sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Maria do Cavaquinho

 Maria do Cavaquinho

Maria Cavaquinho dessas foi criaturas bizarras que a cidade viveu na década de 50.
Ela quebrou a monotonia das ruas e esquinas de Curitiba com seu jeito descarado.
Ficava no antigo ponto Café Alvoradinha, popa de Oliveira Belo, mas podia ser visto por aí, preparando confusão e cenas hilárias.
desafiou o formalismo hipócrita de certo guarda pedestre, para desvendá-los de volta com o frágil cavaquinho, geralmente a mando de alguém ao preço de alguns trocados.
lembram-se de outras figuras folclóricas como Harquebus Misery, Foot Spread, Mary Balloon e outras, mas nenhuma chegou a desfrutar da intimidade da paisagem urbana, como ela, com tanta irreverência.
foi, porém, uma agressão ingênua, inconsciente até, pois denotava sinais de debilidade mental.
Ao cantar, emitia sons ininteligíveis.
Mas, divertia a galera com suas piadas e comicidades.
Venceu por “status” a citar, junto com Crushes na crônica Mazza, o Adherbal Forte e com certeza, o Tre-visan de Dalton. Mereceu muitas páginas antológicas o livro de Valério Hoerner Jr., publicado em
1989, “Ruas de Curitiba e histórias”. corpo de mulher. Esses tipos populares vêm e vão, com pássaros de passagem. Faltam, porque operam no dia-a-dia como parte da própria rotina.




Compreendendo também uma história da cidade, pois definem os contrastes que identificam as misérias da condição humana.
foi assim que um dia desapareceu o Cavaquinho de Maria. não voltou mais.
vazio deixado na avenida, as perguntas levantadas são ressentidas: O que aconteceu com você? Sem resposta, por muitos anos, ficou em um canto da memória a frustração da curiosidade insatisfeita.
Perdeu-se por sua ausência um elo dessa corrente sentimental que se aproximava, o milagre da fantasia, como pessoas diferentes.
De repente, eis que o reencontro, por acaso, vagueia pelas ruas históricas da Lapa. parece não ser o mesmo, murcho pela velhice prematura.
Vidas Irmãs de Caridade Asilo São Vicente.
Apagou sua imagem turbulenta e mágica.
divertido não se lembra dessa figura, capaz de travessuras e insolências.
Balbucia poucas palavras, recolhe-se ao silêncio, prisioneiro de si mesmo.
Defronto-me com o passado e reviso-o no centro das evocações.
Posso imaginá-la recuperando aqueles blocos infantis da adolescência, para reinar à sua maneira, através dos enfeites de palhaços de circo em sua arena particular e exclusiva.
E ela, coitada, olha-me indiferente e distante, sem saber se, diante dos meus olhos, virou saudade...
Túlio Vargas é Academia Paranaense de Letras.

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