELA MESMO.


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A CASA ELFRIDA LOBO, POR ELA MESMO.

"O terraço da nossa casa confinava com o enorme quintal da casa do meu avô. Eu e meus irmãos subíamos o muro pela enorme caixa d’água sem precisar atravessar a rua- Os jardins da casa do meu avô Elysio ocupavam uma parte da Rua Silva Lemos e da Rua Dr. Leocádio. A residência dos meus avós era muito grande, aprazível e alegre. Da sala de jantar, saía-se para um grande jardim com lindos canteiros floridos. No centro um bonito repuxo todo enfeitado de conchinhas. Na parte esquerda, saindo da copa, havia um enorme alpendre onde ficavam a cozinha, banheiros, alojamento para empregados e dispensa. Enormes trepadeiras subiam até o alpendre superior onde ficavam os aposentos da família. Na parte de cima, a que se subia por uma escada, saindo da copa ficavam os quartos todos com janelas e saídas para o alpendre superior, que deixava os compartimentos frescos e ventilados.
O primeiro quarto era dos meus avós ao lado de um outro menor em que minha avó costumava fazer suas orações diante de um oratório colocado em cima de uma cômoda de jacarandá, enfeitada com seus santos de estimação e castiçais de prata. Essa cômoda com seus pertences se encontra na família. Era nesse quarto que eu dormia. Quantas vezes ficava com medo, porque a luz da lamparina sempre acesa à noite toda, projetava sombras na parede, que me pareciam monstros. Apertava a campainha ao lado de minha cama, e lá vinha a boa Daluz, empregada da minha avó, ficar comigo até eu adormecer- Dormi muitos anos neste quarto entre os santos e um grande crucifixo de madeira todo moldado com cruzinhas pequeninas que minha avó doou ao Sr. David Carneiro, assim como muitas telas a óleo dos seus antepassados. Em seguida a este quarto vinha o banheiro e o quarto das minhas tias Cacaia e Edith. Não sei se devido ficar desde muito criança dormindo entre os santos e lamparinas, até hoje trago o meu quarto cheio de santos e castiçais e quando viajo levo comigo meus santinhos de estimação. Permaneci em casa da minha avó todo o tempo em que meus pais moraram em Antonina e depois quando foram morar em Cerro-Azul.
Depois das aulas, meus primos iam chegando e recomeçávamos as brincadeiras no jardim, que rescendia um perfume gostoso, devido às inúmeras espécies de flores que meu avô cultivava com muito carinho. Cada vez que ele chegava de suas viagens ao Rio, trazia sempre qualidades novas de sementes. Havia amores-perfeitos, violetas, miosótis, camélias, magnólias, rosas e orquídeas de diversas cores e qualidades. Havia um repuxo no jardim do meu avô com 2 canteiros laterais, com grandes tufos de tinhorões, begónias e avencas.
Nos fundos desse enorme quintal havia um vasto galinheiro com divisões, para as galinhas poedeiras e para as que deveriam ser abatidas, além de perus, marrecos e galinhas d'angola- Dentro do galinheiro existia um velho cajaeiro no qual subíamos para saborear os frutos e fazer guerra de caroços. Acertávamos de vez em quando, nos transeuntes desprevenidos que passavam na rua Dr. Leocadio. O enorme portão dos fundos só era aberto para entrar lenha e caixotes de louça."

Fonte: Lobo, Elfrida Marcondes, Retalhos de Uma Vida 1990
Fotos: Acervo digital IHGP - Paranaguá Atlas Eletrônico
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