SANTUÁRIO DE NOSSA SENHORA MÃE DOS HOMENS (CARAÇA) – CATAS ALTAS – MINAS GERAIS
O Santuário do Caraça é um dos lugares históricos mais belos e preservados do Brasil. Sua história pode ser dividida em três fases distintas: a época em que foi um eremitério (onde viviam ermitões), a época em que foi colégio interno, e a época atual, como santuário.
O IRMÃO LOURENÇO
Na segunda metade do século XVIII, época em que as cidades mineiras viviam o apogeu do ciclo do ouro, surgiram alguns homens que, insatisfeitos com a vida agitada das cidades, se embrenharam pelas montanhas e vales, buscando locais onde pudessem viver isolados uma vida de oração. O povo passou a chamá-los de ermitões – irmitoens, na linguagem de então. Entre os períodos de isolamento, os ermitões também costumavam visitar as cidades com oratórios pendurados ao pescoço, ocasião em que promoviam orações nas casas e obtinham esmolas para seu próprio sustento.
Os dois ermitões mais conhecidos de Minas Gerais são o Bracarena, que construiu sua ermida no alto da Serra da Piedade, e o ‘Irmão’ Lourenço, que, por volta de 1770, adquiriu uma sesmaria na região de Catas Altas do Inficionado, perto de onde se situava a ‘Caraça’ – nome dado a uma parte da montanha que se assemelha ao rosto de um gigante adormecido.
Pouco se sabe sobre o passado do Irmão Lourenço antes de se tornar ermitão. Algumas fontes dizem que se tratava de um nobre da família Távora, que veio para Minas como foragido de uma perseguição política em Portugal, e que, após viver por alguns anos no Arraial do Tejuco (atual Diamantina), resolvera abandonar definitivamente o ‘século’, tornado-se ermitão.
O que é certo é que ele era um homem proveniente de uma vida relativamente confortável, que adquiriu o terreno do ‘Caraça’, e ali se instalou de forma eremítica, construindo uma ermida sob a proteção de Nossa Senhora Mãe dos Homens – uma invocação de origem portuguesa que venera a Virgem Maria enquanto Mãe espiritual dos cristãos. O histórico do santuário assim relata:
Dedicando-se à vida penitente e ao atendimento dos peregrinos, mais tarde acompanhado de outros ermitães penitentes, o Irmão Lourenço cria, em Minas Gerais, um foco de atração para Deus, em meio ao tumulto minerador, e um centro de conversão, oferecendo ao povo uma alternativa à loucura do século. Com o desenvolvimento de seu Santuário, funda a Irmandade de Nossa Senhora Mãe dos Homens (1791-1885) e, com a ajuda de seus membros, e com as esmolas conseguidas em peregrinações por toda a Província, vai melhorando as instalações do Caraça e enriquecendo sua igreja e sua hospedaria.
Com a idade avançando e as dificuldades enfrentadas para a continuidade de sua obra, o Irmão Lourenço resolve fazer a doação das terras e do Santuário à Fazenda Real, a fim de que a Coroa Portuguesa conseguisse Padres que dessem continuidade ao centro de romaria e missão e, sendo possível, fundassem uma casa para educação de meninos. Foram feitos três requerimentos: o primeiro em 1806 e os dois últimos em 1810, todos sem resposta positiva.
No dia 27 de outubro de 1819, com cerca de 96 anos, o Irmão Lourenço faleceu, sem ver os Padres tomando posse de sua Ermida. No entanto, o velho penitente morreu consolado, pois, segundo os relatos do vigário de Catas Altas, que atendeu os últimos momentos de vida do santo fundador do Caraça, Nossa Senhora teria se manifestado a ele dizendo que podia morrer em paz, pois Deus não abandonaria a obra do Caraça. (1)
O COLÉGIO DO CARAÇA
No mês seguinte ao falecimento do Irmão Lourenço, chegaram ao Rio de Janeiro dois padres portugueses pertencentes à Congregação da Missão – ordem religiosa fundada na França por São Vicente de Paulo, e que também é conhecida como ordem dos ‘lazaristas’. Eram eles o Padre Leandro Rebelo Peixoto e o Venerável Antônio Ferreira Viçoso – que futuramente se tornaria Bispo de Mariana, e que atualmente está em processo de beatificação. O rei de Portugal cedeu a eles o conjunto do Caraça, que havia recebido em testamento do Irmão Lourenço, e conferiu-lhes a missão de fundar ali um colégio.
Após uma penosa viagem por aqueles caminhos ainda selvagens, ambos chegaram ao santuário, em 15 de abril de 1820. Naquele momento, tudo estava em situação de abandono. Porém, logo começaram a pregar missões nos arredores, e alguns meses depois chegaram os primeiros quatro alunos, provenientes do Rio.
O colégio foi então florescendo (no período 1820/1834, mais de 1.500 alunos foram matriculados), outros padres vieram da Europa para ministrar aulas, e, durante quase três décadas, o local abrigou também o Seminário Maior de Mariana, com aulas de teologia e Filosofia. Isso criou uma necessidade de ampliação, fazendo com que as construções fossem modificadas visando obtenção de mais espaço.
Uma dessas construções foi o ‘Cenáculo’ – uma capela que atualmente é dedicada ao Sagrado Coração de Jesus, situada cerca de duzentos metros acima do santuário. Foi edificada por sugestão de Dom Viçoso, para servir como parte do seminário interno que ali seria construído – ele próprio pensou em morar lá, depois que deixasse a vida episcopal em Mariana. Porém o local não chegou a ser utilizado para esse fim, e a capela ficou sozinha no meio da montanha.
A IGREJA DE NOSSA SENHORA MÃE DOS HOMENS
Nesse contexto de crescimento, surgiu também a necessidade de construir uma nova igreja no colégio, em substituição à ermida primitiva, que não comportava mais os alunos.
O superior do período 1867/1885, padre Júlio Clavelin – nascido em Neuvy-sur-Seille, na França – foi o grande empreendedor da construção da nova igreja, que ele mesmo projetou no estilo neogótico (o mesmo sacerdote também idealizara a Basílica da Imaculada Conceição, no Rio de Janeiro, já mostrada neste site).
A respeito do estilo gótico, no histórico da igreja do Caraça há a seguinte ponderação:
Ao contrário do barroco, o apelo religioso do neogótico não é mais ao emocional, mas ao racional, à capacidade intelectiva do ser humano, que pode caminhar ao encontro de Deus. Se, no barroco, os altares das Igrejas davam a impressão de que Deus vinha poderosamente sobre o fiel, na igreja neogótica toda a construção é feita para que o fiel possa alcançar a Deus, buscá-lo a partir de sua inteligência e reflexão. Igrejas altas, com ogivas e colunas, demarcam o espaço em que o fiel busca um encontro com o Transcendente, que vive em outro mundo, mas que pode ser encontrado. (2)
Assim, no ano de 1876 iniciou-se a demolição da pequena ermida e o levantamento da igreja nova, que foi feita inteiramente com material dos arredores: pedra-sabão retirada de perto de uma das cachoeiras da serra, mármore da região de Mariana e Itabirito, e quartzito da própria Serra do Caraça.
Durante a construção da igreja, o Colégio recebeu a visita do Imperador Dom Pedro II, que ali passou alguns dias com a imperatriz Teresa Cristina, em 1881. Chegou a assistir aulas junto com os alunos, e ao final da visita, comentou que “só a visita ao Caraça paga toda a viagem a Minas“.
As obras duraram sete anos, e a consagração do templo ocorreu em maio de 1883.
A torre possui 48 metros de altura, guarda três sinos, e, na cruz que fica no seu cume, contém uma relíquia do Santo Lenho – essa relíquia geralmente consiste em duas minúsculas lascas retiradas do madeiro da própria Cruz em que Cristo foi crucificado, que foi encontrada em escavações realizadas em Jerusalém, no ano de 326, por ordem de Santa Helena, mãe do Imperador Constantino.
Acima, o relógio da torre, com os seguintes dizeres: “Omni temporis hora – aeternitatis Deum adora” (Em todas as horas que marco, adore ao Deus eterno).
Acima, parte do jardim do santuário.
Acima, o símbolo dos franciscanos, feito em homenagem ao Irmão Lourenço: duas mãos chagadas entrecruzadas, uma simbolizando a mão de Jesus Cristo e outra, a de São Francisco. As datas indicam o início da construção da ermida do Irmão Lourenço e o cinquentenário das aparições de Nossa Senhora a Santa Catarina Labouré – o maior acontecimento ocorrido no interior da ordem fundada por São Vicente de Paulo (a esse respeito, ver também o histórico da Basílica da Imaculada Conceição no Rio). Também em honra a esses mesmos acontecimentos, foi posta uma imagem de Nossa Senhora das Graças, em frente à rosácea de pedra-sabão, com a inscrição da Medalha Milagrosa: “Ó Maria concebida sem pecado, orai por nós que recorremos a vós!”.
Abaixo, o interior da igreja, podendo-se notar as colunas feitas com pedras retiradas da montanha.
Acima e abaixo, ornamentação em pedra-sabão.
Acima, quadro da Santa Ceia, pintado por Manoel da Costa Ataíde, e que antigamente ficava no refeitório dos alunos. Abaixo, local aproximado da sepultura do Irmão Lourenço.
Na mesma época em que a igreja era edificada, foi também construído um órgão no próprio local, obra artesanal do padre Luiz Gonzaga Boavida, um dos professores do colégio.
Acima, oratório com a imagem de Nossa Senhora Mãe dos Homens, a mesma venerada no local desde a época do Irmão Lourenço. Os vitrais vieram da França, e aquele posicionado no centro foi adquirido mediante uma doação pessoal do Imperador Dom Pedro II.
Abaixo, relíquias de São Pio, um soldado romano martirizado por ser cristão. Tratam-se de ossos recobertos com uma imagem de cera, e um recipiente com pouco de sangue e areia. Esses restos mortais foram encontrados nas catacumbas de Santa Ciríaca, em Roma, em escavações realizadas no século XVIII. O papa Pio VI enviou essas relíquias de presente ao santuário, ainda na época do Irmão Lourenço (1797).
Abaixo, as capelas laterais do Sagrado Coração de Jesus (com uma imagem francesa do século XIX, e que anteriormente abrigava as relíquias de São Pio) e de Nossa Senhora das Dores. Essas capelas são parte da antiga ermida da época do Irmão Lourenço, e ainda guardam seus dois retábulos originais, que teriam sido policromados pelo Ataíde. A talha é atribuída a Francisco Vieira Servas, e, observando o traçado geral, bem como o estilo das colunas, percebe-se uma nítida semelhança destes com o retábulo do altar da ermida da Serra da Piedade, indicando que, talvez, os três sejam obras do mesmo artista.
Abaixo, o Calvário.
Abaixo, um quadro pintado por George Grimm em 1885, a pedido do Imperador Dom Pedro II. A paisagem praticamente nada mudou desde então.
Ao longo do período em que o Colégio do Caraça esteve ativo, foram educados ali alguns grandes nomes da vida pública brasileira, e inclusive dois ex-alunos tornaram-se presidentes da República: Afonso Pena e Arthur Bernardes.
No ano de 1968 um incêndio destruiu grande parte dos alojamentos dos alunos, fazendo com que o secular colégio encerrasse suas atividades.
Porém, os padres lazaristas continuaram habitando o local, realizando retiros e rezando missas na igreja. O enorme terreno, de cerca de 11.000 hectares, foi transformado em reserva particular da Congregação da Missão, e permanece praticamente intocado. É aberto para visitação do público, e constitui um refúgio de paz e tranquilidade para todos aqueles que, assim como o Irmão Lourenço, pretendem tirar suas mentes da agitação das cidades.
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REFERÊNCIAS:
– Carrato, José Ferreira. As Minas Gerais e os primórdios do Caraça. Rio de Janeiro: Companhia Nacional, 1963
– Zico, Pe. José Tobias; Caraça, Peregrinação, Cultura e Turismo. Belo Horizonte: Editora São Vicente, 1980.
– Santuário do Caraça – Site oficial
Notas (1) e (2):site oficial
Observação: A igreja do Caraça é considerada a primeira construção em estilo neogótico do Brasil. Entretanto, nas viagens para montagem deste site, deparamo-nos com outra igreja neogótica, cuja pedra fundamental é mais antiga: trata-se da Matriz de Nossa Senhora da Purificação, que teve sua construção iniciada por colonos alemães no ano de 1871, no povoado de Bom Princípio, Rio Grande do Sul. Porém, como esta levou quase vinte anos para ser consagrada (1889), e mais alguns anos para ser finalizada, temos que a igreja do Caraça realmente ficou pronta antes, uma vez que, tendo sido iniciada em 1876, foi terminada em 1883.
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