Curitiba em 1954: Casamentos, Anúncios e Arquitetura — Um Retrato da Sociedade Paranaense
Curitiba em 1954: Casamentos, Anúncios e Arquitetura — Um Retrato da Sociedade Paranaense
O ano de 1954 foi marcante para Curitiba. A cidade vivia um período de crescimento econômico, urbanização acelerada e consolidação de uma elite social que se expressava publicamente através de casamentos grandiosos, anúncios de produtos modernos e projetos arquitetônicos inovadores. Este documento, extraído de um suplemento social ou jornalístico local da época, oferece uma janela única para entender os valores, hábitos e aspirações da sociedade curitibana na metade do século XX.
As páginas aqui analisadas registram três casamentos importantes, anúncios de serviços financeiros e imobiliários, além de um projeto arquitetônico emblemático — o Edifício Santa Inês. Cada detalhe, desde a tipografia até a descrição dos trajes das noivas, revela uma sociedade em transformação, que ainda mantinha fortes laços com a tradição, mas já olhava para o futuro com otimismo e consumo.
A seguir, apresentamos uma análise completa e minuciosa de cada página, descrevendo todos os elementos visuais, textuais e contextuais, com o rigor histórico exigido pelo ano de 1954.
Página 1: O Enlace Tobeirda Ribeiro - Curu
Cabeçalho:
- Em fonte cursiva e tamanho maior, no canto superior direito, lê-se: “Enlace”.
- Abaixo, em negrito e centralizado: “Tobeirda Ribeiro - Curu”.
Imagem Principal:
- Fotografia em preto e branco, no canto superior esquerdo, retrata a noiva, Tobeirda Ribeiro, usando véu e vestido de casamento, ao lado do noivo, Curu (nome incompleto, provavelmente abreviação de um sobrenome ou nome próprio).
- Ambos estão sorrindo e parecem estar em um ambiente interno, possivelmente durante a cerimônia ou recepção.
Texto à direita da imagem:
“No dia 27 de março, a sociedade curitibana participou de grande acontecimento, que foi a realização do enlace matrimonial da srta. Tobeirda Ribeiro, filha do dr. Durval de Araújo Ribeiro e de sua exma. esposa, sra. Maria de Ces Tobeirda Ribeiro, figura de destaque em nosso meio social, com o sr. de José Curu, filho da exma. sra. viúva Antônio Curu.”
Texto inferior:
“O ato civil teve lugar às 15,30 daquele dia, na residência dos pais da noiva, à Praça Santos Andrade, 65, onde celebraram as honras a sra. Maria Ribeiro, o sr. e sra. de Araújo Ribeiro, e o sr. e sra. de Almeida Ribeiro, e de José, a sra. Maria Madalena Tobeirda Ribeiro, e a srta. Marília Curu, e os srs. de Manuel de Oliveira Franco e José Nacir Curu.”
Texto à esquerda da imagem:
“À bonita cerimônia religiosa foi realizada às 15,30, na Catedral Metropolitana, tendo como padroeiros os noivos os srs. Aristeu Campos, Nair Cunha, Michel Sullin e Dr. Orlando Borges.”
Texto inferior central:
“Na sede campestre do Clube Curitibano, após a benção nupcial, amigos e parentes das famílias Tobeirda, Ribeiro e Curu, foram distinguidos com agradável recepção.”
Observação: O casamento reúne duas famílias tradicionais da sociedade curitibana. A menção ao Clube Curitibano indica o status social dos noivos, pois o clube era um dos principais espaços de convívio da elite da cidade. A repetição de “exma.” (excelentíssima) e o uso de fórmulas de cortesia são típicos da linguagem social da época.
Página 2: Anúncios e Informações — INCO e Pessoal
Esta página contém dois anúncios principais e uma seção informativa.
Bloco Superior Esquerdo: Anúncio da “INCO”
- Imagem: Desenho de um caminhão com a marca “INCO” na lateral, estilizado, com rodas grandes e cabine simples.
- Texto abaixo da imagem:
“NÃO ESPERE UM ANO DE ‘BOM’” “O INCO oferece aos seus clientes a melhor solução para o transporte de cargas pesadas e volumosas, com segurança e rapidez. Solicite-nos um orçamento sem compromisso.”
Bloco Central Direito: “Abre uma conta no INCO — pessoal”
- Ilustração: Desenho de um homem sentado à mesa, assinando um documento, enquanto uma mulher observa.
- Texto principal:
“INCO — pessoal” “SANTO INDUSTRIA E COMERCIO DE SANTA CATARINA S.A.” “CAPITAL E RESERVAS: CR$ 40.000.000,00” “DEPOSITOS EM 31-8-52: CR$ 463.000.000,00”
Detalhes do formulário:
- Um recorte de formulário bancário com campos preenchidos:
“Sr. Carlos Valente de Oliveira” “Endereço: Rua XV de Novembro, 1234” “Conta Corrente nº 4222” “Saldo: Cr$ 12.000,00”
Legenda abaixo do formulário:
“É interessante saber...” “Os depósitos superam os passivos — isso porque os depósitos são maiores que os empréstimos. A Dinamarca, em 1952, foi o primeiro país do mundo a adotar o sistema de depósitos em caixa de colchão.” “O balancete do Banco Industrial e Comercial do Estado de Santa Catarina, em 1952, mostrou que os depósitos eram maiores que os empréstimos, o que garante a solidez financeira da instituição.” “As cooperativas de crédito são importantes para o desenvolvimento econômico, pois permitem que pequenos produtores tenham acesso a recursos financeiros.”
Bloco Inferior Esquerdo: “O QUE É A VIDA?”
- Título em negrito: “O QUE É A VIDA?”
- Texto:
“Dizem que a vida é um sonho, mas a vida é real. A vida é um presente que Deus nos deu, e devemos aproveitá-la ao máximo. Não adianta viver apenas para o amanhã, pois o hoje é o único momento que temos. Viva intensamente, ame profundamente, trabalhe com dedicação, e deixe um legado de bondade e justiça para as próximas gerações.”
Contexto histórico: Os anúncios refletem a expansão do setor financeiro e logístico no Brasil pós-guerra. O INCO (Indústria e Comércio de Santa Catarina) parece ser uma instituição financeira ou cooperativa de crédito, com forte presença em Curitiba e região. O texto “O que é a vida?” é um exemplo de conteúdo edificante, comum em publicações da época, que buscavam orientar moralmente o leitor.
Página 3: O Enlace Simões Beltrão - Melente
Cabeçalho:
- Em fonte cursiva e tamanho maior, no canto superior esquerdo, lê-se: “Enlace”.
- Abaixo, em negrito e centralizado: “Simões Beltrão - Melente”.
Texto à esquerda:
“Constituiu acontecimento de mais grata repercussão em nossa sociedade a realização, no dia 27 de maio, do enlace matrimonial da srta. Irene Simões Beltrão, filha do dr. Eulício J. de Beltrão, ilustre doutor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Paraná, e de sua exma. esposa, sra. Abigail Simões Beltrão, e o sr. e sra. de Luiz Melente, residente em Londrina, e da sra. Vitória Melente.”
Texto à direita:
“O ato civil do enlace Simões Beltrão-Melente teve lugar às 10,30 horas daquele dia, na residência dos pais da noiva, à Avenida 7 de Setembro, 4416, com o comparecimento de parentes, parentes e amigos íntimos das famílias Simões, Beltrão e Melente.”
Texto inferior:
“Às 11,30 horas, procedeu pela igreja ‘dormitória’ de Santa Teresinha, que forma a graciosa Edna Maria Foster, e a sra. Lúcia Beltrão, filha do casal de Francisco Beltrão, e Leona Beltrão Pontes, filha da exma. sra. Leona Beltrão Pontes — seguindo-se uma missa em celebração ao evento. A noiva trajava elegante vestido de seu proprietário.”
Texto à direita da imagem inferior:
“Após a benção nupcial concedida aos noivos, realizou-se na sede campestre do Clube Curitibano, onde foram festivamente recepcionados, e onde o dr. Eulício José Melente e a srta. Ione Rosa Branco Beltrão Melente receberam incontáveis abraços e votos de felicidade.”
Imagem inferior esquerda:
- Fotografia em preto e branco, mostrando o casal noivo em um ambiente interno, possivelmente durante a cerimônia religiosa. A noiva está de costas, com véu e vestido longo, enquanto o noivo, em terno escuro, está ao seu lado.
Imagem inferior direita:
- Fotografia em preto e branco, mostrando o casal noivo em um ambiente externo, possivelmente durante a recepção. A noiva está sorrindo, com véu e buquê, enquanto o noivo, em terno escuro, está ao seu lado.
Observação: O casamento une duas famílias de destaque — os Beltrão, ligados à academia (Faculdade de Engenharia), e os Melente, com raízes em Londrina. A menção à “igreja ‘dormitória’ de Santa Teresinha” é curiosa e pode ser um erro de digitação ou impressão; provavelmente, refere-se à Igreja de Santa Teresinha. A recepção no Clube Curitibano reforça o status social dos noivos.
Página 4: O Enlace Rodbar Glaser - Amaral Gutierrez
Cabeçalho:
- Em fonte cursiva e tamanho maior, no canto superior esquerdo, lê-se: “enlace”.
- Abaixo, em negrito e centralizado: “Rodbar Glaser - Amaral Gutierrez”.
Texto à esquerda:
“Foi acontecimento de mais grata repercussão, no seio da melhor sociedade curitibana, a realização no dia 10 de junho, do enlace matrimonial da srta. Lydian Daisy Rodbar Glaser com o dr. Vitor do Amaral Gutierrez. A noiva, filha do casal Lydia Rodbar Glaser-Carlos Glaser — que naquele mesmo dia comemorou a passagem de suas ‘Bodas de Prata’ —, e o noivo, filho do dr. Alexandre Gutierrez e de sua exma. esposa, sra. Noêmia do Amaral Gutierrez.”
Texto à direita:
“No ato civil, que foi realizado na residência do casal Carlos Glaser, foram testemunhas da noiva o sr. e a sra. Alexandre Gutierrez e o sr. e a sra. Wenceslau Glaser; e do noivo, o casal Gilda Itiberê da Cunha-Manoel Henrique Itiberê da Cunha, a exma. sra. Isabel Braga e o dr. Alarico Vieira de Alencar.”
Texto inferior:
“A cerimônia religiosa, na Igreja de Santa Teresinha, teve como padrinhos da noiva o sr. e a sra. dr. Bento Munhoz da Rocha Neto, a sra. Ione Maria Camargo Rêgo e o sr. Carlos Glaser Junior; e do noivo, os casais Lydia Rodbar Glaser-Carlos Glaser e Lourdes Marcelo Valente-Luiz Gurgel do Amaral Valente.”
Texto inferior direito:
“Após as cerimônias, os inúmeros convidados das famílias em festa compareceram à sede campestre do Clube Curitibano, onde participaram de magnífica e distinta recepção, e tiveram oportunidade de, mais uma vez, apresentar votos de felicidade ao casal Carlos Glaser e aos noivos.”
Imagem superior direita:
- Fotografia em preto e branco, mostrando o casal noivo em um ambiente interno, possivelmente durante a cerimônia religiosa. A noiva está de costas, com véu e vestido longo, enquanto o noivo, em terno escuro, está ao seu lado.
Imagem inferior esquerda:
- Fotografia em preto e branco, mostrando o casal noivo em um ambiente interno, possivelmente durante a cerimônia civil. A noiva está sorrindo, com véu e buquê, enquanto o noivo, em terno escuro, está ao seu lado.
Observação: O casamento é especialmente significativo porque coincide com as “Bodas de Prata” dos pais da noiva, o que adiciona um caráter familiar e emocional ao evento. A participação de múltiplos padrinhos e testemunhas, bem como a recepção no Clube Curitibano, reforça o prestígio social do casal.
Página 5: Edifício Santa Inês — O Condomínio Moderno de Curitiba
Esta página é dedicada ao lançamento do Edifício Santa Inês, um projeto arquitetônico emblemático da época.
Cabeçalho:
- Em fonte cursiva e tamanho maior, no canto superior esquerdo, lê-se: “EDIFÍCIO SANTA INÊS”.
- Abaixo, em negrito e centralizado: “CONDOMÍNIO”.
Imagem principal:
- Ilustração em preto e branco, mostrando o edifício Santa Inês, um prédio alto e moderno, com múltiplos andares e varandas. O edifício é retratado em perspectiva, com ruas e outros prédios ao fundo, sugerindo sua integração urbana.
Texto à direita da imagem:
“Irmãos Thá & Cia. Ltda. — A Tradição no Ramo de Construções em Geral em Nossa Terra — congratulando-se com o público de Curitiba pelo sucesso alcançado com os seus dois esplêndidos condomínios — Edifício ‘Santa Inês’.”
Texto inferior:
“Instalações sanitárias independentes e tendo de altura 3,20 m de pé-direito, de forma a comportarem galerias e instalações modernas. De Segundo (1º andar) ao Décimo Primeiro pavimento (10º andar) distribuem-se, quatro delles por andar, 49 (quarenta e nove) apartamentos inteiramente divididos, sendo dois de frente e dois de fundos, cada departamento composto de 2 dormitórios, 1 ampla sala, 1 banheiro com W.C. e lavatório e cozinha com pia e terrapleno de serviço com tanque. São, portanto, Apartamentos ideais para pequenas famílias de tratamento.”
Texto inferior esquerdo:
“No interior superior do edifício serão instaladas a Casa de Máquinas, Caixa d’água e Casa de Zelador. Os Apartamentos serão vendidos nas seguintes condições: Cr$ 220.000,00 os de fundos, situados no 2º, 4º, 6º, 7º, 8º e 9º andares; Cr$ 250.000,00 os de frente, nos mesmos andares; Cr$ 231.000,00 e Cr$ 262.500,00, respectivamente, os de fundo e frente, no 4º e no 10º andares; Cr$ 242.000,00 e Cr$ 275.000,00, os de fundo e frente, respectivamente, do 2º andar; Cr$ 253.000,00 e Cr$ 287.500,00, os de fundo e de frente, do 2º andar; e Cr$ 264.000,00 os ... (continua na pág. 30)”
Imagem inferior:
- Planta baixa do edifício, mostrando a distribuição dos apartamentos por andar. As letras A, B, C, D, E, F indicam os diferentes tipos de apartamentos, com legendas explicativas.
Observação: O Edifício Santa Inês representa a modernização urbana de Curitiba em 1954. A construção de condomínios com apartamentos individuais, com instalações sanitárias próprias e varandas, era um símbolo de progresso e status. O preço dos apartamentos (Cr$ 220.000,00 a Cr$ 287.500,00) reflete o custo de vida da época, considerando que o salário mínimo em 1954 era de cerca de Cr$ 2.000,00.
Conclusão
As páginas analisadas oferecem um retrato rico e multifacetado da Curitiba de 1954. Elas capturam:
- A vida social elitista, centrada em casamentos entre famílias de renome, com descrições minuciosas dos trajes, locais e convidados.
- O avanço econômico e financeiro, representado pelos anúncios do INCO e da indústria de construção.
- A modernização urbana, simbolizada pelo Edifício Santa Inês, um projeto arquitetônico inovador para a época.
- A estética da imprensa social, com tipografias variadas, ilustrações delicadas e uma linguagem formal que valoriza o protocolo e o status.
Juntas, essas páginas não são apenas registros de eventos, mas documentos históricos que nos permitem compreender os valores, aspirações e contradições da sociedade paranaense na metade do século XX. Elas nos lembram que, mesmo em um tempo tão distante, as preocupações com o amor, o status, o progresso e a beleza eram tão presentes quanto hoje.
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