Palminor Rodrigues Junior -
Lápis
Todo sambista que se preze sabe tirar um som irresistível de uma caixinha de fósforo. O curitibano Lápis (1942-1978)
Lápis
Todo sambista que se preze sabe tirar um som irresistível de uma caixinha de fósforo. O curitibano Lápis (1942-1978) era um desses. Mas ele foi além: em busca de uma sonoridade diferente, usava uma sobrecapa metálica, feita sob medida para encampar o pequeno instrumento. Essa preciosidade histórica ainda existe, e até fevereiro de 2018 ficará exposta no Museu de Imagem e do Som do Paraná (MIS), na mostra “Todas as pontas do Lápis”, em homenagem ao compositor.
Palminor Rodrigues Ferreira nasceu no bairro Mercês, em uma família musical e numerosa – era o caçula de 20 irmãos. O pai, Abelardo Rodrigues Ferreira, cantava e dedilhava em casa, inspirando vários filhos, apesar de a esposa, Maria Luiza Chichorro, de uma família tradicional paranaense, não apreciar as cantorias, conforme conta o jornalista Aramis Millarch no boletim cultural da Casa Romário Martins de maio de 1982. O texto conta que Palmi, como era chamado em casa – ele ganhou o apelido de Lápis já adulto, ao trabalhar nos Correios, onde os colegas o acharam muito alto e fino – se apresentou pela primeira vez aos 11 anos, no programa “Ciranda Infantil”, da Rádio Marumbi.
Já era uma conquista atingir essa idade, considerando que ele tinha um problema congênito no coração, pelo qual os médicos lhe deram poucos anos de vida. De fato, foi essa a causa da morte precoce, aos 36 anos. Mesmo com uma carreira tão curta, produziu grandes composições: ainda jovem, escreveu “Vestido Branco”, que se tornou sucesso em uma gravação do grupo Bitten IV, do qual ele participou. Em passagem pelo Rio de Janeiro, participou de festivais e repassou músicas para intérpretes renomados, como Eliana Pittman, que gravou “Silêncio”.
Algumas das letras originais estão expostas na mostra, escritas em caligrafia caprichosa – mesmo numa mesa de bar, um dos lugares mais frequentados pelo boêmio Lápis. Tinha uma parceria constante com Paulo Vítola, e também com outros compositores. Faltou assinar uma letra com o músico Célio Malgueiro, amigo de noitadas, compadre e curador da exposição no MIS. “Ele ia lá em casa, tocávamos violão até as 2 da manhã, e a única tristeza que eu tenho é que a gente, que era compadre, não tem nenhuma música que assinamos juntos”, conta ele.
Sozinho ou acompanhado, o legado que Lápis deixou é muito valioso, avalia Beto Cavalheiro, diretor do MIS. Foi ele que teve a ideia de preparar uma exposição sobre o artista. “Lápis é o maior compositor paranaense. Mesmo. Quando entrei no museu, em fevereiro de 2016, um dos meus primeiros objetivos era prestar uma homenagem a ele. Na pesquisa, quando verificamos que em fevereiro de 2018 completará 40 anos de sua morte, planejamos para que a mostra coincidisse com a data”, revela. Após iniciar a coleta de material, o MIS chegou ao nome de Malgueiro, que se lembra bem dos objetos pessoais do antigo amigo. “Estão aqui o violão de 12 cordas dele, o isqueiro que usava, a caixinha de fósforo, fotos de bandas que tocaram suas músicas, algumas roupas. Não conseguimos reunir exatamente todas as pontas do Lápis, como diz o nome da exposição, mas temos 95% de tudo o que ele nos deixou”, conta o amigo.
Lápis foi uma das primeiras personalidades a gravar um depoimento para o MIS, inaugurado em 1969. Em 1975, depois da passagem pelo Rio, estreou em Curitiba o musical “Funeral para um rei negro”. Lotou o Teatro do Paiol e, temendo por ver muitos espaços vazios no Teatro Guaíra, convocou a grande família para comparecer. “Mas saíram em cima da hora, e nem conseguiu entrar, pois o Guaíra estava completamente cheio para vê-lo”, conta Cavalheiro.
Apesar de ter conseguido um reconhecimento na época que atuava, o músico não é conhecido do grande público. Para o diretor do MIS, o fato de ele ter morrido precocemente, há 40 anos, atrapalhou o caminho da notoriedade. O jornalista Aramis Millarch lamentou a falta de uma gravação com qualidade técnica. “Lápis gravou em estúdio apenas seis de suas músicas, aquelas que compuseram os três compactos com o Bitten IV, e se não fosse a providencial ideia de uma das muitas mulheres que amou, de num simples minicassete registrar suas canções, a maior parte da produção do autor paranaense teria se perdido para sempre”, a não ser por um musical gravado nos teatros do Paiol e Guaíra, anotou no boletim da Casa Romário Martins.
A exposição destaca que muitos amigos consideram que a morte precoce de Lápis, aos 36 anos, foi apressada pela tristeza de ter perdido um grande amor, Márcia Regina, em um acidente de automóvel, em janeiro de 1976. Antes e depois ele teve outras mulheres: foi casado apenas com Romina Ulrich, com quem teve dois filhos: Palminor Júnior e Alexandre Ferreira, o Grafite, que vive na Bélgica há muitos anos com uma carreira musical de sucesso. Nos últimos dias de vida, o compositor conviveu com Ana Demczuk, que ouviu as últimas melodias criadas por ele.
(Fonte: Clube Gazeta do Povo)
Por: Rosana Felix
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