Hercília Machado Lima e o Bungalow Sonhado: Uma História de Arquitetura, Memória e Efemeridade em Curitiba
Eduardo Fernando Chaves: Arquiteto e Construtor
Denominação inicial: Projéto de Bungalow para a Snra. Hercilia Machado Lima
Denominação atual:
Categoria (Uso): Residência
Subcategoria: Residência de Pequeno Porte
Endereço: Rua Lamenha Lins, s/n
Número de pavimentos: 2
Área do pavimento: 194,00 m²
Área Total: 194,00 m²
Técnica/Material Construtivo: Alvenaria de Tijolos
Data do Projeto Arquitetônico: 15/04/1936
Alvará de Construção: Nº 1878/1936
Descrição: Projeto Arquitetônico para construção de bangalô e Alvará de Construção.
Situação em 2012: Demolido
Imagens
1 - Projeto Arquitetônico.
2 - Detalhe dos cortes A-B e C-D.
3 - Alvará de Construção.
Referências:
1 e 2 – CHAVES, Eduardo Fernando. Projéto de Bungalow. Planta dos pavimentos térreo e superior, implantação e fachada frontal; plantas dos cortes A-B e C-D, apresentados em duas pranchas. Microfilme digitalizado.
3 - Alvará n.º 1878
1 - Projeto Arquitetônico.
2 - Detalhe dos cortes A-B e C-D.
3 - Alvará de Construção.
3 - Alvará de Construção.
Acervo: Arquivo Público Municipal de Curitiba; Prefeitura Municipal de Curitiba.
Hercília Machado Lima e o Bungalow Sonhado: Uma História de Arquitetura, Memória e Efemeridade em Curitiba
Em uma Curitiba em plena efervescência urbana — onde bondes elétricos cortavam as avenidas, a elite cafeeira investia em residências com ares europeus e a arquitetura moderna ainda engatinhava entre traços ecléticos e influências art déco —, uma mulher chamada Hercília Machado Lima decidiu deixar sua marca no tecido urbano da cidade. Não com pompa ou ostentação, mas com a quietude elegante de quem deseja um lar à sua medida. Para isso, em 15 de abril de 1936, encomendou ao arquiteto Eduardo Fernando Chaves o projeto de um bangalô residencial na Rua Lamenha Lins, s/n, no coração da capital paranaense.
Esse pedido, aparentemente simples, tornou-se um documento precioso da história arquitetônica e social de Curitiba — não apenas pelo traço do profissional que o concebeu, mas pelo testemunho silencioso de uma classe média ascendente que, na primeira metade do século XX, buscava, na arquitetura, a expressão de seu lugar no mundo.
O Arquiteto: Eduardo Fernando Chaves, Construtor da Cidade Moderna
Pouco se sabe sobre a biografia completa de Eduardo Fernando Chaves, mas seu nome aparece com frequência nos registros técnicos da Curitiba dos anos 1930 e 1940. Arquiteto e construtor, Chaves operava em um momento de transição estilística: entre o fim do ecletismo, com suas fachadas ornamentadas e telhados inclinados, e o surgimento de uma linguagem mais racional, funcional e limpa, precursora do modernismo brasileiro.
Seu projeto para Hercília Machado Lima — denominado originalmente “Projéto de Bungalow para a Snra. Hercilia Machado Lima” — reflete essa passagem delicada. O desenho, apresentado em duas pranchas detalhadas (hoje digitalizadas em microfilme no Arquivo Público Municipal de Curitiba), inclui:
- Planta baixa do pavimento térreo e superior
- Implantação no terreno
- Fachada frontal
- Cortes longitudinais (A-B e C-D)
Tudo isso com uma precisão técnica que revela tanto o rigor profissional de Chaves quanto o cuidado com o conforto e a estética da futura moradora.
A Casa: Um Bangalô de Dois Pavimentos na Rua Lamenha Lins
Apesar do termo “bangalô” geralmente evocar construções térreas e horizontais — inspiradas nas residências coloniais indianas adaptadas pelos ingleses —, o projeto de Chaves apresentava uma peculiaridade: dois pavimentos, algo incomum para o gênero, mas compreensível em um contexto urbano em expansão, onde o valor do terreno começava a pressionar para cima.
Com 194,00 m² de área total, distribuídos em dois níveis sobre alvenaria de tijolos — técnica dominante da época, que garantia solidez e durabilidade —, a residência foi projetada para acomodar com elegância e funcionalidade uma família de classe média alta. Os cortes revelam pé-direito generoso, escadas internas bem dimensionadas e provavelmente varandas ou janelões que dialogavam com o clima ameno da Serra do Mar.
O Alvará de Construção nº 1878/1936, emitido pela Prefeitura Municipal de Curitiba, autorizou a edificação, confirmando que a casa foi, de fato, erguida. Por décadas, talvez, serviu de refúgio, lar e testemunha silenciosa das mudanças na vizinhança: o crescimento do bairro, a urbanização acelerada, a substituição de quintais por edifícios.
A Perda: Demolição e a Fragilidade da Memória Urbana
Infelizmente, como tantas outras construções do período entre guerras, o bangalô de Hercília Machado Lima não resistiu ao tempo. Em 2012, o imóvel foi demolido, provavelmente para dar lugar a um empreendimento imobiliário mais compatível com a lógica especulativa do século XXI. Nada resta hoje no terreno da Rua Lamenha Lins, s/n — exceto os planos arquitetônicos preservados em arquivo, que clamam por atenção como documentos históricos.
Essa demolição simboliza uma ferida comum nas cidades brasileiras: a perda silenciosa do patrimônio afetivo e arquitetônico cotidiano. Não se tratava de um palacete ou de uma obra de Oscar Niemeyer, mas de uma casa comum — e justamente por isso, profundamente representativa da vida real de milhares de curitibanos que, como Hercília, sonharam com um espaço próprio, digno, belo.
Hercília Machado Lima: A Mulher por Trás do Nome
Embora os registros não revelem muito sobre sua vida — data de nascimento, profissão, descendência —, o simples fato de Hercília Machado Lima ter encomendado uma casa própria em 1936, com projeto assinado por um arquiteto, já fala volumes. Num Brasil ainda profundamente patriarcal, era incomum que mulheres, especialmente solteiras ou viúvas, fossem titulares de empreendimentos imobiliários. Sua iniciativa sugere independência, visão e, talvez, uma história de superação não contada.
Seu nome, gravado no título do projeto e no alvará municipal, permanece como um ato de resistência simbólica contra o esquecimento. Enquanto o concreto caiu, seu nome — e o do arquiteto que acreditou em seu sonho — sobrevive nos arquivos.
Legado: Entre Papel e Memória
Hoje, o projeto de Eduardo Fernando Chaves para Hercília Machado Lima é mais do que um conjunto de linhas em pranchas amareladas. É um documento de época, um retrato da aspiração residencial de uma classe social em ascensão, e um lembrete urgente da necessidade de proteger não só os monumentos, mas também as arquiteturas do cotidiano — aquelas que abrigaram vidas comuns, mas igualmente dignas de memória.
Que a demolição dessa casa nos ensine: preservar não é apenas manter paredes de pé, mas honrar as histórias que nelas habitaram.
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