Como Foram Construídas Hipótese Clássica
Não foram encontrados registros pictóricos ou textuais que expliquem como as pirâmides foram planejadas e construídas. O estudo detalhado dos monumentos e o conhecimento crescente dos meios disponíveis na época tornaram possível determinar muitos detalhes construtivos. Várias questões, entretanto, continuam sem solução e, nesses casos, as respostas sugeridas baseiam-se apenas na crença de que através dos meios propostos poderiam ser atingidos os resultados que são observados hoje em dia. Além da visão clássica do problema, várias tentativas de explicações alternativas têm surgido ao longo dos tempos. É claro que na falta de registros que expliquem como as pirâmides foram construídas, tudo o que se diga a respeito não passa de especulação, ainda que baseada em indícios. Na visão de Heródoto, turmas de 100 mil trabalhadores, revezando-se em turnos que duravam três meses, levaram 20 anos para construir a Grande Pirâmide. Atualmente os egiptólogos acreditam que aquele monumento foi edificado por um número menor de trabalhadores e em menos tempo. A idéia de que as pirâmides foram construídas por escravos para um faraó tirânico está hoje descartada. É improvável que os egípcios tivessem escravos naquela época, pois sua sociedade era basicamente composta por camponeses. Impossibilitados de trabalhar nos campos durante três meses do ano por causa da inundação, esses homens estavam condenados à ociosidade nesse período. Assim, eles podiam trabalhar na construção das pirâmides sem que houvesse prejuízo para a prosperidade do país. O empenho que demonstravam nessa tarefa pode ser explicado pelo fato de que acreditavam que o faraó era um deus e ajudar a construir o seu túmulo era, antes de tudo, uma honra. Com esse trabalho asseguravam que o faraó abençoaria o povo do Egito com saúde e prosperidade, até mesmo depois que ele tivesse morrido. De um ponto de vista mais prático, é claro, também, que os salários extras ganhos na construção das gigantescas pirâmides complementavam a renda familiar. Arthur Weigall, um dos estudiosos que representa a corrente clássica da egiptologia, esclarece que para construírem a pirâmide de Kéops os egípcios delimitaram, sobre o planalto de Gizé, um quadrado com lados de 230 metros que formava uma superfície total de aproximadamente 54 mil metros quadrados. Sobre tal base foi edificado o monumento cuja altura atingiu 146 metros, sendo que os dois milhões de blocos calcários usados na construção representam um volume de dois milhões e 500 mil metros cúbicos. Nas camadas inferiores, a maior parte dos blocos pesam duas toneladas ou mais. Eles eram transportados pela água desde as pedreiras situadas na outra margem do rio até o pé do planalto e isso ocorria na época da inundação, quando todo o vale se transformava em um lago. A seguir era preciso içá-los sobre o planalto e colocá-los em seus lugares na pirâmide. Ainda segundo a arqueologia clássica, os agricultores teriam sido organizados em grupos de 25 pessoas, conduzidas por um soldado que agia como capataz e os pagava com comida e vestuário. Um subproduto da colheita do trigo era a palha. Misturada com lama do Nilo e areia, ela entrava na composição de tijolos cozidos, usados em mastabas, em rampas para a construção das grandes piramides de pedra calcária, ou como núcleo de pirâmides apenas revestidas com pedra calcária. Granito, extraído a cerca de 800 quilâmetros de Gizé, em Assuão, ao norte da primeira catarata, só pode ter sido transportado através de barcaças rio acima. A dura pedra calcária branca usada para dar acabamento ao exterior das grandes pirâmides foi extraída no lado oriental do Nilo, em Tura, e teve que ser transportada em balsa para Gizé, no lado oposto do rio. Estas matérias-primas disponíveis determinaram as ferramentas e a tecnologia usadas para construir as pirâmides. Pedra calcária e granito são materiais muito difíceis de serem extraídos com ferramentas de cobre, assim eles foram cortados com pilões esféricos de duríssimo basalto dolerítico e alisados com pedras polidoras de granito. Pederneira era usada como broca, movimentada por um arco, e areia ou quartzo pulverizado, misturado com água ou azeite de oliva, aumentava seu poder abrasivo. Cinzéis de cobre podiam ser aquecidos e usados para esculpir detalhes. No Egito havia poucas árvores e a madeira era importada do Líbano. Ferramentas de madeira incluíam esquadros, réguas para prumos, malhos, cunhas, alavancas, e rolos, enquanto que a madeira em si era empregada na construção de andaimes e na confecção de braçadeiras do tipo rabo-de-andorinha para unir as pedras. Na foto ao lado um encaixe para receber uma de tais abraçadeiras. Além dos camponeses que executavam um trabalho puramente braçal, havia muito mais pessoas com habilidades específicas envolvidas no empreendimento. A enorme demanda de pedras exigia especialista na tarefa de extraí-las, os quais trabalhavam em turmas. Eles pintavam nas pedras, com ocre vermelho, o nome de suas turmas. Turma da Pirâmide de Degraus, Turma Vigorosa, Turma do Norte, Turma do Sul e Turma do Cetro, por exemplo, são alguns dos nomes encontrados nas pedras de revestimento da pirâmide de Meidum. Na Grande Pirâmide pode-se ler em um dos blocos: Turma dos Artesãos. Quão poderosa é a Coroa Branca de Khnum Khufu!. Também era necessário que as pedras fossem transformadas em blocos e recebessem acabamento de outros tantos mestres e, finalmente, homens hábeis na arte da costrução acentavam os blocos com precisão. Embora a maioria da força-tarefa envolvida com o deslocamento das pedras só entrasse em ação quando não havia o que fazer nos campos, os demais operários estavam permanentemente dedicados ao seu trabalho, seja nas pedreiras, seja no monumento em si. A oeste da pirâmide de Kéfren foram desenterrados alojamentos para 4000 homens, cifra que talvez represente o número total de operários permanentes, e as ferramentas lá encontradas sugerem que se destinavam a abrigar os trabalhadores das pirâmides. Apesar da simplicidade de seu desenho, uma pirâmide é um feito de engenharia incrível. Uma grande quantidade de estudo e planejamento — afirma o egiptólogo James Putnam — deve ter sido necessária antes de que qualquer construção tomasse forma. Esboços encontrados de outros monumentos sugerem que eles tevem ter feito plantas e existem modelos em pedra calcária de diversas pirâmides, os quais podem ter sido auxiliares do projeto arquitetônico. Algum conhecimento de matemática, geometria e astronomia também era requerido para calcular os ângulos da pirâmide. Convém lembrar que um pequeníssimo erro no ângulo de inclinação de uma pirâmide resultaria num desalinhamento considerável das arestas do vértice (figura à esquerda). Outro ponto que chama a atenção é que algumas das medidas desses monumentos revelam um uso exato de Pi. A altura da pirâmide de Kéops, por exemplo, é igual ao perímetro da sua base dividida por 2 Pi. Uma vez que o conhecimento matemático dos antigos egípcios não era suficiente para que eles chegassem a resultados como esse por meio de cáculo, os estudiosos acreditam que tal precisão foi alcançada empíricamente através, por exemplo, da medição de distâncias usando-se a contagem das rotações de um objeto cilíndrico como um tambor (figura à direita). Na escolha do local para construção das pirâmides, os egípcios levavam em conta alguns fatores principais: ele deveria estar situado na margem oeste do Nilo, o lado onde o Sol se põe e inicia sua viagem para o mundo habitado pelos espíritos dos mortos; deveria ficar bem acima do nível do rio para escapar dos danos causados pela inundação anual, mas não muito longe de sua margem para facilitar a chegada das pedras a partir dele; o substrato rochoso deveria ser isento de defeitos ou de tendência para rachadura, para suportar o enorme peso que seria colocado sobre o solo e, finalmente, situar-se a pouca distância da capital. Saqqara e Abusir, por exemplo, localizavam-se junto a Mênfis; Abu Rawash cerca de 27 quilômetros de distância ao norte e Dahshur a apenas oito quilômetros ao sul; Meidum ficava a 53 quilômetros de Mênfis, mas ali apenas uma pirâmide foi erguida. A proximidade do rio era um fator importante, pois muitas das pedras utilizadas na construção de todos os monumentos que compunham o complexo piramidal eram trazidas das pedreiras por via fluvial. Encontrado o local, removia-se a grossa camada superficial de areia e cascalho, para que o monumento assentasse sobre um firme alicerce rochoso. Começava então o nivelamento e alisamento da rocha. A precisão com que se realizava tal trabalho é demonstrada pela Grande Pirâmide, na qual o perímetro da base tem um pequeno desvio de pouco mais de meia polegada com relação ao que seria um nivelamento absoluto. O emprego de canais na irrigação dos campos, desde muito antes da era das pirâmides, ensinou a gerações de egípcios as técnicas de nivelamento. Para nivelar uma área como a base de uma pirâmide — esclarece o egiptólogo I.E.S.Edwards — deve ter sido necessário rodeá-la pelos quatro lados com montículos baixos de lodo do Nilo, preencher o fosso assim formado com água e cortar uma rede de regos na rocha, de tal maneira que o piso de cada sulco ficasse a uma mesma profundidade com relação à superfície da água; os espaços intermediários podiam, então, ser nivelados após a água ter sido liberada. Em outras palavras: enchia-se de água uma rede de sulcos escavados na rocha em toda a extensão das fundações e marcava-se na pedra as linhas da superfície da água (1); secavam-se os sulcos (2); talhavam-se as pedras que excedessem o nível marcado (3) e enchia-se os espaços vazios com pedras (4). Na prática efetiva — esclarece ainda I.E.S.Edwards — a área total coberta pela pirâmide não era sempre reduzida ao mesmo nível do perímetro; como mostra a Grande Pirâmide, um monte de rocha podia ser deixado no centro para ser usado em estágio posterior do trabalho de construção. A última das preliminares consistia em fazer uma acurada medição para que a base da pirâmide formasse um quadrado perfeito e cada um de seus lados estivesse orientado para um dos quatro pontos cardeais. A enorme base quadrada cria uma estrutura muito estável. A unidade de medida era o cúbito real, equivalente a cerca de 52 centímetros. Cordas de medição — prossegue I.E.S.Edwards — eram feitas com fibras de palmeira ou de linho, sendo que ambas certamente se esticavam quando usadas; portanto, é altamente surpreendente que possa haver uma diferença de apenas 20 centímetros entre os comprimentos dos lados maior e menor da Grande Pirâmide — na realidade, parece notável que em lados que excedem 22860 centímetros de extensão possa ter ocorrido um erro tão pequeno, especialmente quando nos lembramos de que o monte central de rocha teria tornado impraticável qualquer medição da diagonal para verificar a precisão do quadrado. A orientação exata das pirâmides com relação aos pontos cardeais só pode ter sido obtida com a ajuda de um ou mais dos corpos celestes, uma vez que a bússola era desconhecida dos antigos egípcios. Não foi possível determinar com exatidão quantos ou quais dos corpos celestes eram empregados nesse processo, mas é lógico que bastava estabelecer a orientação de um dos lados, já que a dos demais se fixava naturalmente com o uso de um esquadro. Outras construções da mesma época, cujos cantos formam ângulos retos perfeitos, demonstram que esse último instrumental existia. Ao mesmo tempo em que os trabalhos preparatórios ocorriam no local do monumento, os alicerces da calçada iam sendo assentados. E isso era feito nessa fase porque quase todas as pedreiras que forneciam material localizavam-se próximas das margens do Nilo, da mesma forma que as pirâmides. Assim sendo, o rio podia ser empregado para o transporte das pedras por meio de balsas. Já que cada pirâmide dispunha de uma calçada que a ligava ao Nilo, a qual se destinava à passagem do cortejo fúnebre, esse era também um caminho conveniente para que nele se arrastasse uma espécie de trenó contendo os enormes blocos de pedra e, portanto, a base da calçada deveria estar concluída antes da edificação da pirâmide. Foto © Canadian Museum of Civilization Corporation. Existem duas vantagens principais no emprego de enormes blocos de pedra na construção de monumentos grandiosos como eram as pirâmides e templos egípcios: obtenção de maior estabilidade e redução no número de junções a serem feitas. O arqueólogo I.E.S.Edwards escreveu: Kéops, que deve ter sido um megalomaníaco, jamais poderia, durante um reinado de cerca de 23 anos, ter erigido um monumento do tamanho e durabilidade da Grande Pirâmide se avanços técnicos não tivessem permitido a seus trabalhadores lidar com pedras de tão considerável peso e dimensões. Quão completamente eles dominaram essa arte pode ser medido pela observação de Petrie de que as junções no revestimento da Grande Pirâmide medem apenas um quinquagésimo de polegada de espessura. Além de saberem manusear pedras tão imensas, os egípcios também conheciam a arte de talhá-las, apesar de toda a sua dureza. Já na I dinastia (c. de 2920 a 2770 a.C.) empregavam granito para pavimentar aposentos e a pirâmide de degraus de Djoser, da III dinastia, tem uma pequena câmara funerária construída totalmente desse material. Entretanto, foi no decorrer da IV dinastia que grandes estruturas, como o templo do vale e o templo mortuário de Kéfren, foram revestidas principal ou completamente com granito. O basalto é outro material que aparece esporadicamente antes da IV dinastia, quando seu emprego passa a ser bem mais considerável. A atividade de exploração das pedreiras era intensa, tendo em vista a enorme quantidade de material necessário para erguer monumentos tão grandes. Entretanto, os antigos egípcios dispunham de pouca coisa além de serras e cinzéis de cobre primitivos para realizar o trabalho. Ainda que primitivas, as ferramentas encontradas por arqueólogos, e datadas de tempos tão antigos quanto a I dinastia, mostraram-se capazes de cortar qualquer tipo de pedra calcária. Seja como for, eles devem ter desenvolvido técnicas especiais para extração dos blocos. A pedra calcária de qualidade inferior e mais maleável podia ser manuseada facilmente a céu aberto, pois encontra-se na superfície. Por outro lado, na obtenção do granito e do calcário de excelente qualidade de Tura era necessário construir túneis. Provavelmente a aplicação de calor e água facilitava o trabalho. Cunhas de madeira — informa o egiptólogo James Putnam — eram enfiadas em fendas na pedra e então ensopadas de água, fazendo com que se expandissem e rachassem a pedra. Os blocos eram então esquadrejados com o emprego de cinzéis e malhos. Serras de cobre também eram usadas, talvez com lascas de pedras preciosas para ajudar no talhe. Para trabalhar o granito tinham que golpeá-lo com esferas de uma pedra ainda mais dura chamada dolerito. No detalhe de uma pedreira que se vê acima, pode-se notar nitidamente as fendas espacejadas regularmente nas rochas. Tais fendas delimitavam os blocos que seriam extraídos com o emprego das cunhas de madeira. A maioria dos blocos que formavam a parte interna das pirâmides tinha pouco acabamento, mas as pedras do revestimento eram talhadas com grande precisão e ajustam-se tão perfeitamente umas às outras que as junções são quase invisíveis. Todo o polimento deve ter sido dado depois que as pedras foram colocadas em seus lugares definitivos. Nas proximidades da pirâmide de Kéops foram encontrados enormes depósitos de lascas de pedra calcária provenientes do trabalho executado com os blocos. Estimou-se que a pedra acumulada em tais depósitos equivale em volume a mais da metade do volume das pirâmides. Um dos maiores desafios era, sem dúvida, o transporte dos enormes blocos. As pedras do revestimento da Grande Pirâmide pesam, em média, duas toneladas e meia cada uma, mas isso é pouco. Algumas delas chegam a pesar 15 toneladas, mas isso também é pouco. As lajes de granito do teto da câmara mortuária da mesma pirâmide pesam 50 toneladas e, se você ainda acha que é pouco, saiba que algumas das pedras mais pesadas encontradas no templo mortuário de Miquerinos pesam cerca de 200 toneladas! E não podemos esquecer que mesmo as "menores" dessa lista tinham que ser embarcadas e desembarcadas de balsas e elevadas a alturas consideráveis com relação ao solo. Navegar com esses megálitos exigia um perfeito controle de enormes e pessadíssimas balsas lotadas, em um rio de correnteza rápida e com bancos de areia em alguns trechos, sem dúvida uma operação arriscada que requeria grande habilidade. No transporte por terra provavelmente usavam o mesmo método, qualquer que fosse o tamanho da pedra: o arraste. Apenas a quantidade de homens variava conforme o peso a deslocar. Os egípcios sempre cantavam em coro durante o trabalho. Se possível, marcavam o ritmo com as mãos e os pés, o que dava unidade aos movimentos facilitando a tarefa. |
Uma vez preparado o local e transportadas as pedras para junto dele, restava o trabalho da construção propriamente dita. Cerca de 80% dos materiais do monumento estão concentrados em sua metade inferior. Isto significa que relativamente poucos blocos de pedra foram elevados aos níveis superiores. Uma vez que as pirâmides são sólidas, não foram necessárias paredes ou pilares para suportar a estrutura. Apesar destes fatores, as tarefas não eram simples: havia que elevar os blocos a alturas consideráveis e assentá-los de maneira a criar um interior coeso e uma parte externa de forma regular. Sem levarmos em consideração as câmaras e corredores internos das pirâmides, vejamos, a seguir, de que forma os monumentos estavam estruturados.
Tomemos como exemplo a pirâmide de Meidum, construída no decorrer da III dinastia (c. 2649 a 2575 a.C.). Seu cerne é formado por várias camadas de alvenaria, de tamanhos sucessivamente menores, que se sobrepõem criando uma estrutura escalonada. A pirâmide de degraus assim resultante foi posteriormente convertida em pirâmide verdadeira, através do preenchimento dos degraus com pedras pequenas que encheram os vãos. Finalmente aplicou-se um revestimento externo de pedra calcária de Tura. Estudos arqueológicos demonstraram que o mesmo método continuou a ser empregado até períodos bem posteriores do Império Antigo (c. 2575 a 2134 a.C.).
Outro exemplo é o da pirâmide de Sahure em Abusir. Ela é formada por camadas verticais com cerne de alvenaria (1) revestidas de pedra calcária (2), blocos de pedra para entulhamento (3) e, por fim, o usual revestimento exterior e polido de pedra calcária de Tura (4). Não sabemos ao certo se as três pirâmides principais do Egito foram edificadas da mesma maneira, porque para sabê-lo seria necessário desmontar partes substanciais dos monumentos. Entretanto, as demais pirâmides subsidiárias situadas em Gizé foram erguidas dessa forma e os estudiosos não vêem razão para que os três colossais monumentos tenham sido construídos de forma diferente. Externamente, todas as pirâmides edificadas após a pirâmide torta de Dahshur eram semelhantes, com exceção do tamanho e de alguns pequenos detalhes. O ângulo normal de inclinação era de cerca de 52°, sendo que a pirâmide vermelha de Dahshur é a única que foge à regra com sua inclinação de 43° 36'.
É certo — afirma James Putnam — que as várias camadas de pedra eram assentadas do centro para as bordas e também é evidente que as pedras de revestimento eram colocadas no sentido do topo para a base. Não sabemos como os blocos eram elevados do nível do solo para a sua posição final. É provável que sólidas rampas tenham sido erguidas ao redor da área da construção. Os pesados blocos podem ter sido arrastados ao longo das rampas numa espécie de trenó até a plataforma de trabalho. Vestígios de rampas foram descobertos junto à pirâmide de Meidum. Eles também podem ter usado uma espécie de andaime para revestir o monumento com a pedra calcária.
Já I.E.S.Edwards escreve: Na ausência da roldana — um artefato que não parece ter sido conhecido no Egito antes dos tempos romanos — apenas um método de elevar grandes pesos estava disponível para os antigos egípcios: o uso de rampas compostas de tijolo e entulho, as quais se erguiam a partir do nível do solo até qualquer altura que se desejasse. Se, por exemplo, uma pequena parede tivesse que ser construída, as pedras de cada camada após a primeira seriam trazidas ao nível desejado por meio de uma rampa erguida contra a parede ao longo de todo o seu comprimento e que se projetava para fora em ângulo reto com a linha da parede. Com o acréscimo de cada carreira sucessiva de alvenaria, a rampa podia ser elevada e também estendida, de molde a que o gradiente se mantivesse inalterado. O gradiente da rampa provavelmente dependia do peso do material a ser transportado. Finalmente, quando a parede tivesse sido erguida até a sua altura total, a rampa podia ser desmontada e as faces externas das pedras, que não haviam sido polidas previamente, podiam ser revestidas camada por camada, de cima para baixo, à medida em que o nível da rampa era reduzido. Escombros desse tipo de rampa foram encontrados junto da pirâmide de Meidum, como já dito, e também junto do inacabado templo mortuário de Miquerinos e da pirâmide de Amenemhet I em el-Lisht. Um documento da XIX dinastia (c. 1307 a 1196 a.C.) apresenta as seguintes medidas aproximadas para uma rampa hipotética: comprimento, 379 metros; largura, 29 metros; altura máxima, 32 metros.
Os arqueólogos supõem que no caso das pirâmides de degraus os vários níveis serviriam como plataformas, sobre as quais quatro rampas poderiam ser construídas lado a lado, uma contra cada face do monumento, como ilustra a figura esquemática da esquerda. Estruturas auxiliares, à guisa de andaimes, feitas de tijolos ou madeira, colocadas em locais não cobertos pelas rampas, permitiriam manobrar mais facilmente as pedras usadas no revestimento. É o que ilustra, à direita, a foto do Canadian Museum of Civilization Corporation da representação artística feita para um filme. Reduzindo progressivamente a altura de tais estruturas, seria possível trabalhar no revestimento da pirâmide ao mesmo tempo em que níveis mais elevados ainda estivessem sendo erguidos. Abaixo, outra simulação de uma rampa.
Já no que diz respeito às pirâmides verdadeiras, acreditam os estudiosos que existiria uma única rampa que cobria totalmente uma das faces do monumento. À medida em que a pirâmide subia, a rampa ia sendo aumentada em altura e comprimento e seu topo ia sendo estreitado para corresponder à diminuição da largura do monumento. Nas outras três faces da pirâmide haveria estruturas auxiliares de largura suficiente no topo para permitir a passagem do material e dos trabalhadores. Em el-Lisht, escavadores norte-americanos encontraram vigas de madeira que poderiam ter sido colocadas no topo da rampa e das estruturas auxiliares, de modo a formar um caminho estável para a passagem dos trenós que transportavam os blocos de pedra. As rampas seriam lubrificadas com água para reduzir a fricção do arrastar dos blocos. Apenas dez homens seriam necessários para arrastar cada bloco de pedra rampa acima.
Pode-se imaginar que uma pirâmide que já estivesse erguida até metade de sua altura total estaria totalmente rodeada pela rampa e demais estruturas auxiliares e que do solo nada se veria das pedras que já tivessem sido assentadas. A parte superior do monumento nada mais seria do que uma plataforma quadrada, pronta para receber uma nova camada de alvenaria. As primeiras pedras a serem colocadas seriam as centrais e os homens trabalhavam simultaneamente nas quatro direções, cuidando para manter sempre a estrututra quadrada. As pedras, polidas apenas na sua face inferior, eram encostadas umas às outras e nem sempre se ajustavam perfeitamente nas laterais, mas os vãos causados pelas irregularidades geralmente não eram preenchidos. O trabalho prosseguia até que restasse a descoberto apenas uma pequena margem da parte externa da plataforma original. Sobre ela era então aplicada uma camada de pedra calcária local, tomando-se maior atenção no que diz respeito ao preenchimento das junções entre as pedras. Foto © do Canadian Museum of Civilization Corporation.
O último passo consistia em aplicar o revestimento final com a pedra calcária de qualidade superior extraída em Tura. Tratava-se de uma operação bastante delicada, pois dela dependia todo o aspecto externo do monumento e a manutenção da sua forma piramidal. As junções, não apenas das pedras do revestimento de uma mesma fileira entre si, mas também destas com as pedras da camada mais externa do miolo da pirâmide, mais do que nunca precisavam ser perfeitas. Os arqueólogos acreditam que esse trabalho era executado por habilidosos pedreiros no nível do solo. Quando as pedras subiam para serem colocadas em seus lugares, os ajustes necessários já haviam sido feitos. Mesmo assim, o assentamento das pedras do revestimento não era nada fácil, principalmente se fosse um dos blocos de grandes dimensões pesando, talvez, mais de dez toneladas. Cada pedra era transportada em trenó e posicionada diretamente em frente ao ponto no qual deveria ser definitivamente assentada. Camadas finas de argamassa eram aplicadas sobre ela, formando uma espécie de lubrificante que facilitava seu deslocamento. Com emprego de alavancas, o bloco era retirado do trenó e colocado sobre o topo da pedra correspondente da camada inferior de revestimento e, a seguir, ajustado na sua posição final.
A construção ia crescendo da forma descrita, elevando-se concomitantemente a rampa e as estruturas auxiliares. Por fim, uma pedra triangular, geralmente de granito, era assentada no ápice da pirâmide. Para fixá-la com firmeza, esculpia-se no centro de sua base uma protuberância em forma de disco que se ajustava num encaixe preparado para recebê-la, localizado no centro da última camada de alvenaria do monumento. O mesmo método empregado para assentar as demais pedras deve ter sido usado para ajustar esta última. Embora exista um texto que se refira a uma de tais pedras como revestida de ouro, a mais valiosa encontrada até hoje é feita de granito cinza e pertencia à pirâmide de Amenemhet III, localizada em Dahshur. Suas quatro faces estão esculpidas com invocações dirigidas ao deus-Sol e a três outras divindades.
Terminada a construção do monumento, iniciava-se o polimento de suas quatro faces, iniciando-se pela pedra triangular do topo. À medida em que o trabalho prosseguia, a rampa e as estruturas auxiliares iam sendo desmontadas e a pirâmide começava a surgir em todo o seu esplendor. Os arqueólogos acreditam que nessa fase a rampa e as demais estruturas iam sendo desmontadas não de forma gradual, mas em etapas de vários metros de altura. Eram, então, substituídas por andaimes de madeira, artefatos que sabemos que os egípcios conheciam, os quais permitiriam que uma maior quantidade de homens pudesse trabalhar a diferentes níveis ao mesmo tempo. Finalmente, os construtores dedicavam-se à edificação do templo mortuário, do templo do vale e da calçada que os unia, sendo que alguns deles talvez já tivessem tido seus alicerces assentados antes que a construção da pirâmide fosse iniciada.
Já as pirâmides da XII dinastia (1991 a 1783 a.C.) e da XIII (c. 1783 a 1640 a.C.) foram construídas com uma técnica diferente. O motivo para a alteração do método foi a necessidade de economia, uma vez que o novo processo se adequava bem às estruturas relativamente modestas da época, erguidas com materiais inferiores. O autor John Baines nos explica: Do centro da pirâmide partiam sólidas paredes de pedra, enquanto outras, mais pequenas, se cruzavam para formar uma série de câmaras internas cheias de blocos de pedra, de entulho ou de tijolos. A estrutura era então completamente coberta do habitual revestimento exterior. Embora fosse bastante eficaz a curto prazo, este método não se podia comparar aos mais antigos e todas as pirâmides construídas desta maneira estão atualmente muito dilapidadas. A pirâmide de Sesóstris I é um exemplo de monumento construído segundo essa técnica.
De que forma teriam sido construídos os corredores e câmaras internas das pirâmides? Como tais partes ocupavam apenas uma pequena porção de todo o monumento, acredita-se que possam ter sido erguidas quase que independentemente do restante da tarefa. Rampas subsidiárias, capazes de serem desmontadas em poucas horas, podem ter sido erguidas em qualquer estágio conveniente, de maneira que os blocos pudessem ser erguidos a pontos consideravelmente mais altos do que o nível da camada da pirâmide que estivesse sendo construída naquele instante. Assim, os operários teriam tempo de terminar seu trabalho no interior do monumento antes que chegasse o momento de assentar as pedras da pirâmide que cobririam os corredores e câmaras. Os blocos, muito provavelmente, eram preparados e numerados antes que chegasse o momento de sua utilização e, deste modo, ao serem levados às suas posições finais, o assentamento se fazia sem muita demora. Os sarcófagos e portas levadiças eram introduzidos no recinto respectivo antes que suas paredes fossem edificadas. Quando a câmara funerária era talhada diretamente na rocha, fazia-se necessário colocar o sarcófago em seu interior antes da construção do teto. Os túneis de acesso às câmaras, na maioria dos casos, não tinham dimensões suficientes para que os sarcófagos pudessem ser introduzidos por ali. Um dos métodos que os arqueólogos imaginam que pode ter sido usado consiste em encher inteiramente a câmara sepulcral de areia e cascalho, arrastar o sarcófago para o centro desse monte de pedras e, a seguir, retirar paulatinamente o entulho. Dessa maneira o ataúde desceria lentamente até o solo sem sofrer danos. Como geralmente a câmara mortuária estava ligada a uma antecâmara, uma parede podia ser construída entre os dois recintos para conter a areia e esta se escoava quando a parede era demolida após o assentamento do sarcófago. Para a construção do teto de algumas das câmaras funerárias deve ter sido |
empregado o mesmo processo. Depois do sarcófago ter sido devidamente colocado em seu lugar, o compartimento era novamente preenchido com areia até que esta transbordasse e as grandes lajes que formavam a cobertura eram então arrumadas de forma inclinada sobre o | entulho. Ajustados os blocos cuidadosamente, a areia e as pedras eram retiradas através de seu escoamento para o compartimento que fosse contíguo à câmara mortuária. |
Areia, terra e entulho também devem ter sido empregados na edificação dos templos. O possível método de construção de um templo pode ser descrito da seguinte maneira: inicialmente era colocada a primeira camada de pedras do templo e todo o espaço ao seu redor era recoberto de terra. As pedras da segunda camada eram içadas por meio de rampas e empurradas para cima desse aterro. A seguir eram colocadas em seus lugares. Novamente preenchia-se com entulho o espaço circundante até nivelar com a altura da segunda camada de pedras. Colocava-se então no lugar a terceira camada e assim se procedia sucessivamente, fieira após fieira. Concluídas as paredes centrais, a terra que cobria o templo inteiro era retirada. O trabalho se repetia com emprego do mesmo método, agora para erguer as paredes de revestimento do templo. Feito isso, novamente o aterro era retirado. |
Chegara a vez das colunas de granito destinadas a sustentar o teto. Inicialmennte elas estavam talhadas grosseiramente. Tais pilares eram colocados por homens que se instalavam no alto das paredes. Essas equipes puxavam as colunas com cordas, enquanto outros homens as empurravam com alavancas. Uma vez que todas as colunas estivessem em seus lugares, novamente o templo era preenchido de entulho e, finalmente, as lajes do teto eram alçadas às suas posições através de rampas. Quando o teto já se encontrava totalmente colocado e acabado, o entulho ia sendo retirado progressivamente. Nessa fase ele servia como plataforma de trabalho para os artífices. Uns finalizavam os capitéis das colunas, que antes haviam sido apenas rudimentarmente esculpidos; outros gravavam e pintavam, não só nas colunas mas também nas paredes do templo, vários episódios, reais ou imaginários, da trajetória do faraó nessa vida e na do além-túmulo. A pavimentação do solo, em pedra de granito ou alabastro lindamente talhada, era o último passo desse hábil trabalho de construção. As calçadas de acesso aos templos, supõem os arqueólogos, eram construídas com o emprego da mesma técnica. Especulam também muito os estudiosos sobre o eventual número de trabalhadores que teriam sido empregados na construção das pirâmides e o tempo necessário para erguê-las. Na visão de Heródoto a Grande Pirâmide levou 20 anos para ser construída. E pelo que ele afirma, no decorrer de um ano eram empregados 400 mil homens divididos em turmas trimestrais de 100 mil homens cada. Dizem os arqueólogos que esse número é exagerado. Tendo-se como aproximadamente correto o fato de que aquele monumento é formado por dois milhões e 300 mil blocos de pedra, o número médio de blocos a serem transportados anualmente, por um período de 20 anos, seria de 115 mil. Tais blocos pesam, em média, duas toneladas e meia e os estudiosos acreditam que poderiam ser manuseados por turmas de oito homens. Se considerarmos um total anual de apenas 100 mil homens, cada turma teria que mover 10 blocos em 12 semanas, o que parece ser uma tarefa factível, sobretudo levando-se em conta que a distância a ser vencida não era muito grande, principalmente para os blocos da parte interna do monumento, os quais eram encontrados normalmente naquelas vizinhanças. Ao que tudo indica, o trabalho era realizado durante a estação da inundação, dos finais de julho ao fim de outubro, quando a terra não podia ser cultivada e a mão-de-obra ociosa era abundante. No que diz respeito aos 20 anos de construção atribuídos por Heródoto à edificação da Grande Pirâmide, existem evidências que se contrapõem a essa informação. Nas pedras do revestimento da pirâmide vermelha de Dahshur foram encontradas duas datas inscritas com ocre vermelho. A primeira refere-se ao 21º ano do reinado de Snefru e, estando inscrita no canto nordeste do monumento, deve indicar o ano no qual o trabalho começou. A outra data está inscrita num bloco situado no centro de uma das faces da pirâmide e indica o ano seguinte daquele reinado. Como Snefru havia mandado construir anteriormente a pirâmide torta e, pelo menos parcialmente, a pirâmide de Meidum, é bem provável que a pirâmide vermelha tenha sido erguida no final do seu reinado de apenas 24 anos. Entretanto, torna-se difícil acreditar que fosse possível erigir tal monumento em apenas três anos se a Grande Pirâmide, com apenas uma terça parte a mais em volume, tivesse levado 20 anos para ser concluída. Tudo isso demonstra quão especulativas ainda são as afirmações feitas pelos estudiosos a respeito dos enígmas das pirâmides. |
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