quinta-feira, 14 de junho de 2018

Fortaleza de Nossa Senhora dos Prazeres de Paranaguá


MÍDIAS (3)

A Fortaleza de Nossa Senhora dos Prazeres de Paranaguá está localizada na praia da Fortaleza, no sopé do Morro da Baleia (hoje da Fortaleza), na Ilha do Mel, cidade de Paranaguá, no litoral do Estado do Paraná.

É construída na parte norte da ilha, na entrada da Baía de Paranaguá, e tem suas extremidades encostadas no Morro da Baleia, do qual foram retiradas as pedras utilizadas na edificação (IPHAN 10SR/PR, 2004: 5). É hoje o único exemplar da arquitetura militar do século XVIII no Paraná.

Distando 2,5 milhas marítimas do continente, a Ilha do Mel possui uma área de 27,62 km² e um perímetro de 35 Km. A Ilha é protegida pela Lei Estadual n° 56/1975, e por isso qualquer intervenção ou obra no local necessita de autorização do Governo Estadual. O acesso é feito de barcos e tem como ponto mais próximo a praia de Pontal do Sul, município de Pontal do Paraná. No entanto, embarcações também partem de Paranaguá. A trilha ou caminho da Figueira liga a fortaleza à vila de Brasília, um dos principais ancoradouros da ilha.

Os 2.760 hectares da ilha são administrados pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP) desde 1982, que controla a entrada de visitantes na estação ecológica (Parque Nacional do Superagüi). O parque foi elevado à categoria de Reserva da Biosfera e Patrimônio da Humanidade, na Conferência Mundial sobre o Meio-Ambiente, a Eco-92, realizada no Rio de Janeiro.

A Fortaleza de Nossa Senhora dos Prazeres destinava-se à defesa estratégica da antiga Vila de Paranaguá, garantindo a segurança do seu ancoradouro, 15 milhas adiante, onde era embarcado o ouro, a madeira e, mais tarde, a erva-mate extraída da região. Defendia a baía contra os piratas franceses e espanhóis que freqüentavam aquele litoral. No século anterior, para a defesa da região, o governo português havia enviado apenas duas peças: canhões do tipo roqueira (que atiram pedras) que foram instalados em uma outra ilha defronte a do Mel, que por esse motivo foi posteriormente denominada de Ilha das Peças (IPHAN 10SR/PR, 2004: 4). Só então mais tarde, a partir de 1767, com a ordem de construção da Fortaleza de Paranaguá, é que aparecem os primeiros canhões de ferro fundido para a defesa da baía.

Segundo instruções recebidas do Marquês de Pombal (1750-77), foi erguida de 1767 a 1769, por determinação do governador da Capitania de São Paulo, Capitão-general D. Luiz Antônio de Souza Botelho e Mourão - Morgado de Mateus, que encarrega de dirigir as obras ao seu irmão, o Tenente-coronel Afonso Botelho de Sampaio. Os recursos foram obtidos à custa de uma subscrição forçada, aberta desde 1765 entre os moradores da Vila de Paranaguá (SOUZA, 1885:120), que também teriam contribuído com mão-de-obra, materiais e mantimentos. Outros recursos financeiros teriam sido fornecidos pela Junta da Fazenda da Capitania de São Paulo (IPHAN 10SR/PR, 2004: 5). A inauguração deu-se em 25 de Março de 1769 (conforme SOUZA, 1885:120; ou 23 de Abril, conforme GARRIDO, 1940:137).

A Fortaleza de Nossa Senhora dos Prazeres insere-se no grupo das fortificações orgânicas, desenhada que foi adaptando-se às condições topográficas do terreno. No sopé de um morro, sua estrutura desenvolve-se em cinco lances de muralhas de alvenaria de pedra e cal com 10 metros de altura, material extraído do próprio local. Os espaços abobadados sobre o terrapleno foram utilizados como Casa da Guarnição e Prisão, tendo sido levantados os Quartéis da Tropa ao abrigo da cortina interna da muralha. O tratamento nobre em cantaria do conjunto da portada a leste, encimado por uma grande concha esculpida em um único bloco de pedra, revela a preocupação estética dos construtores. O brasão da realeza sobre o portão, um grupo de carantonhas e uma placa epigráfica completam a composição do conjunto, recuado em relação ao alinhamento das muralhas, e ladeado por guaritas nos vértices das muralhas.

A fortaleza foi construída sob a invocação de Nossa Senhora dos Prazeres, por ser a santa padroeira da “Casa de Mateus”. Havia, inclusive, no interior da fortificação, uma capela em louvor à santa, que foi demolida em 1932, por ordem do então comandante da fortaleza, devido ao seu precário estado de conservação ((IPHAN 10SR/PR, 2004: 6).

Originalmente artilhada com 6 canhões, sendo duas peças de calibre 24 libras, duas de 18 lb e duas de 12 lb, parte de sua artilharia foi remetida em 1791 (1800, cf. SOUZA, 1885:120) para a Fortaleza da Barra Grande em Santos, por ordem do conde de Sarzedas. Em 1826, devido aos ataques de corsários argentinos, foi rearmada com doze peças doscalibres 30 lb a 18 lb, para ser novamente desarmada pela Regência ao final de 1831 (SOUZA, 1885:120).

Em 31 de outubro de 1839, durante a Guerra dos Farrapos (1835-1845), rebeldes em uma escuna e um lanchão (embarcação a vapor de pequeno porte) capturaram uma embarcação nacional (sumaca) no interior da Baía de Paranaguá, mas foram repelidos pelos canhões da fortaleza. No final do século XIX, mais uma vez a fortaleza foi alvo de ofensiva militar. Durante a Revolução Federalista (1893-1895), ela foi tomada por revolucionários provenientes do Sul pelo mar ((IPHAN 10SR/PR, 2004: 9).

Mas o episódio mais marcante da história da fortaleza foi o Incident Cormorant ou Incidente de Paranaguá, quando a fortificação enfrentou o HMS Cormorant, embarcação a vapor da marinha de guerra inglesa, que invadindo águas territoriais e violando o direito de soberania brasileiro, aprisionara três (cinco cf. SOUZA, 1885:120) navios brasileiros naquele porto, sob a acusação de tráfico negreiro (1º de julho de 1850). O Cormorant, baseado no Rio da Prata, desempenhava missão de repressão ao tráfico negreiro no litoral atlântico do continente americano, sob o comando do Capitão Herbert Schomberg. Segundo o historiador Antônio Vieira dos Santos, foi a primeira vez que uma fortificação brasileira atacou uma embarcação inglesa (IPHAN 10SR/PR, 2004: 10). O então comandante da praça, Capitão Joaquim Ferreira Barbosa, auxiliado pelos poucos soldados da guarnição e por mais de duzentos moradores e tripulantes dos navios apresados, conseguiram montar dez canhões sobre paus e pedras, e dando ordem de fogo às improvisadas baterias, atingiram a fragata na proa e na caixa de rodas, obrigando-a à retirada e a reparos em alto-mar (SOUZA, 1885:120-121). Uma versão um pouco diferente daqueles acontecimentos atribui à população de Paranaguá a iniciativa do ataque aos ingleses. Um grupo de moradores, sentindo-se ofendidos com a atuação do Cormorant, e contando com o apoio de alguns militares, teria tomado a fortaleza e investido contra o Cruzador, que estava já no seu caminho de volta para a Inglaterra com as embarcações apreendidas. O comandante da fortaleza, Capitão Barbosa, tinha consciência da gravidade da situação, já que a Inglaterra era uma nação amiga. Mas ele não conseguiu impedir que os revoltosos abrissem fogo contra o navio inglês. Apesar das condições precárias da fortaleza e de seu armamento, o grupo danificou uma roda de propulsão da nau inglesa, matando um dos soldados. Ao final do episódio, as embarcações brasileiras foram afundadas. Os tripulantes do Cormorant lançaram alguns tiros que acertaram a parte rochosa do Morro da Baleia e, em seguida, tiraram a embarcação da linha de fogo da fortaleza para providenciar os consertos necessários e retornar à Inglaterra. A Coroa Inglesa exigiu reparação física e moral. O Brasil retratou-se e a questão foi encerrada. Os parnanguaras que atentaram contra o navio foram recebidos com honras pela população da cidade. O comandante da fortaleza, por não impedir a tomada da fortaleza por civis, foi rebaixado à condição de soldado de terceira categoria (IPHAN 10SR/PR, 2004: 11).

Desguarnecida no início do século XX, sediou um Batalhão de Artilharia (1905), ocasião em que foram dispendidos 10:000$000 réis para erguer um edifício para Quartel de Tropa. A antiga Caserna foi transformada em Refeitório e Cozinha. Nela se destacavam três casas, Capela e um Paiol de Munições, quando passou a aquartelar a 4ª Bateria Independente em 1909. Foram-lhe projetados melhoramentos em 1911 e, em 1913, serviu de base para uma bateria no morro da Baleia (Artilharia da Costa), de cuja guarnição passou a servir de Caserna (GARRIDO, 1940:137). No contexto da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), serviu como base militar de proteção à costa. Esta Bateria (Bateria no Morro da Baleia) ficou artilhada com quatro canhões Armstrong C-40, de 120mm, de longo alcance, que permitiam a defesa das duas entradas da Baía de Paranaguá, pelo norte e pelo sul da Ilha do Mel. Esses canhões teriam sido retirados do Cruzador Tamandaré (BARRETTO, 1958:272;274), o que embora necessitando confirmação (essa embarcação estava artilhada com dez peças de 150mm, mas com apenas duas de 120mm), pode ter ocorrido entre 1913 e 1915, quando aquela embarcação deu baixa (Aviso nº 4.525, de 27 de dezembro de 1915).

Tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) a partir de 1938, durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) aquartelou cerca de duzentos homens, tendo o seu comandante respondido a inquérito pela destruição da vegetação de caixeta na encosta do morro, e por ter aberto um portão no muro traseiro da fortaleza, sem a devida autorização. A guarnição operava um holofote, sendo posta fora de serviço em agosto de 1954 (BARRETTO, 1958:273). No entanto, a fortificação continuou contando com um pequeno destacamento militar para cuidar do edifício e do material bélico remanescente (IPHAN 10SR/PR, 2004: 13).

A primeira notícia que se tem sobre restaurações do edifício é de 1819, quando o sargento-mor de Paranaguá, Ricardo Carneiro Santos, ofereceu-se para custear uma reforma, em troca de ser nomeado comandante da fortaleza e de receber a patente de tenente–coronel e a Comenda da Ordem de Cristo (IPHAN 10SR/PR, 2004: 15).

Durante os ciclos de abandono e utilização, a fortaleza sofreu várias alterações, com demolições e acréscimos. No período final da Segunda Guerra Mundial, a cobertura original do paiol da pólvora, que era abobadada e em tijolos, foi demolida. No início do século XIX, o mesmo já havia sofrido algumas alterações, com o acréscimo de uma sala frontal com cobertura de telhas cerâmicas. As recentes restaurações buscaram reconstituir o espaço original, sem, no entanto, ocultar as intervenções sofridas. Dessa forma, foi refeita a abóbada em sua forma original, utilizando-se materiais modernos, como chapas de policarbonato e estrutura de alumínio (IPHAN 10SR/PR, 2004: 14).

Após ser desativada, a Fortaleza da Ilha do Mel, como também é conhecida, permaneceu abandonada. Tornou-se um reduto "hippie" na década de 1970, e foi palco de uma "caça ao tesouro", na década de 1980, alimentada pela lenda do Padre Thiago e pela descoberta, nas suas dependências, de um cofre contendo papéis antigos e moedas de pouco valor. Ainda em 1980 passa integrar o patrimônio da Fundação Nacional Pró-Memória, e, mais tarde, o do IPHAN, em 1990 (IPHAN 10SR/PR, 2004: 16). O imóvel da fortaleza foi restaurado entre 1985 e 1995, em parte graças a recursos do Banco Mundial, e lei federal de incentivo à cultura, e com a parceria com outras instituições, abrigando então um pequeno museu na Casa da Guarnição, e o posto local da Polícia Florestal.

Atualmente a Superintendência regional do IPHAN no Paraná voltou a administrar a fortificação e sua visitação.

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