domingo, 18 de dezembro de 2022

Histórias de Curitiba - Julinho da sapolândia

 

Histórias de Curitiba - Julinho da sapolândia

Julinho da sapolândia
Glauco Souza Lobo

Que o diabo sempre andou a solta por Curitiba nós todos sabíamos. Não conhecíamos era a sua competência.
Claro que falo do Júlio Cesar do Amaral, o Julinho Diabo, o Zé da Folia do Diário Popular.
Julinho Diabo eu conheço desde os antigos tempos dos "Embaixadores da Alegria".
Ranzinza, sai dos "Embaixadores" e funda a Escola de Samba Acadêmicos da Sapolândia", lá pros lados do Capanema e que ensaiava perto do brejo (daí o nome), onde trabalhou por vários anos, sempre soba presidência de Hedylamar, outro grande nome de nosso carnaval.
Trabalhamos juntos, Julinho e eu, na Secretaria Municipal do Turismo.
Deixara ele as lides da "Sapolândia", e do Carnaval: prensas domésticas.
Um ano, quiz o destino que lhe fosse entregue, como funcionário da Prefeitura que é, a Coordenação do Carnaval de Rua de Curitiba: feliz escolha, o Diabo estava em casa e fez a festa com o amor de quem gosta, e quem gosta faz bem!
Tudo organizado, o Julinho, tão ranzinza quanto o Nelson Santos mas infinitamente mais competente, criou alguns casos, brigou, e colocou na rua um "senhor"Carnaval. A imprensa, os jurados e as Escolas, pela primeira vez desde que a Prefeitura pôs a mão em nosso Carnaval, receberam um alentado informe com TODOS os dados dos desfiles, horários, histórico das escolas, enredos, letras dos samba-enrêdo, ou seja tudo completíssimo.
Tudo perfeito demais, dava pra desconfiar, mas, como dizem os "crentes", Carnaval é festa do Diabo e quem coordenava este era o próprio.
Os desfiles, transcorriam "na mais perfeita ordenVaté que a Escola de Samba "Leão de Ouro" entra na Avenida (no carnaval a rua Marechal Deodoro vira avenida) com atraso e uma série de problemas.
Cabe aqui um parêntesis para que se entenda o drama ocorrido: a bandeira de uma Escola de Samba é tão sagrada para os seus componentes quanto o Pavilhão Nacional o é para todos nós; há todo um ritual meio mágico em torno dela e de sua Porta-Bandei-ra, que tem até um protetor, o Mestre-Sala.
Deixar sua bandeira "cair"(perdê-la para outra escola) durante um desfile é crime que os componentes gostariam fosse punível com pena de morte. Não ter bandeira, uma hecatombe, simplesmente é não existir.
Pois entra na avenida a "Leão de Ouro"e o Julinho, nervoso com o atraso que prejudicava o desfile até então primoroso, corre em sua direção para apressá-los.
Ao chegar, dá uma parada, cambaleia, num gesto teatral (que o povo que assistia o desfile não entendeu), lhe arranca das mãos o pendão que ele graciosamente girava no seu bailado, abraçá-o apertadamente contra o peito e sentando no asfalto, chora co-piosamente. A bandeira de sua "Sapolândia"desfilava "aprisio-nada"por outra Escola de Samba em um gesto de submissão e rendição. A pior humilhação que um sambista poderia sofrer.
Os dirigentes da "Sapolândia", piorando a ocorrência, tentavam explicar que a "Leão de Ouro"havia esquecido, ou perdido, a sua bandeira e que o Marcos, novo presidente, sem tradição de sambista, cartola improvisado, "emprestara"a gloriosa...
É o sambista Julinho Diabo, Coordenador do Carnaval de Rua de Curitiba, desclassificando o "Leão de Ouro"por desfilar sem bandeira e a "Sapolândia"pela "queda"da sua, chorava: "logo a minha 'Sapolândia', no ano que eu faço o Carnaval..."
E ninguém segurou sua dor...

Glauco Souza Lobo é membro do Conselho Estadual de Cultura

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