BONDINHOS DE PARANAGUÁ, SÓ RESTOU SAUDADES
Conforme crescia, percebia que os trilhos e calçamentos iam desaparecendo dando lugar ao negrume dos asfaltos, trazendo consigo novos meios de locomoção.
Indagações perscrutavam em minha mente, buscando respostas: Que papel esses trilhos cumpriram em sua existência? O quê circulou sobre eles? Quem os usou?
Saudoso de um momento tão ímpar da evolução da nossa cidade, resgatei algumas memórias daquela época.
Aqueles trilhos contavam a história de uma epopéia ocorrida quando bondinhos eram puxados por mulas que cruzavam a cidade, levando e trazendo as pessoas, sem distinção de classes, cor ou raça. Era um tempo em que todos viviam alegremente, sem medo de assaltos, quando sequer era preciso conceituar o "direito de ir e vir". Todos iam e vinham, de onde, para onde, quando e como queriam.
Nos bondinhos não havia as super-lotações que hoje se observam nos coletivos. Ninguém tinha pressa e nem podia tê-la, porque o bondinho não corria mais do que permitiam as pernas heróicas dos quadrúpedes que, embora chicoteadas pelo "cocheiro", não saíam daquele trotezinho sossegado. Contudo, aquilo era agradável. Pagava-se alguns "réis" pelo trajeto e tinha-se o direito de embarcar naqueles toscos bancos e tagarelar à vontade com os demais, apreciar a bela natureza ou até dormir sossegadamente durante o trajeto, se quisesse.
Os percursos não eram feitos de um só fôlego pelos burricos. Havia, em vários pontos do trajeto, lugares de parada obrigatória, chamados "mudas". Ali, o bondinho parava da sua caminhada e mudavam-se os burros do percurso por burros descansados que ficavam à espera, atrelados e resignados. Substituídos os animais, lá seguia o veículo, até o fim do trajeto, onde outras "mudas" aguardavam para fazer o percurso inverso.
O sistema foi implantado em 02/04/1892, ligando o Porto D.Pedro II (era na antiga Rua da Praia) ao centro da cidade. Em 07/12/1893, a "Empreza de Transportes de Paranaguá" adquiriu duas locomotivas a vapor, de 20 hp's, e inaugurou uma linha de 5 km, estendendo o trajeto até ao bairro do Rocio. As duas locomotivas eram usadas em dias de grande movimento.
Em 1912, o empreendimento recebeu mais alguns bondes de tração animal e a vapor, vindos de Curitiba por ocasião da eletrificação deles na capital. Nessa ocasião, o sistema possuía 11 bondes, para carga e passageiros, puxados por 33 burros e mulas. O percurso até ao Rocio havia se tornado atração turística e permaneceu funcionando até 1938.
É possível que ainda haja pessoas vivas que se lembrem desses bondinhos com seus heróicos burros e seus cocheiros de apito na boca, alardeando sua passagem pelas quadras afora. Seus surrados lombos ajudaram a dar a qualidade de vida da cidade, naquela época, bem como contribuíram com o seu progresso.
Paulo Grani.
Agradecimento especial ao IHGP, à Guadalupe Vivekananda, Moisés da Costa Soares e José Maria Freitas, pela prestimosa colaboração.
LINHAS E PERCURSOS:
1a. Linha - Saia do paço do bebedouro atrás do Mercado do Peixe, passava em frente ao Mercado Geral, seguia pela Rua General Carneiro (Rua da Praia) até a Praça Glicério (Guincho), prosseguia até a Praça Joao Guilherme (Capitania dos Portos) e virava à esquerda entrando na Boullevard Serzeoelld (Av. Cel. José Lobo), prosseguia até chegar à Praça Ubaldino (frente à Alfândega). De lá entrava na Rua Dr. Munhoz da Rocha (Manoel Bonifácio) até alcançar a Av. Bento Rocha, prosseguindo até o Santuário do Rocio.
2a. Linha - Saia frente da Escola Humanitária (atual IHGP) percorria a Rua XV de Novembro até chegar à Igreja de São Francisco da Penitência (atual Igreja da Ordem), entrava na Rua Presciliano Correa e, dobrando na esquina com a Rua Visconde de Nacar, passava em frente ao Paço Municipal (Palácio Visconde de Nacar) até chegar à Boullevard Serzeoelld (Av. Cel. José Lobo), onde interligava-se à 1a linha.