Histórias de Curitiba - Fora de sintonia
Fora de sintonia
José Borba Filho
Esta é uma história do tempo do cinema mudo.
Os filmes, como todo mundo sabe, eram em preto e branco, com legendas em português. O Cine Palácio, que era o mais popular de Curitiba, na falta de voz e som nos filmes da Teda Bara, Rodolfo Valentino, Charlie Chaplin, Greta Garbo, Mary Pickford e outros, contratava pianistas para acompanhar as principais cenas dos filmes e para delícia da platéia antes do início do espetáculo.
Era costume, então, as pessoas ficarem de pé, de costas para o palco da tela, paquerando quem entrava. A função só começava quando o pianista chegava, recebido com uma salva de palmas.
Leonira Borba, minha cunhada, pianista formada com o professor Antônio Mellilo numa turma que teve também, entre outros alunos, Alceu Bochino, atual regente da Orquestra Sinfônica do Paraná, foi por algum tempo a pianista do Cine Palácio, a convite de seu dono.
Como todo pianista de cinema, ela selecionava o programa musical de acordo com os enredos dos filmes exibidos.
Se era filme romântico, executava a valsa Danúbio Azul ou Branca.
Se era comédia, tocava sambas variados.
Faroeste, mandava marcha rápida e rasteira.
E foi num acompanhamento musical que aconteceu o inusitado. O filme era "A Vida e Morte de Jesus Cristo", em preto e branco com legendas, filme que provocava grande comoção na platéia religiosa da época.
A pianista Leonira começou bem.
Acompanhava o filme com música clássica, de andamento leve, tons pungentos.
De repente, justo num dos momentos mais compenetrados, que mostrava Jesus sendo chicoteado a caminho do Calvário, a pianista tascou o choro sapeca "Tico Tico no Fubá", de Zequinha de Abreu.
Jesus sendo surrado e a pianista vá no
Um tico-tico cá Um tico-tico lá Um tico-tico só.
E nada da pianista parar com tico tico.
Quando se deu pelo engano do acompanhamento, Jesus já 1a morrendo na cruz.
Passou então a executar o dolorido "Barqueiros do Volga". Nada, porém desfez o mal-estar criado na platéia.
Mais tarde, a explicação da pianista: enquanto aguardava o início da sessão, algum gaiato havia trocado a partitura de cima do piano.
José Borba Filho é funcionário público federal aposentado.
José Borba Filho
Esta é uma história do tempo do cinema mudo.
Os filmes, como todo mundo sabe, eram em preto e branco, com legendas em português. O Cine Palácio, que era o mais popular de Curitiba, na falta de voz e som nos filmes da Teda Bara, Rodolfo Valentino, Charlie Chaplin, Greta Garbo, Mary Pickford e outros, contratava pianistas para acompanhar as principais cenas dos filmes e para delícia da platéia antes do início do espetáculo.
Era costume, então, as pessoas ficarem de pé, de costas para o palco da tela, paquerando quem entrava. A função só começava quando o pianista chegava, recebido com uma salva de palmas.
Leonira Borba, minha cunhada, pianista formada com o professor Antônio Mellilo numa turma que teve também, entre outros alunos, Alceu Bochino, atual regente da Orquestra Sinfônica do Paraná, foi por algum tempo a pianista do Cine Palácio, a convite de seu dono.
Como todo pianista de cinema, ela selecionava o programa musical de acordo com os enredos dos filmes exibidos.
Se era filme romântico, executava a valsa Danúbio Azul ou Branca.
Se era comédia, tocava sambas variados.
Faroeste, mandava marcha rápida e rasteira.
E foi num acompanhamento musical que aconteceu o inusitado. O filme era "A Vida e Morte de Jesus Cristo", em preto e branco com legendas, filme que provocava grande comoção na platéia religiosa da época.
A pianista Leonira começou bem.
Acompanhava o filme com música clássica, de andamento leve, tons pungentos.
De repente, justo num dos momentos mais compenetrados, que mostrava Jesus sendo chicoteado a caminho do Calvário, a pianista tascou o choro sapeca "Tico Tico no Fubá", de Zequinha de Abreu.
Jesus sendo surrado e a pianista vá no
Um tico-tico cá Um tico-tico lá Um tico-tico só.
E nada da pianista parar com tico tico.
Quando se deu pelo engano do acompanhamento, Jesus já 1a morrendo na cruz.
Passou então a executar o dolorido "Barqueiros do Volga". Nada, porém desfez o mal-estar criado na platéia.
Mais tarde, a explicação da pianista: enquanto aguardava o início da sessão, algum gaiato havia trocado a partitura de cima do piano.
José Borba Filho é funcionário público federal aposentado.
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