quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Em 1891 o Padre polonês Zygmunt Chelmicki, de Varsóvia, foi designado para vir ao Brasil saber como estavam sendo tratados seus conterrâneos

 Em 1891 o Padre polonês Zygmunt Chelmicki, de Varsóvia, foi designado para vir ao Brasil saber como estavam sendo tratados seus conterrâneos


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Em 1891 o Padre polonês Zygmunt Chelmicki, de Varsóvia, foi designado para vir ao Brasil saber como estavam sendo tratados seus conterrâneos que, encantados com as promessas de uma boa vida na nova terra, vieram para cá na conhecida "Febre Brasileira".
Este diário de bordo virou um livro em 1892: W BRAZYLII NOTATKI Z PODRÓZY (No Brasil - Anotações de Viagem).
Este livro serviu de referência para que novos imigrantes soubessem da realidade triste que os poloneses enfrentaram por aqui. Meu bisavô Edward Winklewski adquiriu uma cópia antes de vir com a família para a América do Sul. Em 2010, minha avó Sofia Dyminski traduziu este livro para o português.
Transcrevo abaixo a parte onde o Padre conta sobre sua visita a Curitiba e sua impressão sobre nossa Cidade.
O texto é longo, mas de leitura agradável.

“Em Curitiba, mais uma vez tive oportunidade de constatar até que ponto foi justa a minha observação ao afirmar que a imigração forçada foi obra da imprudência, empreendida de maneira leviana e caótica, muitas vezes até realizada de má-fé. De janeiro até a presente data, haviam chegado à Província do Paraná mais de 5.200 imigrantes, contudo Curitiba, que servia de primeira pousada, não estava preparada para mais de algumas centenas. A solução foi improvisar a acomodação em casas particulares na Rua Aquidabam e Praça do Rosário. Na primeira casa, encontrei 491 pessoas e na segunda, 301. Com esse número de pessoas, o aperto se fez sentir; agora imaginemos o que deveria estar acontecendo nessas casas quando, poucas semanas atrás, foram obrigados a permanecer o dobro de gente? Naturalmente, não havia a menor possibilidade de manter as mais elementares condições de higiene. Em volta das casas, tudo é barro malcheiroso. É bem verdade que os nossos emigrantes são bastante desleixados, mas mesmo que fossem ordeiros não adiantaria quase nada. Lá encontrei o Dr. Meyer, um alemão, que, por consideração, trata dos doentes com dignidade e dedicação. Contudo ele está aqui há pouco tempo, e, quanto ao seu antecessor, muitos de nossos emigrantes se queixaram dele para mim.
É grande a mortalidade entre as crianças. Apesar do clima muito mais suportável, assim mesmo elas morrem em número assustador vítimas da disenteria e inanição. E mesmo em relação a Curitiba, a minha opinião anterior mais certa é que todas as crianças até dez anos estão condenadas à morte no Brasil.
Se nas duas casas que citei anteriormente, com número de imigrantes não muito grande, a permanência é mais ou menos sofrível, então causa revolta o barracão em Paragui, na Colônia Tomás Coelho, situada a dez quilômetros da cidade. Imaginem uma casa de quatro paredes, de madeira, rodeada de banhados, a ponto de ficar alagada após chuvas mais prolongadas. Dentro do alojamento, ao longo das paredes, foram colocadas duas fileiras de beliches, destinados ao descanso dos imigrantes. Os leitos não possuem colchão, apenas palha ou tábuas nuas. São constantes os casos de tifo, febre, disenteria e outras doenças. Atualmente tiveram pena dos coitados e levaram para São Mateus os que ainda estavam em boas condições de saúde. São Mateus está localizada a 200 quilômetros de Curitiba, e lá estão sendo fundadas a cidade e as colônias. Dentro do barracão, encontrei perto de 30 famílias, à espera da morte ou da melhora de seus familiares. Para se ter ideia da mortalidade aqui constatada, serve de prova o fato de que o vigário local, Padre Soja (polonês) sepultou 86 pessoas, num período de quatro meses, na maioria crianças, tanto que foi obrigado a ampliar o cemitério.
No barracão de Tomás Coelho, aconteceu um fato que prova a absoluta falta de assistência aos imigrantes, bem como a selvageria da soldadesca local.
No dia 10 de maio, os soldados designados para proteger os imigrantes tentaram violentar a mulher de um deles. Indignados com essa infâmia, as demais pessoas correram para acudir. Começou a briga. Vencidos, os soldados foram obrigados a bater em retirada. A título de vingança, porém, arrastaram até o mato próximo um inocente, que naquele momento estava dormindo, Jozef Lakomy, um camponês da região de Kalisz, distrito de Brudzewo; amarraram-no a uma árvore e seviciaram da maneira mais cruel. Uma chuva torrencial interrompeu o trabalho dos carrascos, que o abandonaram inconsciente e sem sentidos, depois de lhe aplicarem uma impiedosa surra com espadas. Lakomy monstrou-me uma grande ferida que ainda tinha na cabeça. Ele havia saído do hospital poucos dias atrás. O fim que levaram os patifes, ninguém sabe, mas acho que o Governador General Lima, homem justo que é, não deixou passar o fato sem lhes aplicar boa reprimenda. Os jornais locais noticiaram o acontecido com indignação, entre outros o Beobachter, nº21, de abril deste mesmo ano, exigindo severa punição dos culpados. Esse é o comportamento daqueles que deveriam zelar pela segurança dos imigrantes!
A situação dos imigrados não difere nada daquilo que vi até agora. Muitos deles já provaram o amargor das colônias, e acabaram evadindo-se das Províncias de Santa Catarina, e até do Rio Grande, vindo a pé até Curitiba. Semanas após semanas, ficaram errando pelas matas, até que finalmente chegaram aqui. Eles estão tão arrasados com sua desdita, que é de cortar o coração da gente, ainda mais quando começam contar seus casos dolorosos. Todos, sem exceção, derramam lágrimas amargas só de pensar que ainda vai demorar muito tempo até voltarem para sua terra ou talvez nunca mais voltem. Qual não foi o desespero deles quando fui obrigado a retificar suas errôneas esperanças de que eu não teria poderes de devolvê-los todos para casa!
Apenas de passagem menciono aqui que muitos estão há mais de seis meses nos barracões de imigrantes esperando receber seu quinhão de terra nas colônias. Enquanto isso, perambulam pela cidade ociosamente. Alguns pedem esmola, outros bebem, mas em todos a miséria moral é mais lamentável que a material.
Artifíces, com algum conhecimento da língua alemã, principalmente os carpinteiros, serralheiros e sapateiros, encontraram trabalho. Alguns deles ganham de 2000 a 3000 réis por dia. Outros procuraram trabalho na construção da estrada de ferro Curitiba – Lapa. Prometeram pagar-lhes 2000 reis por dia, mas se queixam de que os empresários os tapeiam, dificultando o pagamento, de modo que foram obrigados a abandonar o serviço e até desistir do que deveriam receber. Falaram-me também sobre certo T., irmão de um dos funcionários do Departamento de Imigração, que contrata imigrantes e não os paga. Além disso, esse sujeito se permite praticar torpezas, que até dão nojo só de lembrar. O padre Andrzejewski – ao ser chamado para dar assistência a uma doente – foi testemunha involuntária de repugnante bacanal, que teve lugar em casa próxima, organizada por esse elemento, o que prova a que ponto sua libertinagem foi capaz de levá-lo. Disseram-me que as autoridades locais ficarão atentas aos atos desses seus patrícios, mas, como sempre acontece no Brasil, é preciso ter “paciência”.
Para terminar, cumpre dedicar algumas palavras só a Curitiba. Ela conta aproximadamente com 20.000 habitantes e – apesar de fazer grandes progressos nos últimos tempos – sob muitos aspectos deixa muito a desejar. Os estrangeiros se estabeleceram em número considerável, sendo a maioria deles alemães, bem como 50 poloneses aproximadamente, procedentes da Prússia, do Condado e da Galícia. Na maior parte, eles são comerciantes e artífices. Alguns, principalmente os alemães, chegaram a possuir considerável fortuna. Entre os poloneses, conheci aqui os irmãos Wabeski, Szulc, um comerciante de Poznan, Stachowski, também comerciante, e outros. Todos trabalham com dedicação e honestidade. Este ano, os estrangeiros tiveram o privilégio de eleger 5 deputados à Assembléia Estadual, entre os quais o comerciante Bertold Adam representa os interesses dos poloneses com muita dedicação e honestidade. Sobre as colônias daqui, que surgiram em 1870, darei um relatório detalhado em outro capítulo. É de lamentar que a falta de união entre os estrangeiros não lhes permita formar uma frente maciça. Se assim se organizassem, eles conseguiriam realizar inúmeros benefícios e evitar muitos abusos da parte da administração brasileira.
Em Curitiba, a vida é mais barata que em outras cidades. No hotel, pode-se conseguir uma diária com todas as refeições, por 3.500 réis. Um quilo de carne custa 280 réis. Resumindo: um trabalhador pode ter seu sustento por 800 a 1.000 réis por dia, e de 1.500 a 2.000 réis com a família. O aluguel também não é muito caro. Um pequeno quarto com cozinha custa perto de 6.000 réis por mês. O comércio varejista e as profissões específicas são geralmente dominados pelos estrangeiros.
Aqui se trava uma luta renhida entre dos partidos: o dos conservadores, chamados “cascudos” (que os poloneses transformaram em paskudy, que em polonês significa “feiosos”), ou seja, os “grossos”, e os liberais, os farrapos, ou seja, os “sem-culotes”. Sobre ambos os partidos corre aqui este ditado: “Um rouba, outro rapa”. Atualmente estão no poder os liberais, tendo à frente o advogado Dr. Generoso Marques dos Santos, que dizem ser um homem honesto, existindo, portanto, a esperança de que sob sua administração o partido se libertará dessa fama até agora corrente.
Essas são mais ou menos as impressões que trouxe de Curitiba.”

Na foto, imigrantes polonêses dissidentes de colônias de Santa Catarina, viajando a pé em busca de melhores oportunidades.
(Por Luis V. Dyminski) 

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