quinta-feira, 25 de setembro de 2025

A Revolta das Barcas: Quando o Povo de Niterói Disse “Basta!”

 


A Revolta das Barcas: Quando o Povo de Niterói Disse “Basta!”



Em 1º de abril de 1959, Niterói não celebrou o Dia da Mentira — viveu uma verdade dura, crua e explosiva.
O que começou como um protesto contra o aumento abusivo das tarifas das barcas que ligavam a cidade ao Rio de Janeiro transformou-se em uma das maiores revoltas populares da história do estado do Rio de Janeiro — um grito coletivo contra a exploração, a negligência e a impunidade.

Naquele dia, o Grupo Carreteiro, empresa privada que detinha o monopólio do transporte hidroviário, anunciou um aumento de 50% nas passagens — em pleno contexto de inflação galopante e salários congelados. Para os milhares de trabalhadores que dependiam das barcas para ir ao trabalho, estudar ou cuidar da família, aquilo era um golpe direto na sobrevivência.

A reação foi imediata.
Na manhã seguinte, 2 de abril, uma multidão se reuniu no Terminal Hidroviário de Charitas, em Niterói. O que era um ato pacífico logo se transformou em revolta generalizada.

Os manifestantes, entre operários, estudantes, donas de casa e comerciantes, invadiram as embarcações, depredaram guichês, queimaram bilheterias e, em ato simbólico de justiça popular, incendiaram a residência da família Carreteiro — símbolo do poder que, segundo a população, tratava o transporte público como fonte de lucro, não como direito.

O fogo se alastrou.
As barcas “Icaraí”, “Guarani” e outras foram destruídas pelas chamas.
O caos tomou conta da cidade.

A violência, infelizmente, também.
Seis pessoas morreram — entre elas, civis inocentes e manifestantes.
118 ficaram feridos, muitos por balas da polícia, que tentou conter a multidão com força desproporcional.

Diante da gravidade da situação, o governo federal interveio.
O presidente Juscelino Kubitschek, inicialmente hesitante, reconheceu que a revolta não era um ato de vandalismo, mas um clamor social legítimo.

Em maio de 1959, apenas um mês após os confrontos, o governo estatizou o sistema hidroviário, criando a Companhia Estadual de Barcas — colocando o transporte sob controle público e anulando o aumento abusivo.


Mais que um Protesto: Um Marco de Consciência Popular

A Revolta das Barcas não foi um surto de violência — foi a explosão de décadas de insatisfação.
As embarcações estavam superlotadas, mal conservadas, com horários irregulares.
Enquanto isso, a família Carreteiro vivia em luxo, com mansões em pontos nobres da cidade.

O povo de Niterói, conhecido por sua resiliência e espírito combativo, mostrou que não aceitaria ser tratado como mercadoria.
E, mesmo com o alto custo humano, venceu.

A estatização das barcas durou por décadas — até os anos 2000 — e, apesar de seus problemas, manteve o transporte como serviço público, não como negócio privado.


Lembrar para Não Repetir

Hoje, mais de 60 anos depois, a Revolta das Barcas permanece como um alerta e um exemplo:

Quando o povo é esmagado pela injustiça, ele se levanta — mesmo que precise queimar o que o oprime.

As seis vidas perdidas não devem ser esquecidas.
Elas são o preço que a sociedade paga quando a desigualdade e a ganância substituem o direito à dignidade.

E a lição permanece atual:
Transporte público de qualidade não é favor — é direito.
E quem tenta transformá-lo em fonte de lucro, sem olhar para quem depende dele, corre o risco de enfrentar não só a ira do povo — mas a história.


Em memória das vítimas da Revolta das Barcas —
e em defesa de um transporte público justo, acessível e humano.


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A Revolta das Barcas, um levante popular contra o sistema hidroviário da cidade de Niterói em 1959.

A revolta, além de seis mortos e 118 feridos, resultou na depredação e incêndio tanto do patrimônio das barcas quanto da residência da família de empresários que administrava o serviço, o Grupo Carreteiro, e terminou com intervenção federal e estatização das barcas.
Na época anterior à construção da ponte Rio-Niterói, a principal ligação entre essas duas cidades era por meio das barcas, que transportavam 100 mil pessoas por dia, principalmente trabalhadores indo de casa em Niterói para o trabalho na capital fluminense. Desde 1953, as barcas eram administradas pelo Grupo Carreteiro, que modernizou o serviço, mas começou a cobrar cada vez mais pela tarifa, sem resolver os problemas de superlotação e atraso. Ao mesmo tempo, reivindicava mais subsídios do governo, alegando prejuízo, embora o enriquecimento da família dona do grupo fosse cada vez mais aparente. Para completar, os administradores não cumpriram o acordo para aumentar o salário dos funcionários, que entraram em greve na noite de 21 de de maio.
Fuzileiros navais então foram chamados para suprir o transporte, mas seus barcos não tinham capacidade suficiente, e pela manhã a aglomeração começou a crescer. Os militares tentaram controlar a multidão com agressões e as pessoas reagiram jogando pedras. A resposta foi uma rajada de metralhadora para o alto. Foi o estopim da revolta. As barcas foram depredadas, e a estação, incendiada. De lá, as pessoas seguiram para o escritório do grupo, jogaram móveis e documentos na rua e colocaram fogo em tudo.
A população seguiu posteriormente para a residência da família do Grupo Carreteiro. Os imóveis foram saqueados e incendiados e o conflito só terminou com o envio de tropas do Exército. De acordo com o noticiário da época a revolta durou 16 horas e deixou 5 mortos e 126 feridos (há controvérsias quanto ao número de vítimas).
Finalmente, os militares conseguiram dominar a situação, chamada pela imprensa de “uma pequena Bastilha”. A revolta deixou seis mortos e mais de 180 feridos, além dos danos materiais. Após a Revolta das Barcas, o transporte foi estatizado, as tarifas foram reduzidas e os serviços foram expressivamente melhorados. Foi encomendada a construção de seis novas embarcações com capacidade para 2 mil passageiros, dentre elas a "Vital Brasil", inaugurada em 1963. A partir de 2012, as barcas passaram a ser operadas mediante uma concessão estadual.

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