A estação de Ponta Grossa, em 1935 (Relatório da RVPSC)
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Houve um tempo, mais precisamente entre 1909 e 1976, que se podia ir de São Paul a Curitiba de trem. Por que isso acabou?
Especificamente, viajar de trem entre São Paulo e Curitiba devia ser algo que nunca tenha sido muito comum, durante os sessenta e sete anos em que isso foi possível. E por que penso eu assim?
Bom, primeiro, estou falando como alguém que jamais fez essa viagem (quando acabou, eu tinha vinte e quatro anos de idade). Portanto, estou fazendo uma série de conjeturas que me parecem razoavelmente lógicas.
A separação da província do Paraná da de São Paulo, em 1853, foi uma consequência do isolamento de Curitiba e do porto de Paranaguá em relação ao governo central da província de São Paulo. Os paranaenses insistiam em ter um governo próprio, pois a viagem para Curitiba, quando necessária, era feita por navios a partir de Santos e desembargando em Paranaguá. Também era possível se fazer a cavalo até Ponta Grossa pela trilha dos tropeiros e dali até Curitiba. Era um trecho longo e, não por coincidência, a ferrovia fez praticamente o mesmo trajeto.
O caminho mais curto de São Paulo a Curitiba é o atual, que a BR-116, Regis Bittencourt, segue. E ela existe desde 1960. Antes dela, havia dois outros caminhos. Um, via Sorocaba, Itararé, Ponta Grossa até Curitiba; outro, via Sorocaba, Itapetiniga, Capão Bonito, Apiaí, Ribeira, Cerro Azul e, finalmente, Curitiba. Este caminho somente foi asfaltado há cerca de dez anos e é uma estrada extremamente estreita e cheia de curvas, principalmente no trecho paranaense.
Houve vários estudos, na área ferroviária, que queriam aproveitar o ramal Santos-Juquiá, pronto em 1915, prolongando-o até Curitiba. Isto, no entanto, faria com que o paulistano tivesse de descer até Santos, tomar essa linha que, de alguma forma, deveria subir novamente a Serra do Mar para alcançar Curitiba.
A Regis Bitencourt tem cerca de 400 quilômetros entre São Paulo e a capital paranaense. Já a ferrovia que unia as duas capitais tinha 830 quilômetros e uma longa parada em Ponta Grossa, sendo que havia divisões de comboio que às vezes obrigavam os passageiros a pernoitar em Ponta Grossa. Digo "tinha" por que todo o trecho entre Itapeva e Jaguariaíva foi arrancado há mais de vinte anos (1993). Se houvesse um trem de passageiros hoje entre São Paulo e Curitiba que seguisse a linha atual, ele teria de passar por uma variante construída entre Itapeva e Ponta Grossa nos anos 1970.
Na verdade, a razão oficial para a extinção do trem na linha de 1909 foi a queda de uma ponte em Itararé, em 1976. A partir daí, até se podia ir de trem a Curitiba, mas a volta era imensa, via Ourinhos. Isto, de qualquer forma, foi possível até junho de 1979, quando os trens foram extintos.
Não é à toa que Curitiba cresceu em velocidade muito maior somente após a abertura da Regis Bittencourt, 55 anos atrás. Somente aí a cidade passou a fazer parte de uma estrada realmente - no caso, de asfalto. Na ferrovia, era não era muito mais do que um ramal, mesmo sendo a capital e local de passagem de trens para o principal porto do Estado.
Mas e se a ferrovia, tal como ela era em 1976, tivesse mantido os seus trens de passageiros até hoje? Lembrar que o trecho entre Ponta Grossa e Curitiba foi retificado em 1966 e 1978, portanto, depois do fim dos trens para São Paulo. Lembremo-nos também que a linha problemática entre Itararé e Jaguariaíva (98 quilômetros de linha para 48 quilômetros de rodovia entre as duas) foi reformulada em metade desse trecho em 1964. A outra metade, entre Fábio Rego e Itararé, apesar de ter sido projetada, nunca foi realizada. Essas duas melhorias reduziram a distância, mas, quanto? Cinquenta, sessenta quilômetros? Pouco para os 830 quilômetros, que representam hoje o dobro da distância percorrida por automóveis na rodovia BR-116.
Enfim, se o percurso, com as modificações citadas e apenas ela, tivessem, por algum capricho, sido mantido, seria ele utilizado para viagens entre as duas capitais? Difícil. O mais provável seria que os passageiros fizessem pequenos percursos, como em trens regionais. Quais são as cidades que, hoje, seriam candidatas a terem bastante movimento?
Considerando obviamente que os trens da CPTM seriam independentes de um trem São Paulo-Curitiba, vamos supor que esse trem saísse da estação de Julio Prestes (ou da Barra Funda). Daí, parasse em estações que pudessem apresentar bom movimento. Então, eu sugeriria Osasco, Barueri, São Roque, Mairinque, talvez Alumínio e Sorocaba. Daí em diante: Tatuí, Itapetininga, Itapeva e Itararé. Já no Paraná, Jaguariaíva, Castro, Carambeí e Ponta Grossa. Daí até Curitiba, somente Palmeira, Balsa Nova e Araucária, para dali alcançar Curitiba.
Enfim, os 830 (talvez 760) quilômetros seriam percorridos por passageiros que iriam de uma cidade a outra e também pelos que se dirigiam aos dois extremos da linha. Afinal, fazer 830 quilômetros de uma vez tendo aviões e carros à disposição em, respectivamente, 40 minutos e cinco horas seria coisa para aventureiros. Bom para se fazer uma vez a cada cinco anos.
A conclusão é que trens estas duas capitais não seriam viáveis hoje, a não ser que se construísse uma linha totalmente nova e bem mais curta, capaz de transportar comboios que pudessem correr a pelo menos duzentos quilômetros por hora. Possível é. O difícil é convencer os governos de visão curta que continuamos tendo, apesar dos seguidos tombos que temos sido obrigados a sofrer desde sempre.
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