A ESCOLA OLIVEIRA BELLO
E O "LIVRO D'OURO"
"As festas populares, ruidosamente preludiadas, naquella data imorredoura

Foto ilustrativa: Babá com o menino Eugen Keller.
(Fotografo: Alberto Henschel / commons.wikimedia.org)

Escola Oliveira Bello, em foto de 1927.
(Foto: Coleção Lisymaco Ferreira da Costa)

A ESCOLA OLIVEIRA BELLO

E O "LIVRO D'OURO"

"As festas populares, ruidosamente preludiadas, naquella data imorredoura,

tiveram uma accentuação salientemente destacadas, ante-hontem e hão de repercutir, mais tarde, nos pontos remotos desta província. Todos os corações palpitavam nobremente, generosamente, com um movimento de systole e diastole, impetuoso e forte.

"De manhã, duas bandas de musica quebravam a monotonia das ruas desta capital, com uns accordes sonorosos e rumorejantes.

Diversos estabelecimentos públicos e particulares arvoraram os estandartes nacional e estrangeiros. Os espíritos estavam super excitados. Uma alegria frenética e boa transluzia nos semblantes da população.

"Um pensamento sadio alteava-se soberbo e dominante na consciência de todos.

Festejavão-se conjuntamente, a instrução e a liberdade. Ião-se abrir as portas do templo educacional para a infancia e da vida civil para muitos escravizados.

"A's 4 horas da tarde, ao estrondear das salvas de artilharia, realizou-se a inauguração da escola - Oliveira Bello. O edifício estava litteralmente cheio. A expectativa era numerosissima. A população curytibana correspondeu galhardamente ao appello, que fizemos daqui, offerecendo uma poderoso collaboração espontânea, naquella festa de luz.

"O Sr. Dr. presidente da provincia, ao declarar inaugurada a escola, fez um discurso, em que relembrou os serviços prestados à instrucção publica paranaense, pelos ex-presidentes, Srs. Drs. Carlos Augusto de Carvalho e Oliveira Bello e terminou lendo uma carta ďo illustre Sr. tenente coronel Antonio Ricardo Lustosa de Andrade encarregado da direcção das obras.

"Seguio-se a execução magistral do Himno Escolar, escripto expressamente para essa solemnidade pelo talentoso Sr. Cap. Dr. Jorge dos Santos Almeida e dedicado ao Exm. Sr. Dr. Brazilio Machado.

"Aquella tempestade sonora, através da qual palpitavam as vozes frescas e cristallinas de algumas distinctas amadoras, dirigidas pela

conhecida professora, Exma. Sra. D. Prescilliana Costa; sim, aquella tempestade de harmonias foi enthusiasticamente saudada com os geraes applausos. Depois, a Exma. Sra. D. Elvira Costa recitou brilhantemente a inspirada poesia de Castro Alves - O Livro e a América.

"Em seguida, o sr. capitão Augusto Stelfeld, vice-presidente da camara municipal fez entrega do 'Livro d'Ouro' ao Senhor Doutor presidente da província. O digno representante da edilidade, pronunciou por essa occasião, um substancioso discurso, analogo ao ato.

S. Ex., ao receber o 'Livro D'Ouro', proferio umas palavras eloquentes que terminaram pela leitura de 68 cartas de liberdade.

"Publicamos, neste lugar, o nome dos generosos cavalheiros, que as concederam; assim como, o dos escravos libertos.

"Eil-os:

1. Francisco de Paula Ribeiro Vianna. - escrava Martinha.

2. D. Brigida Maria de Freitas. - escravo Celestino.

3. Theophilo Moreira Garcez. - escrava Amelia.

4. Nicolao Pinto Rebello e sua senhora. - escravos Josepha, Amaro e Joaquim.

5. Antonio Augusto Ferreira de Moura. - escrava Joanna.

6. Sua senhora dona Pursina Borges de Moura. - escrava Maria.

7. Deputado Jorge Marcondes de Albuquerque. - escrava Sabina.

8. Deputado Dr. Tristão Cardoso de Menezes. - escravo Miguel.

9. Deputado Dr. Emygdio Westphalen. - escravos Sebastião e Helena.

10. João Carvalho de Oliveira. - escrava Florencia.

11. Antonio Gomes Vidal (1). - escrava Amalia.

12. Deputado Domingos Antonio da Cunha. - escravos Leandro e Pacifico.

13. Wenceslao Geronymo C. Alcantara. - escravo Vicente.

14.Commendador Antonio Martins Franco e sua senhora. - escravos Caetano, Antonio e Joaquim.

15. D. Ambrosina Rosa Guimarães esposa do 16. Dr. Francisco Alves Guimarães. - escrava Maria.

17. Eugenio Westphalen. - escravos José, Severino, Sebastião e Benedicto.

18. Um anonymo. - escravas Lameria e Joaquina.

19. Conselheiro Manoel Alves de Araujo. - escravos Simão, João e Joaquim.

20. Commendador Dr. Gêneroso Marques dos Santos. - sua ultima escrava Joanna.

21. Manoel Affonso Ennes. - Escravos Francisca, Maria, André, Quintiliana, Mathias, Umbellina e Marcellino.

22. João Ferreira Gomes (2). - escrava Marianna.

23. Alfredo Caetano Munhós (3). - escrava Florinda.

24. José Pinto Rebello. Escravo Mamede.

25. João Tobias Pinto Rebello. - escrava Maria.

26. José Lourenço Meira de Vasconcellos. - Josephina.

27. André Petrelli. Escravo Joaquim.

28. Um anonymo. - Escrava Maria do Rosário.

29. D. Zepherina Candida Enéas esposa do tenente coronel Benedicto Enéas de Paula. - sua melhor escrava Vicencia.

30. Deputado Commendador João Manoel Ribeiro Vianna. - escravas Justina e Prudencia.

31. Commendador Antonio Alves de Araújo. - escravos Gertrudes, Nuno, Manoel, Ermelino, Bento, José Passos, Miquelina, Maria, Henriqueta, Sabino, Leonardo, Luiz, Salvador, João, Francisco, Octaviano, Primitiva, Mario e Gelim.

(1) com indemnisação. (2) Idem. (3) Idem.

*O publico não regateou palmas e bravos convictos ao honrado cavalheiro, a quem enviamos os nossos sinceros comprimentos e o qual fechou, com chave de ouro, esta lista illuminada. [...]."

*Ao que parece, o autor estava referindo-se ao Comendador Araújo que havia libertado 19 escravos.

Analisando-se as 68 cartas de liberdade, nota-se a existência de um expressivo número de escravas libertas por seu dono, ao todo 29. Ao que tudo indica, eram escravas que, até ali, tinham servido a casa de seus senhores, como arrumadeiras, amas, engomadeiras, cozinheiras e/ou lavadeiras.

Dos 31 libertadores de escravos naquela ocasião, hoje encontramos seus nomes homenageados em importantes ruas de Curitiba, por relevantes serviços prestados à cidade.

Por todo o Brasil, de 1868 a 1888, há registros de grupos mobilizados pela causa abolicionista. No Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Ceará, Pernambuco e Espírito Santo, por exemplo, as cartas de alforrias também eram entregues em apresentações culturais com direito a registro na imprensa, como foi o caso dessas 68 cartas de liberdade concedidas coletivamente naquele evento, acompanhado por grande parte da população que lá compareceu.

A maioria da população escrava em Curitiba, em 1875, era jovem e produtiva, com idade em torno dos 28 anos. Havia grande número de escravos registrados nas matrículas como

lavradores, porém é possível que realizassem, também, atividades agropastoris e as inerentes aos engenhos de erva mate.

Na década de 1870, 29.7% dos domicílios curitibanos tinham escravos. na década de 1880, o percentual decresceu para 15.5%. Ou seja, em 10 dez anos, Curitiba reduziu 50% a quantia de escravos, resultando naqueles dias da inauguração da escola a existência de 1,5 escravo para cada 10 domicílios.

Conhecendo-se, agora, os nomes desses escravos 'libertos', e, passados já 140 anos, pergunta-se: quem foram? o quê aconteceu com eles? quais sobrenomes adotaram? como bons trabalhadores, seguiram a vida empregados? empreenderam negócios? quantos não tiveram coragem de deixar seus ex-donos? deixaram descendentes? quem são esses descendentes, onde estão e qual progresso tiveram em suas vidas?

terça-feira, 14 de maio de 2024

A ESCOLA OLIVEIRA BELLO E O "LIVRO D'OURO" "As festas populares, ruidosamente preludiadas, naquella data imorredoura

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A ESCOLA OLIVEIRA BELLO
E O "LIVRO D'OURO"
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