sábado, 28 de janeiro de 2023

Origem e história do Cemitério Municipal São Francisco de Paula

 Origem e história do Cemitério Municipal São Francisco de Paula

https://www.turistoria.com.br/origem-e-historia-do-cemiterio-municipal-sao-francisco-de-paula

O Cemitério São Francisco de Paula, também conhecido como Cemitério Municipal, foi fundado em Curitiba em 7 de dezembro de 1854. Na época, foi o presidente da Província do Paraná, Zacarias de Góes e Vasconcellos, quem determinou a criação desta necrópole, considerada a primeira de Curitiba. 


Sabemos, porém, que Curitiba já tinha 161 anos em 1854. Diante disso, você pode se perguntar: onde enterravam os corpos antes disso, já que cemitério não havia? 


Segundo a pesquisadora cemiterial da Fundação Cultural de Curitiba, Clarissa Grassi, naquela época as pessoas eram sepultadas dentro das igrejas: na Igreja Matriz, na Igreja do Rosário, na Igreja da Ordem e nas ruínas da Igreja São Francisco de Paula. Isso porque, até então, acreditava-se que a realização de enterros nesses locais era uma das condições para o salvamento da alma do falecido. 


Os religiosos acreditavam que o último lugar de repouso deveria ser perto dos santos. Por isso, eram enterrados nas igrejas. Não há nada mais sagrado que um templo
, salienta o historiador Régis Lopes, da Universidade Federal do Ceará.


E quando faltava espaço dentro das Igrejas (ou, quando o falecido não era da elite)?

Quando não cabia dentro da igreja, eram dispostos do lado de fora ou ao lado. Em todos esses templos construídos até a segunda metade do século XIX vamos encontrar essa prática, reforça Lopes. 


Entretanto sabe-se, também, que a população mais pobre não era enterrada dentro dos templos religiosos, com raras exceções. Quanto maiores os rendimentos, mais perto se estava de Deus (sic). 


Por que, então, foi criado o Cemitério Municipal? 


Por motivos sanitários. Desde meados do século XIX, foi difundida na Europa uma política higienista, que associava o ar poluído pela decomposição dos corpos à disseminação de doenças. Por conta disso, criou-se um espaço exclusivo para sepultamentos, o cemitério, que ficava distante da Igreja e das demais habitações das cidades. 


No Brasil, essa política higienista começou a ser posta em prática na década de 1850. Assim, quando Zacarias assumiu o posto de presidente da província, uma de suas primeiras atitudes foi fundar o Cemitério Municipal, com o intuito de mostrar à população curitibana que ele seguia as recomendações das autoridades médicas. 


Vale ressaltar, porém, que a ideia da construção de um local para o sepultamento dos mortos já vinha sido debatido alguns anos antes da inauguração do cemitério. Em 12 de setembro de 1829, na Câmara Municipal de Curitiba, o vereador Miguel Marques dos Santos chamava atenção para a necessidade de um cemitério na cidade.


A preocupação era decorrente de uma epidemia de varíola. Afirmou ele, em uma sessão parlamentar, que era preciso construir um “
semiterio afim de senão enterrarem corpos nos templos da mesma para se evitarem os males que disto resultão e que se convidasse ao Reverendo vigário para na seguinte sessão vir tratar deste objecto”.

Cemitério Sítio do Mato, o primeiro


O Cemitério de São Francisco, embora seja o mais conhecido e o mais antigo em uso, não foi o primeiro a surgir em Curitiba. Há um outro cemitério, do início do século XIX, que é esquecido pela população e pouco falado nos livros da história da cidade. É o Cemitério Sítio do Mato, também conhecido como Cemitério dos Bexiguentos, alcunha que nos ajuda a entender o possível motivo do seu silenciamento histórico.


Em 1818, frente a uma epidemia de varíola, o capitão-mor —  equivalente ao atual cargo de prefeito —  proibiu os sepultamentos de vítimas de “bexiga” na Igreja Matriz. Esse contexto de crise de saúde pública fez com que, nesse período, os corpos fossem enterrados em um local longe do centro da cidade. O lugar escolhido foi um terreno meia légua a oeste do centro da cidade, nas imediações de onde hoje fica o bairro Cristo Rei. Segundo Clarissa Grassi, não é possível saber o motivo da escolha desse lugar em específico, para além do fato de sua distância das áreas nobres da cidade.


Nem todos os sepultados no local foram registrados como pessoas vítimas de varíola, o que leva a crer que seu uso não tenha sido restrito a pessoas que morreram de doenças infecciosas. A data do último assentamento onde consta o Cemitério Sítio do Mato é de 1866. São raros os registros acerca do cemitério, fazendo-se notar um voluntário ou involuntário apagamento desse que teria sido o primeiro cemitério de Curitiba.


O enterro dentro das igrejas era nocivo à saúde?


Depende. Segundo especialistas, não há comprovações científicas que mostrem a associação entre deterioração de corpos, poluição do ar e disseminação de doenças. O que de fato há é a poluição do solo, porém este aspecto não era conhecido pelas pessoas daquela época. 


O Cemitério São Francisco de Paula


Zacarias de Góes e Vasconcellos já havia atuado em projetos de cemitérios municipais no Rio de Janeiro, e sua experiência fez com que ele visse a necessidade de tal medida em Curitiba, enquanto Presidente da Província. O Paraná estava recém emancipado (1853), e havia também uma cobrança por medidas de modernização do Estado.


Assim, em 1854 ele nomeou Benedito Enéas de Paula para dar início à construção do cemitério. O terreno para a construção da igreja era uma chácara e foi doada por seu proprietário, o padre Agostinho Machado de Lima, que foi vigário da Igreja Matriz por 56 anos.


A inauguração aconteceu em 1854, mas as obras estavam inacabadas. Isso não impediu que o cemitério começasse a ser utilizado já no ano seguinte, em 1855. Neste ano, foram registrados 11 sepultamentos, sendo o primeiro deles o de Delphina Antonia de San Paio, viúva falecida aos 86 anos. Foi só mais de uma década depois, em 1866, que o cemitério foi concluído, com a construção dos muros.

Seguindo a lógica de estar perto dos santos, os túmulos dos cemitérios mais antigos tinham arquitetura parecida com pequenas capelas, onde se dispunham materiais religiosos, como imagens sagradas. Quanto mais rica a família, maiores e mais bem ornamentados eram os túmulos. 

De início, os entes queridos ganhavam túmulo individual e horizontal; não havia ainda tanta preocupação com o tamanho e a ornamentação dos túmulos. Com o passar dos anos, difundiu-se a cultura da arte tumular: os túmulos ganharam dimensões de capela, os mausoléus, e dependendo do estilo arquitetônico em moda e dos rendimentos da família do finado, caprichava-se nos detalhes. Já que não se podia enterrar onde havia imagens de santos, traziam-se as características da igreja para o túmulo.

É aí que o cemitério se transforma numa micro-cidade, refletindo a desigualdade social de Curitiba. Assim como o mundo dos vivos, o dos mortos foi dividido em bairros, dos mais nobres aos periféricos; além disso, os maiores e mais destacados túmulos são dos personagens da elite econômica e política da cidade. 


No decorrer do século XX, os túmulos foram verticalizados e perderam muito da ornamentação. A função do túmulo se sobrepôs à forma. Muitos foram abandonados ou ficaram esquecidos, comprometendo, assim, um dos mais ricos patrimônios culturais da cidade, o Cemitério Municipal.


Quem trouxe ao debate a necessidade de se revalorizar o Cemitério Municipal foi a pesquisadora Clarissa Grassi, que se dedica a estudá-lo há mais de 20 anos. Além de artigos e livros publicados sobre o assunto, ela realiza, pela Fundação Cultural de Curitiba, visitas guiadas dentro do cemitério, por meio das quais ela conta a história de diversas personalidades de Curitiba que ali estão enterradas. Atualmente, estão sendo realizadas visitas noturnas. Para se inscrever, basta acompanhar as mídias sociais da Fundação Cultural de Curitiba.

Hoje, com mais de um século e meio de história, o cemitério conta mais de 92 mil mortos enterrados no Alto do São Francisco, em mais de 5,7 mil túmulos. 

Texto e pesquisa de Gabriel Brum Perin e Gustavo Pitz


Fontes de pesquisa:


https://www20.opovo.com.br/app/opovo/cotidiano/2014/11/01/noticiasjornalcotidiano,3341197/enterros-em-igrejas-foram-pratica-comum-ate-o-seculo-xix.shtml


https://www.gazetadopovo.com.br/viver-bem/comportamento/cemiterio-sao-francisco-municipal-conta-historia-de-curitiba/


Clarissa Grassi. Guia de Visitação ao Cemitério Municipal São Francisco de Paula: arte e memória no espaço urbano, 2014.


https://www.plural.jor.br/colunas/fragmentos-da-historia/um-cemiterio-para-chamar-de-seu/


https://www.gazetadopovo.com.br/curitiba/falecimentos/o-cemiterio-perdido-cnkc1l5h7eqlpjpe5zo1vownb/


http://www.circulandoporcuritiba.com.br/2018/10/pieta-do-cemiterio-municipal.html


http://www.circulandoporcuritiba.com.br/2016/02/arte-cemiterial.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário