quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Histórias de Curitiba - Todos eramos felizes

 

Histórias de Curitiba - Todos eramos felizes

Todos eramos felizes
Dino Almeida (in memorian)

1955. No vai e vem da Rua XV de Novembro (hoje novamente nossa Rua das Flores), ao descer para o jornal "A Tarde", eu iniciava a então incompreendida carreira de colunista (ou cronista) social. A via de mão dupla, com Buicks, Packards, Oldsmosbiles e outros.
Na cidade de uma rua só, como diziam em tom de blague, eu não sabia: viviámos a era dos últimos conversíveis e das grandes limou-sines. E das grandes ilusões.
Eu sempre entrava na Schaffer para saber das menini-nhas a últimas novidades.
Acho ter sido ali que cometi a primeira gafe.
Com ar de importante, pedi ao famoso garçom "Barão"mo-rangos com nata, e ouvi a toni-truante resposta dele em seu paletó de linho impecável: "Não estamos na temporada de morangos"...
Continuava descendo a Rua XV e no Restaurante Paraná (famoso por sua sopa húngara) aprendi a colher alguns potins com gente mais madura da sociedade.
Na Cometa, assim como na Guairacá (esta já na Avenida
João Pessoa, hoje Luiz Xavier), com seu conjunto alemão, encontrava uma faixa mais boêmia, que também rendia algumas notícias. Só mais tarde descobri dois locais fascinantes: o Grande Hotel Moderno e o Jonscher - o primeiro na XV e o segundo na Barão, cujos restaurantes (também com seus conjuntos musicais Vienenses) tinham Fredy Jonscher sempre presente. O bar do Grande Hotel era
o ponto obrigatório dos "monstros sagrados" de nossa sociedade.
Ali conheci gente como prof.
Gaspar Lacerda Pinto, Adherbal Stresser, senador Adolpho de Oliveira Franco e Jofre Cabral. E a saborear ovos pochê, superchic.
Como colunista, minha primeira grande recepção e minha segunda gafe foi no Palácio Igua-çú, onde Moysés Lupion dava uma série de banquetes, na fase de reeleição, comemorando sua vitória depois de 4 anos no ostracismo, com Bento Munhoz da Rocha Netto no governo.
Voltava a reinar uma das mais humanitárias primeiras-damas que o Paraná já teve: D. Hermínia Rolim de Moura Lupion.
Nessa festa, cometi o deslize de esborrifar meus vizinhos de mesa com o delicioso molho de peru servido pelos meus amigos garçons, profissão que eu já tinha exercido.
Mas, foi Jofre Cabral e Silva meu primeiro grande incentivador e o primeiro a organizar uma festa para me apresentar como colunista a várias personalidades.
Excelentes anfitriões, ele e sua mulher, Dona Glorinha, receberam com grande classe em sua residência, ajudando assim a vencer a rejeição pelo novo gênero jornalístico, que já ocupava espaços importantes na imprensa nacional e internacional.
Jofre foi um dos tipos inesquecíveis de minha vida.
Em sua casa havia uma ilustração da cidade, com os dizeres: "Curitiba, eu te amo". Até nisso ele foi de vanguarda.
Era um apaixonado por Curitiba, pela noite, pela vida, pela boêmia.
Vivíamos a febre do ouro verde do café e a vida noturna de Curitiba nunca mais foi a mesma.
La Vie en Rose, Luigi, Gogó da Ema, Marrocos, Stardust, Jane,
eram casas com shows internacionais.
Era fã de Silvio Caldas, o "se-resteiro do Brasil", que levava para serestas que atravessavam a noite de fleumática e comportada Curitiba.
Ao mesmo tempo, ele era o grande empreendedor da vida social, setor clubístico, presidente do velho Clube Curitibano (ali na Barão, onde depois foi a Rádio Guairacá e hoje é das lojas HM), ele conseguiu construir a gigantesca e luxuosa sede do clube, na esquina da Barão com a Rua XV. Eram os anos dourados, do baile das debudantes com Jofre de casaca, e dos reveillons inesquecíveis com chafarizes de champanha.
Homem requintadíssimo, era das raras pessoas que podiam usar polainas, colete, gravata borboleta e bengala, sem que isso parecesse ridículo ou afetado.
E essa noite, Jofre me segredava em parte o que seria seu próximo empreendimento: o Santa Mônica Clube de Campo, que ele tornaria realidade no início dos anos 60. Assim como realizou tudo que almejou.
Decididamente, naquela época éramos todos felizes.
E sabíamos disso.

Dino Almeida foi jornalista, colunista da Gazeta do Povo, Diário Popular; TV-Canal 12 e Rádio Scala.

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