Sigo pela Rua das Flores, em direção ao "Correio Velho".
Na esquina, duas crianças cantam música sertaneja, acompanhadas de violão descorado.
Esganiçam as vozes para emitar dupla famosa.
Histórias de Curitiba - Primeiros acordes
Primeiros acordes
Gabriel Kalinovski Filho
Sigo pela Rua das Flores, em direção ao "Correio Velho".
Na esquina, duas crianças cantam música sertaneja, acompanhadas de violão descorado.
Esganiçam as vozes para emitar dupla famosa.
Pessoas ao redor, admirando e às vezes até se emo-cioonando.
Após um quiosque, deparo com um cego tocando gaita. É uma velha sanfona com o fole remendado.
Teclas amarelecidas, mas o som ainda agradável.
Embevecido, executa a imortal "La Comparsita". Ele tem ouvintes habituais que lhe sugerem esta ou aquela composição.
Adiante, pessoas ao redor de um tipo original: chapéu, violão, folha de pessegueiro na boca a produzir sons fininhos...pé sobre pedal de geringonça que imita bateria, pandeiro e o "show"de graça para quem quiser.
Musicalidade à flor da pele, num repertório variado, aprendido de ouvido.
Na ladeira da Monsenhor Celso, um casal de deficientes canta; exageram na altura e en-rubecem para atingir as notas aguda: "Eu fiquei no Porto de Paranaguá". Depois, chamam "O Menino da Porteira". Dois clássicos populares.
Também ali curiosos fazem roda, na ponta dos pés.
Tem platéia para todos os gêneros e ritmos.
Sendo num banco da praça Santos Andrade, olho e chafariz, as flores, e no fundo majestoso Teatro Guaíra.
Recordo: estava em fase da construção quando aqui veio a Orquestra Sinfônica Brasileira, regida por Eleazar de Carvalho. O povo lotou aquelas dependências, sentando nos degraus de concreto empoeirados, entre tijolos, armações e tábuas.
Espetáculo i-nesquecível.
No programa: "Os Prelúdios", poema sinfônico de Franz Listz e um concerto para piano do mesmo autor. A solista era Joci Carvalho, mulher do maestro.
O grande público presente mal respirava, devido ao forte cheiro de cal, cimento, tijolos e materiais diversos.
Transcorria 1954.
Marcou aquela apresentação, a "bronca" que o regente deu num casal de retardatários.
Após rememorar o passado, fui ao Passeio Público.
As arapongas pareciam empostar a voz, tal o alarido que faziam.
Ninguém ao redor dos seus viveiros.
Seria desagrado pelo martelar incessante que elas emitem? Recordei Carlos Gomes: intercalou o canto dessa ave na 'Alvorada"da ópera "O Escravo", conseguindo um efeito original.
Somente ao ouvir o bi-gornear dessas aves me ocorreu que esse trecho fez parte do programa apresentado naquela noite, no então, inacabado Guaíra. Lá se vão trinta e oito anos...
Gabriel Kalinovski Filho faz parte de um grupo de escritores amadores.
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