O Comércio Sofisticado de Curitiba: Um Retrato Publicitário da Elite Paranaense nos Anos 1920-1940
O Comércio Sofisticado de Curitiba: Um Retrato Publicitário da Elite Paranaense nos Anos 1920-1940
Por um cronista atento ao passado que moldou o consumo e a identidade da cidade
Curitiba, no início do século XX, era uma cidade em plena transformação. Ainda pequena e provinciana, mas já com um espírito cosmopolita, a capital paranaense vivia um período de crescimento econômico e cultural intenso. Os jornais da época — como o Diário do Paraná, O Estado do Paraná ou A Gazeta — eram mais do que veículos de notícias; eram verdadeiros catálogos da vida moderna, onde se anunciavam produtos importados, serviços sofisticados e marcas que prometiam status, beleza e progresso. As páginas aqui apresentadas — repletas de anúncios de cosméticos, automóveis, joias, máquinas fotográficas e medicamentos — são janelas para um mundo onde o consumo era sinônimo de elegância, modernidade e pertencimento à elite local.
A Beleza como Status: “Juventude Alexandre” e a Vaidade Feminina
Um dos anúncios mais emblemáticos é o da “Juventude Alexandre”, um produto para cabelos que promete “dar vigor, beleza e rejuvenescer os cabelos”. O texto é eloquente: “A Juventude faz com que os cabelos brancos fiquem pretos, não queima, não mancha a pele.” Essa promessa de juventude eterna e beleza perfeita reflete os ideais estéticos da época, especialmente entre as mulheres da classe média e alta.
O anúncio destaca que o produto foi “premiado com Medalha de Ouro na Exposição de 1908” e é vendido em “S. Paulo, BARUEL & C.” — indicando que era um produto de origem paulista, mas com grande aceitação em Curitiba. A menção à premiação e à exposição internacional sugere que a marca buscava legitimar sua qualidade por meio de reconhecimento oficial, uma estratégia de marketing comum na época.
Esse anúncio também revela algo mais profundo: a vaidade feminina era vista como um valor social. Ter cabelos bonitos, jovens e saudáveis era um sinal de cuidado consigo mesma, de pertencimento a um círculo social refinado. A “Juventude Alexandre” não era apenas um cosmético; era um símbolo de status e modernidade.
O Luxo do Cotidiano: “Casa Porcellana de Schmidlin & Tamm” e a Arte de Viver Bem
Outro anúncio que chama atenção é o da “Casa Porcellana de Schmidlin & Tamm”, localizada em Curitiba. O texto anuncia um “grande e variado sortimento de louças, vidros, ferragens, tintas, etc.”, além de “depósito permanente de máquinas de costura, ditas de picar palha, debulhadores, arados, arame farpado para cerca e outros”.
A presença de itens tão diversos — desde louças finas até arados agrícolas — revela a natureza multifacetada do comércio da época. A Casa Porcellana não era apenas uma loja de utensílios domésticos; era um centro comercial que atendia tanto às necessidades das famílias urbanas quanto às demandas do campo. Isso reflete a dualidade da economia paranaense da época: uma cidade em ascensão, mas ainda fortemente ligada à agricultura e à pecuária.
Além disso, o anúncio menciona que a loja é “única agente e vendedora neste Estado das aclamadas máquinas de escrever marca ‘URANIA’”. A máquina de escrever, um símbolo de modernidade e eficiência, era um item de desejo para escritórios, escolas e famílias abastadas. A inclusão desse produto no catálogo da Casa Porcellana indica que a loja buscava atrair um público diversificado, desde donas de casa até empresários e profissionais liberais.
A Modernidade em Movimento: O Automóvel Adler e o Sonho de Liberdade
O anúncio do automóvel “ADLER”, fabricado pela “Adlerwerke vorm. Heinrich Kleyer A.-G.”, em Frankfurt a. M., é talvez o mais icônico de todos. A ilustração mostra um homem elegante, vestindo um casaco longo e um chapéu, ao volante de um carro de luxo, com capota aberta e rodas brancas — um modelo típico dos anos 1920.
O texto informa que os únicos agentes no Paraná são “J. RACKI & CIA.”, localizados na “Rua Marechal Floriano Peixoto N. 70”, em Curitiba. A menção à origem alemã do veículo (“Frankfurt a. M.”) e ao nome da empresa (“Adlerwerke”) reforça a associação entre o automóvel e a tecnologia avançada, a qualidade e o prestígio.
Na época, possuir um automóvel era um símbolo de riqueza e poder. O Adler, com seu design elegante e robusto, era um carro para quem queria demonstrar status e modernidade. O anúncio, portanto, não está apenas vendendo um veículo; está vendendo um estilo de vida — de liberdade, velocidade e progresso.
A Arte de Registrar a Memória: “Casa Stolze” e a Fotografia como Arte
O anúncio da “Casa Stolze”, fundada em 1874, é um testemunho da importância da fotografia na vida social da época. A loja, localizada na “Rua 15 de Novembro 29-A”, em São Paulo, mas com representação em Curitiba, oferecia “artigos photographicos”, incluindo “máquinas, accesorios, productos chimicos” e “stock de chapas e papel de diversos fabricantes”.
O texto destaca que a Casa Stolze atendia “pedidos de qualquer ponto do Brasil, com a máxima promptidão e exactidão”, e que o “stock de chapas e papel” estava “reformado semanalmente”. Isso indica que a loja era uma referência nacional, com um serviço de entrega rápido e confiável — algo raro na época.
A fotografia, naquela época, era uma arte e um luxo. Tirar fotos era um ato especial, reservado para momentos importantes: casamentos, batizados, formaturas. A Casa Stolze, ao oferecer “máquinas dos mais afamados fabricantes”, permitia que as famílias da elite registrassem suas memórias e as preservassem para sempre. O anúncio, portanto, não está apenas vendendo equipamentos; está vendendo a possibilidade de imortalizar a própria história.
O Conforto da Saúde: “Collyrio Moura Brazil” e a Medicina como Solução
O anúncio do “Collyrio Moura Brazil” é um exemplo de como a publicidade médica era usada para resolver problemas cotidianos. O produto, “aprovado pela Directoria Geral de Saúde Pública”, promete “contra as purgações dos olhos e outros males”, e é vendido pela “Pharmacia Moura Brazil”, localizada no Rio de Janeiro.
O texto é direto e funcional: “Conjunctivites, catarrhos, sub-agudas, conjuntivites agudas, moscas, pustulas, etc.” — uma lista de problemas oculares que, na época, eram comuns e muitas vezes tratados com remédios caseiros ou de farmácia. O colírio, ao ser “aprovado pela Diretoria Geral de Saúde Pública”, ganhava credibilidade e segurança, o que era essencial para convencer o consumidor.
Esse anúncio também revela algo importante: a saúde era vista como um bem precioso, e os produtos que prometiam cura ou alívio eram altamente valorizados. O Collyrio Moura Brazil, ao ser vendido em farmácias e boticas, integrava-se ao universo da medicina moderna, oferecendo soluções práticas e acessíveis para os problemas do dia a dia.
O Som da Modernidade: O Piano e a Cultura Doméstica
O anúncio do “PIANO” — que “vende-se um bom sólido e novo” — é um testemunho da importância da música na vida doméstica da época. O piano, além de um instrumento musical, era um símbolo de cultura, educação e refinamento. Ter um piano em casa era um sinal de que a família valorizava a arte, a música e a educação.
O anúncio informa que o piano pode ser encontrado na “rua Marechal Deodoro, 36”, em Curitiba — uma rua central e movimentada, o que indica que o vendedor queria alcançar um público urbano e abastado. A menção a “bom sólido e novo” sugere que o instrumento era de qualidade e durabilidade, características valorizadas pelos compradores da época.
A música, naquela época, era uma forma de entretenimento e de educação. As crianças aprendiam a tocar piano como parte de sua formação cultural, e as mulheres, em particular, eram encorajadas a cultivar esse talento como forma de demonstrar sua sensibilidade e refinamento. O piano, portanto, não era apenas um instrumento; era um símbolo de status e de cultura.
Conclusão: O Consumo como Espelho da Sociedade
Os anúncios aqui analisados — da “Juventude Alexandre” ao “Automóvel Adler”, da “Casa Porcellana” ao “Collyrio Moura Brazil” — são mais do que simples propagandas. Eles são espelhos da sociedade paranaense dos anos 1920 a 1940, refletindo seus valores, desejos e aspirações. A beleza, a saúde, a cultura, a modernidade e o conforto eram temas centrais na vida das pessoas, e os produtos que prometiam esses benefícios eram altamente valorizados.
Esses anúncios também revelam a presença de marcas internacionais — alemãs, francesas, americanas — e a integração do Paraná ao mercado global. A cidade, embora ainda pequena, já era um centro de consumo e de inovação, onde os habitantes buscavam os melhores produtos do mundo para melhorar sua qualidade de vida.
Ao estudar esses registros, não apenas compreendemos como era o cotidiano da época, mas também percebemos as raízes dos valores e hábitos que ainda hoje permeiam a cultura paranaense. O consumo, naquela época, era uma forma de expressão social — e, como hoje, continua sendo um reflexo de quem somos e do que desejamos ser.
#Curitiba #HistoriaDoParana #Anos20 #Anos30 #Anos40 #PublicidadeHistorica #ComercioCuritibano #EliteParanaense #ConsumoHistorico #ModaDosAnos20 #AutomovelAdler #CasaStolze #JuventudeAlexandre #CollyrioMouraBrazil #CasaPorcellana #PianoHistorico #FotografiaAntiga #MedicinaHistorica #VidaSocial #CuritibaAntiga #HistoriaDaPublicidade #ArquivoPublico #DocumentosHistoricos #BrasilDosAnos20 #BrasilDosAnos30 #BrasilDosAnos40 #EleganciaClasseAlta #FotografiaDeEpoca #TradiçãoElegancia #PatrimonioHistorico #JornalismoHistorico #CulturaParanaense #SociedadeCuritibana #MundoSocial #CulturaLocal #HistoriaDasMulheres #HistoriaDasFamilias #HistoriaDoConsumo #CuritibaHistorica