quinta-feira, 7 de novembro de 2024

BRUTUS SURGE ! Brutus foi essencial para a conspiração contra Júlio César,não fosse Brutus, não haveria assassinato. Os conspiradores insistiam em sua presença


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Brutus foi essencial para a conspiração contra Júlio César,não fosse Brutus, não haveria assassinato.
Os conspiradores insistiam em sua presença.

O princípio deles era que seria preciso um rei para matar a um rei; ou ao menos um príncipe, e Brutus era, praticamente, um príncipe republicano.

Ele possuía a autoridade e as conexões que os romanos admiravam.
Filho de um Populista, sobrinho de um dos líderes dos Melhores Homens, inimigo e depois apoiador de Pompeu e de César, cada um a seu turno, filho da amante de César e objeto de rumores quanto a ser, ele mesmo, filho de César.

Brutus era todas as coisas, para toda gente.
Supostamente ele provinha de uma das mais antigas famílias da República: aquela que destronara reis.

E ele tinha o assassino de um tirano proeminente em sua árvore genealógica.
Ele contava com um registro público de mais de uma década de defesa da liberdade e oposição à ditadura.

Em algum tempo, durante os anos 50 a.C.,Brutus fizera cunhar moedas celebrando tanto a Libertas, a deusa da liberdade, quanto aos seus ancestrais que se opuseram a reis e tiranos.

Em 54 a.C. ele se pronunciou contra uma proposta de concessão de uma ditadura a Pompeu. Dois anos mais tarde, ele argumentaria que um homem que cometesse um assassinato pelo bem da República deveria ser considerado inocente.

Ele era admirado como um pensador e orador.
Nicolaus de Damasco afirma, concisa porém ceticamente: “Marcus Brutus [...] foi respeitado durante toda a sua vida pela clareza de sua mente, pela fama de seus ancestrais e por seu caráter supostamente razoável.”

O amor de Brutus pela filosofia grega exige uma abordagem equilibrada.
A filosofia acrescentava-lhe profundidade e conquistava-lhe respeito. Ela permitia que ele discorresse sobre ideais consagrados pelo tempo e posasse de maneira impressionante.

Brutus aprendera a reconhecer a tirania, a desprezá-la e a levantar-se contra ela.
Mas o interesse romano pela cultura grega raramente era muito substancial.

Os assassinos de César eram homens práticos.
Sua exigência por Brutus tinha pouco a ver com a habilidade que ele demonstrava possuir para citar Platão.
Os conspiradores diziam estar lutando pela República, sobre a qual eles não se referiam apenas quanto à mera concepção, mas também ao poder que a acompanhava.

Para os romanos tal como para a maioria das pessoas, os princípios e os lucros são inseparáveis.
A política em Roma era um caminho para a honra, o dinheiro e o poder.

César ameaçara tomar muito de tudo isso apenas para si. Brutus apontou para uma maneira de retomar o que César havia usurpado, ao mesmo tempo que realentava os ideais da República.

Acima de tudo, os conspiradores desejavam um líder que conseguisse mantê-los vivos.
Brutus lhes daria a credibilidade necessária durante a tempestade que certamente sobreviria depois do assassinato.

Se um homem com seu pedigree e seus princípios chamasse César de tirano, o público acreditaria nele. Ao contrário, se Brutus se mantivesse leal a César “cortaria as pernas” dos conspiradores.

Também importava muito o fato de Brutus gozar do favorecimento de César.
César fizera de Brutus um governador, um pretor urbano e um cônsul.
Ao arriscar tudo para matar César, Brutus demonstraria sua coragem e seus princípios.

Na verdade, ele demonstraria igualmente a sua ingratidão; mas a importância disto empalidecia quando comparada à sobrevivência da República.
Brutus era, em resumo, o melhor endosso para a conspiração e a melhor “rede de segurança” para os conspiradores.

A questão é: o que ele ganharia com isso?
Tão recentemente quanto em agosto de 45 a.C., a resposta pareceria ser: nada.
Brutus escreveu a um cético Cícero dizendo acreditar que César estivesse pronto para juntar-se aos Melhores Homens.
Sete meses mais tarde, Brutus adentrou a Casa do Senado com uma adaga pronta para ser usada.

O que mudara?

Poucos personagens na História antiga surgem tão detalhadamente delineados quanto Marcus Brutus. Quase nos é possível reconstruir seus pensamentos neste ponto de mutação crucial.

Sua personalidade, seus princípios, suas excentricidades e seus relacionamentos-chave (com sua esposa, sua mãe e seu cunhado), tudo deixa uma marca nas evidências. No final, entretanto, os fatos são tão frustrantemente incompletos que temos de recorrer, como de costume, às especulações informadas.

Brutus também é um dos personagens mais mal compreendidos da História.
Por isso devemos agradecer a Shakespeare. As fontes antigas retratam Brutus como um homem corajoso, dotado de espírito público, calculista e ingrato.

Shakespeare, em vez disso, faz dele um modelo de comportamento ético.
Em sua Tragédia de Júlio César ele faz Brutus agonizar diante da perspectiva de matar a um amigo que ele ama.
Os antigos nada dizem sobre isso.

O Brutus retratado por Plutarco se preocupa com os riscos de matar César; não com as implicações
morais disso.
O que faz de Brutus um adversário valoroso é que, tal como César, ele era multifacetado e icônico.

Brutus agitava as pessoas com sua mentalidade filosófica, sua linhagem, sua coragem, seus princípios e seu amor pela liberdade;mas ele também era um oportunista e um extorsionário.

Em César, o egoísmo, a ambição, o talento, a rudeza, a visão, o populismo e a revolução vinham juntos, de uma maneira que ainda hoje é melhor resumida em seu próprio nome: César.
César atravessou rios de sangue na Gália, enquanto Brutus empunhou a adaga mais ensanguentada da História romana.
No entanto, ambos ainda irradiam um grande encanto pessoal.

Quatro coisas mudaram entre agosto de 45 a.C. e meados de fevereiro de 44 a.C.: César, a opinião pública, Cassius e a esposa de Brutus.
Durante esses sete meses críticos, César amedrontou grande parte da opinião pública romana levando-a a acreditar que substituiria a República por uma ditadura perpétua ou, possivelmente, um reinado, no qual tanto o Senado quanto o povo seriam subordinados a ele.

Nem mesmo o prêmio de um consulado poderia fazer com que Brutus continuasse a acreditar que César pretendesse se unir aos Melhores Homens.

O que a ditadura perpétua de César significava para Brutus?
Plutarco interpretou um comentário de César como se este dissesse que Brutus seria seu sucessor mais adequado. “O que, então?

Vocês não acham que Brutus esperará por este pedaço de carne?”, teria dito César, tocando seu próprio corpo.
Ele estava respondendo às pessoas que acusavam Brutus de estar tramando contra ele.

A frase, contudo, não revela as expectativas de César. César não adotara Brutus postumamente, como fizera com Otávio; e o nome de Brutus tampouco era mencionado no testamento de César, como os de outras pessoas.

César promovera Brutus aos mais altos cargos da República. Mesmo assim, sob o poder de César, toda a influência fluía das altas câmaras na direção de César e seus amigos. Plutarco acrescenta que Brutus podia dizer ser o homem mais poderoso de Roma após a morte de César, mas esta não era uma expectativa razoável, mesmo com a concorrência que ele enfrentaria.

Quer tenha sido espontaneamente ou por meio de um esforço orquestrado, uma campanha de relações-públicas emergiu para persuadir Brutus a agir. Graffiti surgiram, tanto no tribunal que ele costumava presidir como pretor urbano quanto sobre a estátua de seu suposto ancestral, Lucius Junius Brutus, que destronara reis, na Colina Capitolina.

Foram escritas frases tais como “Se ao menos agora você agisse como Brutus”, “Se ao menos Brutus estivesse vivo”,

Brutus, desperte!” e “Você não é realmente Brutus!” Alguns pensaram que essas palavras, mais do que qualquer outra coisa, moveram Brutus.

Ele já havia apostado sua reputação ao apoiar-se no famoso amor que sua família nutria pela liberdade; agora teria de bancar a aposta.
Cícero pode ter aludido a esses famosos ancestrais quando escreveu em seu Brutus, em 46 a.C., que ele desejava para Brutus “aquela República na qual você poderá não apenas renovar[200] a fama de suas duas famílias tão distintas como acrescentar algo a ela.”

Essas eram palavras provocativas, mas certamente não ao ponto de fazerem Brutus tomar de uma adaga.
Cícero ainda esperava que César viesse a restaurar a República.
Quanto a Cassius, ele empregou suas consideráveis habilidades estratégicas para convencer Brutus a se juntar a ele contra César.

Na visita que fez à casa de Brutus, que descrevemos no início deste capítulo, Cassius não apenas pôs fim à querela relativa à pretoria urbana, mas também perguntou a Brutus, diretamente, o que ele faria na próxima reunião no Senado.

Cassius comentou sobre um boato de que os amigos de César proporiam que ele fosse feito rei.
Brutus disse que permaneceria em sua casa, mas Cassius insistiu: e se eles fossem convocados a comparecer, como agentes públicos?

Neste caso, supostamente teria dito Brutus, ele cumpriria seu dever de defender seu país e morreria em nome da liberdade, se necessário. Diz-se que Cassius mencionou os graffiti em resposta, assegurando a Brutus que os autores seriam membros da elite romana e não meros artesãos ou mercadores, uma demonstração de esnobismo perfeitamente condizente com os preconceitos romanos documentados.
Aqueles homens não desejavam que Brutus morresse, disse Cassius, mas que os liderasse!

Então, com um abraço e um beijo, uma conspiração nascera.
Ao menos assim diz a História.
Não havia contagem de votos na Roma antiga, nem qualquer método científico de medição da opinião pública.

Brutus não dispunha de meios de saber se os graffiti realmente representavam a opinião pública.
Ele não podia ter certeza de que os autores fossem pessoas da qualidade e influência que Cassius dissera.
Mas os graffiti o fizeram ter esperança de que podia contar com o apoio popular de que a conspiração necessitava para que fosse bem-sucedida.

E então havia Pórcia, a nova esposa de Brutus. Ela era uma mulher forte. É difícil não suspeitar que ela tenha dado um “empurrãozinho” para que Brutus tomasse um novo rumo.

Para Brutus, uma coisa era voltar as costas para o legado de Catão quando estivesse longe dos domínios de Catão; mas uma coisa muito diferente era voltar para sua própria casa, todas as noites, para os braços da filha de Catão.

Não é de admirar que se diga que Pórcia tenha sido a única mulher a conhecer o segredo da conspiração. E, por fim, havia Servília.
Não há evidências de que ela soubesse da conspiração; muito menos que se opusesse a César.

A hostilidade dela para com Pórcia sugere exatamente o contrário. Além do mais, não haveria créditos a serem obtidos por Servília por tramar a morte de seu ex-amante.
Nos anos posteriores, Antônio sempre a tratou com cortesia, coisa que ele não faria se soubesse que Servília teria tomado parte na conspiração.

Mesmo assim, as fontes indagam o que qualquer um poderia pensar: se um fervoroso ressentimento quanto ao seu caso amoroso com César não teria contribuído para que Brutus se juntasse à conspiração.

Ele não acreditava nos rumores que diziam ser César o seu pai, porque nenhum romano jamais consideraria o crime de matar ao próprio pai. Acreditar e ouvir são duas coisas diferentes; embora talvez Brutus alimentasse uma mágoa que agora aflorava.

Foi o interesse próprio de Brutus que o afastou de César. Suas convicções filosóficas não tolerariam um tirano.

Nenhum nobre romano ignoraria a honra e a reputação de sua família, muito menos Brutus, que escrevera sobre o tema dos deveres para com a própria família.

Ele tinha de viver à altura da reputação de um Junius Brutus e de uma Servília Ahala.
Ele tinha de estar à altura do legado de seu falecido tio, Catão, que agora era não apenas seu mentor, mas, também, postumamente, seu sogro. Ele tinha sua esposa, Pórcia.
Ele tinha seu cunhado, Cassius.
E talvez ele também tivesse uma sombra de vergonha que eliminar com respeito à sua mãe, Servília, e o insulto da ilegitimidade através do amante dela, César.

Brutus acreditava em ideais que eram maiores do que ele mesmo: na filosofia, na República e em sua família.
E, assim, mais uma vez, Brutus traiu a um homem mais velho que confiara nele, tal como fizera anteriormente com Pompeu e, depois, com Catão.

📚FONTE:
A Morte de César, Roma Antiga e o Assassinato Mais Famoso da História.
de Barry Strauss

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