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sexta-feira, 26 de dezembro de 2025

José Nunes Bellegard e sua Casa Moderna na Avenida 7 de Setembro: Um Marco Efêmero da Arquitetura em Concreto Armado em Curitiba

 Denominação inicial: Projéto de Residência para o Snr. José Nunes Bellegard

Denominação atual:

Categoria (Uso): Residência
Subcategoria: Residência de Médio Porte

Endereço: Avenida 7 de Setembro, nº 2607, esquina com Rua Pasteur

Número de pavimentos: 1
Área do pavimento: 276,00 m²
Área Total: 276,00 m²

Técnica/Material Construtivo: Concreto Armado

Data do Projeto Arquitetônico: 02/03/1941

Alvará de Construção: N° 5225/1941

Descrição: Projeto Arquitetônico para construção de residência e Alvará de Construção com Memória de Cálculo.

Situação em 2012: Demolido


Imagens

1 - Projeto Arquitetônico.
2 - Alvará de Construção com Memória de Cálculo; Projeto das vigas em Concreto Armado e Memorial Descritivo.

Referências: 

1 - CHAVES, Eduardo Fernando. Projéto para Residência. Propriedade do Snr. José Nunes Bellegard. Planta baixa da residência, garagem, lavanderia e depósito representados em uma prancha. Microfilme digitalizado.
2 - Alvará n.º 5225

Acervo: Arquivo Público Municipal de Curitiba; Prefeitura Municipal de Curitiba.

José Nunes Bellegard e sua Casa Moderna na Avenida 7 de Setembro: Um Marco Efêmero da Arquitetura em Concreto Armado em Curitiba

Curitiba, 2 de março de 1941. Enquanto o mundo mergulhava na Segunda Guerra Mundial, na capital paranaense o progresso civil seguia seu rumo. Nesse contexto, um projeto arquitetônico inovador foi assinado: uma residência de médio porte, inteiramente em concreto armado, destinada a José Nunes Bellegard — um nome que, embora pouco lembrado nos livros de história, deixou uma marca profunda na paisagem urbana da cidade. Localizada na imponente Avenida 7 de Setembro, nº 2607, esquina com a Rua Pasteur, a casa era mais do que um lar: era um símbolo do futuro, uma declaração de modernidade em pleno coração de Curitiba. Hoje demolida — desaparecida até 2012 —, sua existência permanece viva nos traços técnicos do projeto e na ousadia de seus cálculos estruturais.


O Proprietário: José Nunes Bellegard — Um Homem à Frente do Seu Tempo

José Nunes Bellegard era, certamente, um homem de visão. Em 1941, optar por construir uma casa em concreto armado — material ainda caro, complexo e relativamente novo no Brasil — era um ato de coragem e sofisticação. Isso indica que Bellegard não era apenas um cidadão comum, mas alguém com acesso a recursos, conhecimento técnico ou, no mínimo, uma confiança inabalável no futuro da construção moderna.

Seu endereço — Avenida 7 de Setembro, uma das artérias mais prestigiadas da cidade — já denunciava seu status. Essa avenida, com largos canteiros centrais, árvores centenárias e mansões ecléticas, era (e continua sendo) um corredor de elite. Morar ali era afirmar pertencimento a uma Curitiba em ascensão.

Bellegard, cujo sobrenome sugere raízes francesas ou belgas, provavelmente fazia parte da elite intelectual, empresarial ou técnica da capital. Seu nome não aparece com frequência em registros públicos, mas sua escolha arquitetônica fala por si: ele não queria apenas uma casa. Queria uma obra.


A Residência: Modernidade em Uma Só Planta

Com 276,00 m² em um único pavimento, a residência de José Nunes Bellegard era generosa, funcional e surpreendentemente avançada para sua época. Projetada pelo arquiteto Eduardo Fernando Chaves, a planta integrava não apenas os ambientes privados (salas, quartos, cozinha), mas também espaços de serviço modernos: garagem, lavanderia e depósito — elementos que refletem a crescente mecanização do cotidiano doméstico nos anos 1940.

O uso de concreto armado foi o verdadeiro protagonista. Diferente das casas de alvenaria ou madeira comuns à época, essa construção permitia vãos maiores, paredes mais finas, fachadas mais limpas e uma liberdade espacial inédita. Era a primeira linguagem do modernismo se infiltrando na arquitetura residencial curitibana — ainda tímida, mas inequívoca.

Além do projeto arquitetônico, o Alvará de Construção nº 5225/1941 incluía uma Memória de Cálculo, projeto das vigas em concreto armado e um Memorial Descritivo — documentos raros para residências da época, que indicam um nível elevado de engenharia envolvido. Isso sugere que, possivelmente, um engenheiro estrutural colaborou diretamente com Chaves, transformando a casa em um verdadeiro laboratório de técnicas construtivas.


A Localização: O Palco Ideal para uma Casa Moderna

A esquina da Avenida 7 de Setembro com Rua Pasteur era um local estratégico. A avenida, inaugurada nas primeiras décadas do século XX, simbolizava a modernização da cidade — com iluminação elétrica, calçamento, bondes e, mais tarde, automóveis. Já a Rua Pasteur, nomeada em homenagem ao cientista francês, reforçava a identidade intelectual e cosmopolita do bairro.

Construir ali, em pleno centro expandido, era uma escolha deliberada. Bellegard não queria se esconder. Queria que sua casa fosse vista, admirada, reconhecida como parte do novo Curitiba — uma cidade que, aos poucos, deixava de ser província para se tornar metrópole.

A planta do terreno, em esquina, permitia duas fachadas visíveis — uma oportunidade rara para um arquiteto explorar composições simétricas ou dinâmicas. Embora não tenhamos fotografias da construção final, é provável que a casa tivesse linhas horizontais alongadas, grandes janelas, talvez uma marquise de concreto e um jardim bem planejado — elementos típicos do que viria a ser chamado, anos depois, de “estilo internacional”.


A Demolição: O Custo do Progresso

Em 2012, a casa já não existia. Demolida, provavelmente para dar lugar a um edifício comercial, um estacionamento ou uma nova residência de maior densidade, ela foi apagada do tecido urbano silenciosamente — sem protestos, sem registros de despedida.

Sua perda é simbólica. Representa não apenas a destruição de um imóvel, mas o apagamento de um momento histórico crucial: aquele em que Curitiba começou a experimentar a linguagem moderna da arquitetura, antes mesmo do auge do urbanismo nos anos 1960.

Felizmente, o projeto sobreviveu — digitalizado em microfilme, com planta baixa clara, setorizada, funcional. E o alvará, com seus cálculos estruturais, é uma relíquia técnica: rara prova de que, mesmo em residências particulares, a engenharia moderna já se fazia presente no Paraná nos anos 1940.


Legado: A Casa que Antecipou o Futuro

A residência de José Nunes Bellegard pode ter sido efêmera, mas seu legado é duradouro. Ela representa:

  • A adoção pioneira do concreto armado em habitações de médio porte em Curitiba;
  • A integração entre arquitetura e engenharia em um período de transição tecnológica;
  • A afirmação da identidade moderna de uma elite que via na arquitetura um reflexo de seu tempo;
  • E, acima de tudo, a coragem de construir diferente, mesmo em tempos incertos.

Hoje, ao passar pela Avenida 7 de Setembro, ninguém mais vê a casa de Bellegard. Mas, se olharmos com atenção, podemos sentir sua ausência — e imaginar o que poderia ter sido preservado, se valorizássemos mais as primeiras vozes do modernismo local.


Em homenagem a José Nunes Bellegard — um visionário discreto, cuja casa foi curta em anos, mas longa em significado.

“Modernidade não é feita apenas de grandes obras, mas de escolhas ousadas em momentos silenciosos. E às vezes, o mais revolucionário é simplesmente construir com concreto, em pleno 1941.”


Referência Final:
O projeto original (Planta baixa com garagem, lavanderia e depósito) e o Alvará nº 5225 permanecem arquivados como testemunhos técnicos e históricos — não apenas de uma casa, mas de um momento em que Curitiba começou a sonhar em concreto.