Conheça a história da "cruz do padre", entre o Campeche e a Joaquina
Conheça a história da "cruz do padre", entre o Campeche e a Joaquina
Estrutura homenageia sacerdote que morreu afogado e é rodeada por causos de arrepiar
Gabriela Wolff
gabriela.wolff@horasc.com.br
Imponente entre as dunas, visível aos olhos de quem caminha pela praia do Campeche à Joaquina, em Florianópolis, a cruz de cimento de mais de dois metros chama atenção. Fincada em 1961 em homenagem a um padre que morreu afogado no mar bravo em frente, a cruz virou ponto de referência, local de orações, devoção e de lendas entre os mais antigos.
O historiador Hugo Adriano Daniel, nativo da região, é pesquisador da história do Rio Tavares e relata que a cruz foi colocada naquele ponto poucos dias após a morte do padre gaúcho Alfredo Dullius, na época com 45 anos. Segundo relatos orais e registros, na encosta do morro, próximo aonde hoje se localiza a Igreja de Pedra do Rio Tavares, que antigamente pertencia ao Colégio Catarinense, existia um casarão, em que padres e seminaristas costumavam passar os fins de semana em meio a natureza. Naquele tempo, a luz elétrica ainda não havia chegado na região, e a estrada era totalmente de terra:
— Logo depois do almoço, no dia 26 de dezembro de 1961, o padre Alfredo e seminaristas pegaram a trilha em meio às dunas e foram tomar banho de mar. Pelos relatos, o padre entrou na água de batina, e no primeiro mergulho caiu em uma corrente de repuxo e não conseguiu mais sair. Até tentaram salvá-lo, mas não foi possível — conta Hugo.
Os seminaristas saíram desesperados em busca de ajuda. Alguns foram em direção a base aérea, que enviou um avião de treinamento militar, que localizou o corpo boiando a cerca de um quilômetro da costa. Pescadores do Campeche também tentaram em vão, chegaram a jogar cipó-banana, mas não teve jeito. O mar estava tão revolto que tiveram dificuldades até para erguer o corpo para a canoa, e foi preciso amarrar uma corda e arrastá-lo até o pico do Campeche, no local chamado Pontal, uma operação que durou mais de três horas.
O bombeiro aposentado Artur Nunes, 84 anos, nascido e morador do Rio Tavares até hoje, recorda que foi uma grande comoção entre todos, e na mesma semana o padre Alvino Bertholdo Braun, que era o pároco da Igreja de Pedra, encomendou a cruz:
— O padre veio falar com o meu pai para fazer o cepo para a cruz, que depois fizemos de ipê-amarelo com 2,2 metros. A cruz era grande e pesada, levamos até as dunas pela Picada da Isidoro de carro de boi. No dia de colocar teve uma missa muito grande, encheu de gente — recorda.
Quem ele era
O padre era professor no Colégio Catarinense há três anos e também capelão auxiliar da Escola de Aprendizes Marinheiros no Estreito, por isso tinha muitos amigos e conhecidos na cidade, conforme explica o historiador.
O advogado Aluísio Dobes, 75 anos, foi aluno do padre Dullius no Colégio Catarinense no 1º Científico, equivalente ao Ensino Médio nos dias atuais. Ele conta que o sacerdote tinha uma característica muito interessante:
— Ele tinha um olho verde e outro azul. Era professor de história mundial, e colocamos o apelido nele de "long play", pois ele abria um mapa mundi no púlpito e com uma vareta apontada, começava a falar e não parava mais contando a história. Foi um choque muito grande quando ele morreu, todos gostavam dele. Eu não estava mais na escola porque tinha ido servir o exército, mas soube pelo boca a boca dos amigos — recorda.
— Depois disso, passaram a chamar aquele lugar de Picada da Cruz do Padre. Os antigos chamam assim até hoje, essa coisa de "Pico da Cruz" foram os surfistas que inventaram — conta.
Seu Artur explica que há uns 15 anos tiveram que substituir a cruz original por uma de concreto, pois a madeira apodreceu devido a maresia.
Lendas em torno da cruz
Morador do Campeche, o historiador Hugo conta que cresceu ouvindo os pescadores falarem que tinham medo de passar na Picada da Cruz, pois o fantasma do padre aparecia:
— Outra curiosidade é que os pescadores relataram que quando resgataram o corpo, o padre estava com as mãos em oração, e em nenhum momento o corpo afundou — recorda.
Para Artur, tudo era imaginação dos pescadores:
— Já ouvi falar que viram vultos próximo da cruz, mas é tudo lenda, coisa da cabeça das pessoas — finaliza.
Mas, por via das dúvidas, se você tem medo dessas coisas, é melhor evitar a picada.
(Do www.clicrbs.com.br)