terça-feira, 27 de dezembro de 2022

Histórias de Curitiba - A Praça do 9o

 

Histórias de Curitiba - A Praça do 9o

A Praça do 9o
Maria Rosa Cartaxo Moura

O som tonitroante da explosão era ensurdecedor.
Estáticos, com o coração em disparada e a respiração acelerada pela comoção, víamos os canhões cuspirem fogo e fumaça. 1; 2; 3......21
salvas contadas, homenageavam eventos nacionais importantes.
Morar na circunvizinhança da praça do 9o Batalhão de Cavalaria constituía para nós, crianças, um espetáculo excitante e movimentado, encenado por jovens soldados recrutas, por instrutores superiores que o exercitavam e os treinavam a montar e atirar.
Os canhões eram tracionados por cavalos robustos e bem tratados.
A Praça do 9o (Praça Osvaldo Cruz), pelos idos de 1940, era um quadrilátero recoberto de capim nativo, apenas. À medida em que o tempo transcorria, a praça ganhava nova nomenclatura: 3o R.A.M. (Regimento de Artilharia Montada), C.PO.R. (Centro de Preparação de Oficiais da Reserva), e também um renovado visual: grama plantada, sebe de vegetação que a delineava, calçada, campo de futebol, barras para ginástica, quadras de areia para saltos com vara, distância e altura e, mais tarde, piscina e Centro de Desportos.
As crianças da Praça do 9o cresceram familiarizados com botas, uniformes, quepes e armas.
Medo, não tínhamos.
Ao contrário sentíamos orgulho cívico e segurança.
Empolgava-nos oruflardos tambores, o som da cometa solitária que soava em determinadas horas do dia, os cantos patrióticos e as marchas cadencia-das que eram comandadas por vozes fortes que gritavam ordens.
Vez por outra o cassino dos oficiais abria seu salão e o baile acontecia.
Os vestidos longos das esposas e a gala da farda, embe-vecíam-nos.
Certa vez, observávamos, com respeito e alguma distância, a solenidade do sentinela posicionando, imóvel, com arma ao ombro, quando um oficial, amavelmente, convidou-nos a conhecer o interior do quartel .
A sensação de transpor os umbrais de um outro mundo, ao cruzarmos o pesado portão de duas enormes folhas, arrebatou-nos.
Apreciamos o grande pátio calçado com paralelepípedos de pedra e sensibilizou-nos conhecer de perto, o "marido militar" de nossa "pinheira". Do magestoso e copado pinheiro do quartel, vinha o pólem através do vento, pássaros ou insetos, que fertilizava o pinheiro situado em nosso jardim.
Os frutos, carnudos e gostosos pinhões, todos os anos, forravam o gramado.
Hoje o quartel está desativado e vendido para um grupo empresarial que fará dele um grande shopping, preservando, certamente, suas linhas, estilo e história.
A Praça que era para militar, civilizou-se.
Entretanto, é curioso recordar o tempo em que o solícito soldado, batendo de casa em casa, recomendava: "abram as janelas que os canhões vão disparar." O Impacto do deslocamento do ar poderia quebrar os vidros.
Ou lembrar, com bom hu-
mor, quando recebemos, com grande atraso uma carta assim endereçada: Ernani G. Cartaxo -Praça do 9o - Curitiba.
Meia dúzia de carimbos distribuíam-se pelo envelope dizendo "não pertence a está Companhia"!
A Praça 9o ligou-se às nossas vidas e às nossas memórias.
Atingiu-nos e fez-se ponto referencial de época e fase.
Quebrou rotina, modificou programas, provocou vibração.
Cerrando os olhos, vejo nela os cavalos, ouço seus relinchos agudos e o coral uníssono de jovens vozes que entoam o estribi-Iho compassado:
"Cavalaria, tu és na guerra a nossa estrela guia!"
Sem dúvida, lembrar os lances protagonizados na Praça do 9o, faz hoje sentir-me mais viva e mais vinculada ainda à terra querida de Curitiba.

Maria Rosa Cartaxo Moura é cronista.

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