ILHA DO MEL:
A lenda das "encantadas"
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Dizem os pescadores que vivem próximo, na Praia das Conchas, que nos tempos de antanho, viviam lindas mulheres na gruta das Encantadas.
Bailavam, ao amanhecer, como se festejassem o nascer do sol.
O seu encanto era dormente, feiticeiro, mortal. Pobre do pescador que escutava a cantoria. Largava dos remos, e o batel sem rumo ia despedaçar-se nos pedrouços bem da base do morro que domina a ilha, onde foi construído o farol.
À tarde, tornavam as ninfas a bailar, cantando o ocaso do ente vivificador, rei da criação, pai do calor e dono da luz.
Uma vez... um marinheiro mais destemido, escondeu-se por sobre o alcantil da gruta, bem antes de abrir-se a aurora na vastidão do Atlântico.
Era corajoso, mas tinha medo do que ia presenciar. As estórias que ouvira desde a meninice eram de arrepiar os cabelos. Jamais alguém fora bastante louco, para afrontar os seres sobrenaturais que lá habitavam.
Quando os céus se coloriam de rosa e nas nuvens haviam laivos de ouro e sangue, ouviu o intruso um suave canto que se escoava do interior das Encantadas.
A proporção que as bailarinas surgiam, o canto tomava mais ênfase, mais intensidade. "Cagmá, iengvê, oanan eiô ohó iá, engô que tin, in fimbré ixan an ióngóngue, iamá que nô ô caicó, katô nô ó eká maingvê..."
Aquilo queria dizer: " Passe com cuidado a ponte. Viva bem com os outros; assim como eles vivem bem, você também pode viver. Lá você há de ver muita coisa que já viu aqui em minha terra, assim como o gavião. Teus parentes hão de vir te encontrar na ponte e te levarão com eles para tua morada."
Estranhou o marinheiro que o sono não o vencesse. Pregou os olhos nas misteriosas mulheres, que nuas, de longos cabelos cor de algas, rodopiavam graciosamente, sem deixar marcas sobre a fina areia.
Após muito tempo, não aguentou a atração fascinante de uma das deidades, cujos olhos eram verdes como o mar, e... precipite ganhou aos trambolhões a prainha, metendo-se de permeio na farândola, mãos dadas com a sua escolhida.
Por artes de Anhanga, a jovem falou-lhe na língua que era a sua.
- Tens de partir, homem estranho! Gosto de ti, mas tens de partir!
- Nunca! Nunca! arredarei os pés de perto de ti, amor! Roga ao teu deus que me permita gozar de teu carinho e da tua eterna companhia.
- Para que vivas comigo é necessário que morras...
- Morrerei, se isto é preciso...
- Vem, então, meu doce amor... A fonte da vida nos chama... partamos...
Mãos entrelaçadas, ao canto fúnebre das bailarinas, os jovens entraram águas a dentro e quando desapareceram, já o sol era vitorioso.
As Encantadas se haviam sumido, para nunca mais aparecer.
E, desde então, a gruta está solitária, e nela se quebram os ecos dolentes e eternos do mar
Vasco José Taborda - 1937
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