sábado, 31 de dezembro de 2022

Histórias de Curitiba - O mito Maria Bueno - final

 

Histórias de Curitiba - O mito Maria Bueno - final

O mito Maria Bueno

final
Valêncio Xavier

Em 1948, Sebastião Isidoro Pereira publica "Maria Bueno", onde "a alma de Maria Bueno contribuiu com a força do seu milagre e autuou em nosso cérebro inun-dando-o com os pensamentos necessários".
Nesta visão psicografada, Maria Bueno seria morretense, última de uma série de 7 filhas.
Maltratada pelo pai alcoólatra, foi viver na casa de uma irmã casada, perto da Capela do Tamandoá, em São Luiz do Purunan.
Moça bonita e muito dada, Maria Bueno provoca amores pecaminosos por parte de seu cunhado.
Para evitar o pior, ela decide entrar num convento.
Os padres da capela do Tamandoá mandam Maria Bueno para Curitiba, aos cuidados de um casal de velhos.
Morto o marido, ela passa a ajudar a viúva nas despesas da casa, fazendo serviços para fora, e fica noiva dum rapaz de Morretes.
Na madrugada de 29 de janeiro de 1893, Maria Bueno atendia uma festa numa casa perto, quando recebe um bilhete da viúva chamando-a.
Apesar do adiantado da hora, volta para casa atravessando um matagal na rua Campos Gerais (Vicente Machado), entre Visconde de Nácar e Visconde do Rio Branco.
Rui Wachowicz, em sua pesquisa, afirma ser essa região a zona do meretrício da época. Lá se encontrava emboscado Inácio José Diniz que enviara o bilhete falso.
Diniz tenta violentá-la e, ao defender sua honra, Maria Bueno é degolada pelo assassino.
Essa versão novelesca é adotada pelos devotos e, em 1980, serve de enredo para uma telenovela de Paulo de Avelar, transmitida com sucesso pela finada TV Paraná. De acordo com essa versão é como Maria Bueno se apresenta quando baixa em alguns terreiros de umbanda de Curitiba.
Na década de 1960, Arnaldo Azevedo, ex-campeão sulamericano de tênis, cria a Irmandade Maria Bueno e resolve construir uma capela no túmulo dela.
Convoca 7 virgens, 7 médiuns e 7 videntes.
Através duma das virgens em transe, Maria Bueno aprova os planos da construção, reconhece como sua uma foto onde a uma moça branca veste blusa com zipper, útil aparato que só será inventado nos anos 1920. Essa foto vai orientar um menino de dez anos para esculpir a imagem de Maria Bueno que encima seu túmulo. A confusão com fotos parece ser uma constante em Maria Bueno.
No livro "Ruas e Histórias de Curitiba"(l989), Valério Hoerner publica como autêntica uma foto do julgamento de Diniz, onde réu, público e guardas aparecem com roupas e fardas dos anos 1940.
A inauguração em 1962 da capela no túmulo de Maria Bueno no Cemitério Municipal traz novo alento e novas lendas ao culto. A Irmandade se encarrega não só de vender velas e recolher dinheiro, mas também de espalhar os milagres: o mais repetido é o dos ladrões que tentam arrombar o cofre onde os devotos depositam suas doações, e não conseguindo põem fogo na capela, milagrosamente o fogo se apaga e não atinge a imagem de Maria Bueno. O dinheiro que a Irmandade recolhe só Deus sabe onde vai.
As romarias são intensas na capela de Maria Bueno, principalmente nos finados, quando há filas quilométricas.
No início, os pedidos eram para casos de amor: arranjar marido, para o marido voltar a amar a mulher e deixar de beber, coisas assim.
Nos últimos anos, com a crise, a maioria dos pedidos é para arranjar emprego.
Coisa que nem Maria Bueno consegue mais resolver

Valêncio Xavier é escritor.

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