terça-feira, 3 de janeiro de 2023

PALÁCIO DA LIBERDADE

 

PALÁCIO DA LIBERDADE




Projetado pelo engenheiro Ernesto Guaita inicialmente como residência de Leopoldo Ignácio Weiss, esse edifício situado na Rua Barão do Rio Branco, 399, foi construído entre 1870 e 1890. Uma vez finalizado, foi adquirido pela Fazenda Nacional por quarenta contos de réis e transferido para o governo do estado em 1891, tornando sede do governo do estado, quando passou a ser denominado Palácio da Liberdade (na época em que a Barão chamava-se Rua da Liberdade).
O prédio destacou-se na época de sua construção por sua composição elaborada e luxuosa, nada comum nas edificações da época. Foi sede do governo do estado por 45 anos até 1937, quando outra residência, da Família Garmatter (atual Museu Paranaesnse), no Alto do São Francisco, passou a ser a sede do poder estadual. Em seguida o prédio foi ocupado pela Chefatura de Polícia, pela Secretaria do Interior e Justiça. Em 1989, passou a abrigar o Museu da Imagem e do Som.

DENTRO DO PALÁCIO SÃO FRANCISCO

 

DENTRO DO PALÁCIO SÃO FRANCISCO






Projetado e construído em 1928 pelo engenheiro Eduardo Fernando Chaves para ser a residência da Família de Julio Garmatter (empresário e pecuarista), o Palácio São Francisco foi vendido ao governo do estado por solicitação do interventor Manoel Ribas (amigo de Julio Garmatter) para sediar o governo, uma vez que o Palácio da Liberdade já era pequeno para esse fim. Considerado na época ideal para ser a sede do governo por localizar-se num ponto alto e de destaque e também, por suas linhas austeras e geométricas, distanciando da então considerada excessiva ornamentação do ecletismo. Foi sede do governo estadual até 1954 (quando foi inaugurado o Palácio do Iguaçu). Foi então sede do TRE até 1987, quando restaurado foi destinado ao Museu de Arte do Paraná e em 2002 ao Museu Paranense.
Nessa minha última visita do Museu Paranaense, fui em busca do livro (fonte para o texto de hoje) "Edifícios Públicos de Curitiba - Ecletismo e Modernismo na Arquitetura Oficial" de Elizabeth Amorim de Castro e da exposição. Mais um livro excepcional para conhecer a história de Curitiba através de sua arquitetura, nesse caso, de edifícios públicos.
Para minha grata satisfação, dessa vez as fotografias internas eram permitidas (sem flash) e pude fazer alguns registros do belíssimo interior desse museu tão importante para a história do Paraná.

CASA DE GOVERNADORES NA PRAÇA OSÓRIO

 

CASA DE GOVERNADORES NA PRAÇA OSÓRIO




Interessante morar tanto tempo num lugar e não notar certas coisas. Não me recordo como eu via essa fantástica casa que fica de frente para a Praça Osório (na esquina com a Travessa Jesuíno Marcondes), mas certamente ela deveria estar num estado em que não chamada a atenção, seja por estar escondida por placas, ou escondida pelos maus tratos, ou por uma pintura que não valorizava seus detalhes.
Muito recentemente observei a casa estava restaurada e que um restaurante estava instalado nessa casa e fui buscar informações sobre ela. Liguei para o número da placa e falei com a Sra. Nelbe (que empresta seu nome ao restaurante). Ela muito gentilmente me informou que a casa fora construída por Affonso Alves de Camargo (deputado estadual, federal, senador e governador do estado nos perídos de 1916-1920 e de 1928 a 1930) e nela mais tarde, moraria seu genro, Bento Munhoz da Rocha Netto (governador do Paraná de 1951 a 1954). Trata-se portanto de uma casa histórica e que agora restaurada, mostra toda a sua beleza.

ANTIGO GIMNÁSIO PARANAENSE

 

ANTIGO GIMNÁSIO PARANAENSE





Em 31 de março de 1846 a Assembléia Providencial de São Paulo aprovou a criação do Lyceu de Curitiba. Alguns anos mais tarde, com a emancipação do Paraná, passou a chamar-se Instituto Paranaense, e após a Proclamação da República, recebeu a denominação Gymnasio Paranaense. Em 1903, o governo estadual decidiu construir um edifício para abrigar não só o ginásio como também a escola normal.
“Cogita o governo de mandar construir outro prédio de proporções que satisfaçam as exigências do futuro e com todas as condições que satisfaçam as exigências do futuro e com todas as condições de comodidade e higiene, destinado ao funcionamento do Gymnásio Paranaense e da Escola Normal, e para isso já dispõe dos recursos necessários”.
Coube o projeto ao engenheiro Afonso Teixeira de Freitas e a construção a José Bienek, tendo a mesma sido concluída em agosto do ano seguinte. O grande desenvolvimento vivido pela cidade, na primeira metade do século, e as modificações do ensino motivaram a construção de novo edifício, para o qual foi transferido o antigo liceu, que desde 1953 passara a ser denominado Colégio Estadual do Paraná. Modificado, para atender um uso administrativo, torna-se em 1965 sede da secretaria do Estado da Educação e Cultura, passando, nove anos depois, a abrigar a Diretoria de Assuntos Culturais.
Exemplifica, o antigo ginásio, o ecletismo de vocabulário neoclássico: composição simétrica, monumentalidade através do destaque de um corpo central, colunas greco-romanas e platibanda vazada no coroamento das fachadas.
O prédio é sublinhado pelo torreão central, destacando, em planta, ao avançar em relação ao conjunto, e em elevação, ao sobrepor-se à massa do edifício. A composição dos vãos obedece a duas diretrizes: no térreo, retangulares; no andar superior, arrematados em arco pleno. Colunas de capitel ladeiam os vãos do andar superior. Vale mencionar, internamente, o espaço central, de duplo pé-direito, coberto por clarabóia que cumpre o papel de área de circulação e distribuição, abrindo para ele as salas, dispostas à sua volta. No andar superior a circulação é feita por uma passarela, que sustentada por colunas de ferro desenvolve-se à volta do vazio desta área. São também metálicos o guarda-corpo dessa circulação e a armação da clarabóia. As paredes são de alvenaria de tijolo, possuindo as externas revestimento à bossagem, que confere ao edifício uma austeridade peculiar aos edifícios públicos da época. Fica na Rua Ébano Pereira, 240.
O predio foi tombado pela Coordenadoria do Partimônio Cultural do Governo do Paraná em 20/06/1977.
Fonte: http://www.patrimoniocultural.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=208

CASA EMILIO ROMANI

 

CASA EMILIO ROMANI



O sobrado rosa situado na Praça Eufrásio Correia, conhecido outrora como Praça da Estação, foi edificado na época da transformação da cidade pela chegada dos imigrantes de origem, alemã, polonesa e italiana. Dentre as conseqüências culturais que trouxeram a região, incluem-se as mudanças que trouxeram na arquitetura local. Referencia à influência do construtor de origem italiana, a casa tem à frente uma galeria porticada de seis arcos, encimada por terraço. A cobertura, em quatro águas, é oculta por platibanda, adornada com jarros e pequenos modilhões. Os vãos de portas e janelas são arcos de plena volta, guarnecidos por bandeiras envidraçadas, alguns de desenhos raiados e outros estrelados Complementa o vocabulário neoclássico a simetria da solução arquitetônica, evidenciada pela acentuação, no centro da fachada, do vão de entrada, arrematado por um arco de maior diâmetro.
Foi residência, escritório e armazém, sede da Companhia Francesa de Estrada de Ferro, instalação militar, clube esportivo e social.
Comprada em 1911 pelo ítalo-curitibano Emílio Romani, sediou a Companhia Força e Luz e o escritório da firma do proprietário dos produtos Diana em Curitiba, a Romani S/A – Industria e Comércio de Sal, fundada em 28/05/1960. Sediou ainda a PROMOPAR que mais tarde viria a se tornar a FAS.
Encontrei um artigo de Aramis Millarch publicado em 29/05/1987, no qual ele conta com mais detalhes diversas histórias desse prédio e da família Romani. No artigo ele chama a Casa Emilio Romani de “Casa dos Arcos”, denominação que perdeu-se no tempo, provavelmente para não confundir com a Casa dos Arcos de Santa Felicidade. Ele levanta a intenção de se instalar ali o MIS (Museu da Imagem e do Som), que segundo Millarch, estava precariamente instalado na Rua Martin Afonso. O MIS não foi para a Casa Emilio Romani e hoje encontra-se precariamente instalado no Palácio da Liberdade na Barão do Rio Branco.
A Casa Emilio Romani fica na Praça Eufrásio Correia N.º 498 e foi tombado pelo Patrimônio Histórico do Estado em 06 de março de 1.978.

RESTAURANTE KAMIKAZE

 

RESTAURANTE KAMIKAZE



Kami significa "deus" e kaze, "vento", portanto Kamikaze (vento de Deus) é uma palavra japonesa que em 1274 deu nome a um tufão, que salvou o Japão de ser invadido por uma frota liderada por Kublai Khan, conquistador do Império Mongol, que se tivesse logrado êxito teria descaracterizado a nação japonesa como a conhecemos. O termo é portanto muito mais importante para o Japão e tem um significado muito maior do que os soldados suicidas da segunda grande guerra.
A escolha do nome do restaurante pelo seu proprietário, Ezaki Kazuma, levou em conta o significado acima e também um motivo muito mais simples. Na época em que estabeleceu seu restaurante em Santa Felicidade há 35 anos atrás, os japoneses e os chineses eram confundidos pelos brasileiros e a escolha do nome serviu para marcar a nacionalidade de Ezaki-san, pois o termo Kamikaze existe apenas na língua japonesa.
O modismo pela comida japonesa promoveu uma verdadeira invasão de restaurantes desse gênero em Curitiba e com o objetivo de adaptar-se ao gosto brasileiro, muitas variações ou interpretações foram introduzidas no cardápio, inclusive o sistema de rodízio, antes restrito à pizzarias e churrascarias. Imune aos modismos, o Kamikaze se mantém fiel à sua tradição, sendo portanto simples e único em Curitiba. Considero um certo alivio existir um restaurante, onde você corre um sério risco de sair corrido de lá se pedir por um rodízio de sushi e sashimi.
Interessante ligar e fazer reserva (mesmo que chegue ao local e não tenha outros clientes), pois o processo todo de preparo do prato principal, leva pelo menos uma hora e como apenas Ezaki-san ou seu filho fazem a comida, num esquema de dedicação exclusiva ao cliente, você pode ficar esperando bastante. Apenas fique preparado para, ao ligar para fazer reserva, ouvir perguntas como: “você conhece o sistema da casa?” ou então um comentário do tipo: “se quer comer como nos outros (restaurantes japoneses), não é aqui”.
O cardápio não poderia ser mais enxuto. Apenas duas entradas: tempura de camarão e legumes ou sashimi. Como prato principal o carro chefe da casa é o excelente teppanyaki (que pode ser traduzido como grelhado na chapa), preparado na frente do cliente numa chapa enorme que faz parte da mesa. Os teppans podem ser de mignon, camarão, frango, peixe ou lula. Se no cardápio algo estiver riscado, significa que não está disponível naquele dia, pois a casa oferece apenas o que estiver fresco. A única outra alternativa é o sukiyaki, mas como esse depende da casa ter todos os ingredientes indispensáveis, convém na hora da reserva perguntar se naquele dia será possível.
Depois de 20 anos em Santa Felicidade, o Kamikaze está na Vila Izabel há outros 15 anos, na Rua Bororós. Apenas três pessoas trabalham no restaurante, o Sr. Kazuma Ezaki, sua esposa e seu filho. Apesar da fama de mal humorado, se você respeitar a casa e as opiniões (e ele sempre tem uma) de Ezaki-san, ele será muito receptivo. Então se quer variar da mesmice dos outros restaurantes japoneses, experimente a cozinha do Kamikaze, que segundo Ezaki-San no Brasil somente ele e outro restaurante em São Paulo fazem.

Histórias de Curitiba - Fora de sintonia

 

Histórias de Curitiba - Fora de sintonia

Fora de sintonia
José Borba Filho

Esta é uma história do tempo do cinema mudo.
Os filmes, como todo mundo sabe, eram em preto e branco, com legendas em português. O Cine Palácio, que era o mais popular de Curitiba, na falta de voz e som nos filmes da Teda Bara, Rodolfo Valentino, Charlie Chaplin, Greta Garbo, Mary Pickford e outros, contratava pianistas para acompanhar as principais cenas dos filmes e para delícia da platéia antes do início do espetáculo.
Era costume, então, as pessoas ficarem de pé, de costas para o palco da tela, paquerando quem entrava. A função só começava quando o pianista chegava, recebido com uma salva de palmas.
Leonira Borba, minha cunhada, pianista formada com o professor Antônio Mellilo numa turma que teve também, entre outros alunos, Alceu Bochino, atual regente da Orquestra Sinfônica do Paraná, foi por algum tempo a pianista do Cine Palácio, a convite de seu dono.
Como todo pianista de cinema, ela selecionava o programa musical de acordo com os enredos dos filmes exibidos.
Se era filme romântico, executava a valsa Danúbio Azul ou Branca.
Se era comédia, tocava sambas variados.
Faroeste, mandava marcha rápida e rasteira.
E foi num acompanhamento musical que aconteceu o inusitado. O filme era "A Vida e Morte de Jesus Cristo", em preto e branco com legendas, filme que provocava grande comoção na platéia religiosa da época.
A pianista Leonira começou bem.
Acompanhava o filme com música clássica, de andamento leve, tons pungentos.
De repente, justo num dos momentos mais compenetrados, que mostrava Jesus sendo chicoteado a caminho do Calvário, a pianista tascou o choro sapeca "Tico Tico no Fubá", de Zequinha de Abreu.
Jesus sendo surrado e a pianista vá no
Um tico-tico cá Um tico-tico lá Um tico-tico só.
E nada da pianista parar com tico tico.
Quando se deu pelo engano do acompanhamento, Jesus já 1a morrendo na cruz.
Passou então a executar o dolorido "Barqueiros do Volga". Nada, porém desfez o mal-estar criado na platéia.
Mais tarde, a explicação da pianista: enquanto aguardava o início da sessão, algum gaiato havia trocado a partitura de cima do piano.

José Borba Filho é funcionário público federal aposentado.

Histórias de Curitiba - Um risco Branco no céu

 

Histórias de Curitiba - Um risco Branco no céu

Um risco Branco no céu
Napoleão Côrtes Neto

Era ali por 59 ou 60. Lembro que a televisão estava engatinhando em Curitiba.
Da Alameda Dona Julia da Costa (assim chamada em homenagem à pioneira da educação do Paraná), a criançada, a maioria alunos do Grupo Escolar professor Cleto, avistava os arranha-céus do centro da cidade: o Asa, em construção; o Garcez; o Comendador Vasconcelos; o Kwa-sinski; o Santa Júlia; e o Tijucas, que se destacava dos demais por ostentar, no alto dos seus vinte andares, a antena do canal 12, em forma de borboleta.
Da mesma alameda, pudemos assistir, em tempos sucessivos, lá no centro, o clarão de três incêndios, que levaram o Cine Luz, os últimos andares do Edifício João Alfredo e o Supermercado Abagge.
Era uma época em que as emissoras de TV ainda faziam programas de auditório com produção local.
Televizinho de carteirinha da Professora Irene Caruzo, cunhada do famoso apresentador Alcides Vasconcellos, animei-me à aventura de assistir ao vivo um desses programas, o do vovô Moraes, nas salas do Edifício Tijucas que faziam às vezes de auditório para o "Doze".
Na entrada, a gurizada ganhava um ingresso numerado, valendo como bilhete para sorteios.
Ganhei daquela vez o número 18. Acontece que levávamos de casa, para soltar das alturas do Tijucas, folhas de papel picado, aviões de papel, e naquele domingo meu ingresso virou avião também.
No meio do programa, saiu sorteado, para o prêmio principal - um carro de bombeiros de pedal, com sino no capô e tudo mais - exatamente o número 18! Calado, senti a perda
- a sorte e a falta de sorte...
Neste mesmo céu curitibano de trinta anos atrás vi algumas vezes, às tardes, um corpo minúsculo brilhante, que deixava no ar um risco branco de fumaça.
Era intrigante.
Os comentários:
- É um disco voador! Nãão!
- É um balão metereológico! Nãão!
- E um "Esputinique"! Nãão!
Minha avó - Dona Julieta
Gineste, na sabedoria dos seus sessenta anos, sugeriu:
- Vamos perguntar ao "Seu"Snege, pode ser que seja exercício de balística, do quartel do Bacacheri (o 20° R.I) para o quartel do Boqueirão.
A sugestão era pertinente.
Homem cordial, inteligente, amigo da gurizada, "Seu'’Snege era sargento do Exército, servindo no C.P.O.R., portador de um bigode à Clark Gable e deveria saber.
Na vizinhança, no Armazém do Tadique, consumindo as insuperáveis balas de côco, o capilé, a maria-mole, ou então à beira do macadame, na esquina da Brigadeiro Franco com a Rua do Rio (Fernando Moreira), não se falava de outra coisa.
Fato é que nem se consultou o sábio militar, nem se esclareceu o mistério do objeto voador, na ocasião.
Hoje, vemos cruzar o mesmo céu aviões bem mais evoluídos que aquele Caravelle que, rumo ao Sul, deixava um risco branco no céu de junho curitibano.

Napoleão Côrtes Neto é economista.

Histórias de Curitiba - O Carro da meia-noite

 

Histórias de Curitiba - O Carro da meia-noite

O Carro da meia-noite
Maria Cristina Lorenzzoni

A silenciosa e escura Curitiba de cem anos atrás era assustada por um misterioso "Carro da Meia-Noite", assim chamado na época.
Descrito como uma charrete com faróis de carro e puxada por cavalos sem cabeça, descia velozmente a Rua Aquidaban, hoje Emiliano Perneta, fazendo um barulho infernal de correntes, tropel de animais, badalar de cincer-ros e guizos, uivos e murmúrios altos.
Fantasmagórico, o Carro da Meia-Noite surgia do nada na altura da pracinha do Batel, e de forma igualmente misteriosa desaparecia nas proximidades da Praça Zacarias.
Arrastava as correntes e era cercado por chamas de fogo fátuo.
Diziam, levava almas penadas de pessoas más em vida que, não conseguindo o descanso eterno, vinham assombrar os vivos e levar os incautos.
Insensato aquele que ousasse estar na rua à meia-noite, hora de passagem do carro fantasma: seria sugado pela ventania que levantava à sua passagem e não mais retornava.
Os moradores da Aquidaban e adjacências, sabendo que seriam sobressaltados todas as noites pelo dito espécime ectoplas-ma, por ansiedade ou medo procuravam deixar bem fechadas e trancadas as janelas e portas de suas casas.
Aconchegada ao calor de um fogão a lenha, ouvia minha vó contar essa história; e ela garantia, com toda seriedade de avó: quando moça, teria visto com seus próprios olhos o esplendoroso carro fantasma, ao longe, clareando a noite com sua luz de fogo; estava ela com seus pais e irmãos, e mal tiveram tempo de fechar a porta da residência localizada na Rua Aquidaban, na quadra entre as atuais Viscondes; a assombração passava incrivelmente rápida.
Explicação plausível para tal viagem não existia. E bem possível que tenha surgido como um socorro aos pais para disciplinarem os filhos quanto à hora de dormir e ao silêncio (detalhes esses bastante respeitados naqueles tempos), ou, então, pode ser resultado de crendice de fundo religioso, como que a mostrar porque devem ser "boas"as almas.
Qualquer que tenha sido sua origem, o fato é que o "Carro da Meia-Noite"passeou por muito tempo pelo imaginário popular do curitibano.
Com o passar dos anos, a modernidade chegando, a história do iluminado e barulhento carro fantasma da meia-noite foi sendo esquecida, o medo do escuro vencido por mais quantidade e qualidade de luz.

Maria Cristina Lorenzzoni é dona-de-casa.

Histórias de Curitiba - Fila boba

 

Histórias de Curitiba - Fila boba

Fila boba
Sérgio Luiz Chautard

Meados dos anos 40. Fim da II Guerra Mundial, fim da ditadura getulista.
Novos tempos, novos ares, e nós garotos de calças curtas conquistávamos lugares, através do "exame de admissão'1, no Colégio Estadual do Paraná, na Rua Ébano Pereira, em frente à Praça Santos Dumont, onde hoje se abriga a Secretaria da Cultura.
Saídos dos grupos escolares onde ficávamos fechados por quatro horas, vibramos com aquela movimentação de sala em sala.
Mudança de professor e, sobretudo, com a falta dos professores, o que nos liberava para aventurar pelas adjacências do ginásio.
A porta dos fundos da vizinha sinagoga era o ponto preferido daqueles que já tinham aprendido a fumar. Lá colocavam boa distância para com o inspetor, o saudoso Mandrane.
Foi neste tempo que os donos de cinema em Curitiba não só resolveram subir o preço dos ingressos mas também acabar com a "meia entrada"que favorecia estudantes e soldados sem graduação.
Os estudantes, organizados em seus grêmios e diretórios, promoveram grandes protestos na cidade, pois Curitiba pouco nada oferecia em divertimento. O Teatro Guaíra estava fechado há anos, a Biblioteca Estadual também, e assim as matinês dominicais se constituíam no esperado lazer de fim de semana.
Com a permanente crise financeira do país, era impossível arrancar dos pais o aumento pretendido pelos cinemas.
Nas assembléias de estudantes foi proposto o famoso piquete para impedir o público de entrar.
Mas tal atitude, além de antipática, certamente concorreria para a polícia quebrar algumas cabeças.
Uma vez que para entrar no cinema tinha que compra bilhete, a solução foi mandar os estudantes para as filas nas bilheterias.
A gurizada formava a "fila boba", sendo que cada um que chegava na bilheteria ficava regateando o preço pelo maior tempo possível, não comprava ingresso e passava para o seguinte, devendo, incontinenti, voltar ao fim da fila.
Os que realmente queriam comprar a entrada desistiam pela demora.
Foi um grande piquete, que obrigou os exibidores a voltar atrás e manter a "meia entrada" para os estudantes.
Recentemente, os cinemas voltaram a acabar com a "meia entrada" e não vimos nenhum movimento contra.
Estamos mais ricos, sobram opções de divertimento ou a gurizada não tem mais fibra?

Sérgio Luiz Chautard é técnico industrial, professor e sindicalista.