quinta-feira, 19 de maio de 2022

Depoimento de um dos primeiros imigrantes ucranianos que chegaram ao Brasil, ainda no ano 1891. Ivan Pacevich instalou-se com sua família em Rio Claro, a poucos quilômetros de Mallet, contando a difícil situação que enfrentaram os imigrantes que formaram os primeiros núcleos de vida, a partir das colônias instaladas no Paraná:

 Depoimento de um dos primeiros imigrantes ucranianos que chegaram ao Brasil, ainda no ano 1891. Ivan Pacevich instalou-se com sua família em Rio Claro, a poucos quilômetros de Mallet, contando a difícil situação que enfrentaram os imigrantes que formaram os primeiros núcleos de vida, a partir das colônias instaladas no Paraná:


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Casa típica de madeira, primeiras habitações dos colonos.

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Colonos adaptam caminhão para extração da madeira.

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Assentamento inicial de Irati.

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Colônia Jesuino Marcondes.

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Colônia Itapará: 1. Plantação de milho e feijão; 2. Construção de moinho; 3. Colheita de trigo; 4. Escola; 5. Vista panorâmica.

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Implantação da Colônia Senador Correia.

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Colônia Vera Guarany: 1. Plantação do trigo; 2. Vista da Colônia; 3. Cultura de morangos; 4. Plantação de centeio; 5. Plantação de trigo; 6. Núcleo da vila.

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Início da Colônia Irati.

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Barco à vapor, de transporte no rio Iguaçu.
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Em seus carroções, os colonos enfrentavam as estradas lamacentas para vender suas colheitas nos grandes centros.
"ATÉ HOJE SINTO O GOSTO DO PRIMEIRO PÃO ..."
Depoimento de um dos primeiros imigrantes ucranianos que chegaram ao Brasil, ainda no ano 1891. Ivan Pacevich instalou-se com sua família em Rio Claro, a poucos quilômetros de Mallet, contando a difícil situação que enfrentaram os imigrantes que formaram os primeiros núcleos de vida, a partir das colônias instaladas no Paraná:
“Era o mês de maio de 1891. Estamos nos despedindo da nossa vila natal, de Serveriv, do Município de Zolochiv, para buscar no distante Brasil uma nova pátria. Eu, jovem de 15 anos, com meus pais Teodoro e Sofia e minhas três irmãs Maryna, Hannia e Iustyna. Partimos em quatro famílias, e juntos chegamos até Paranaguá. Lá essas famílias se separaram de nós – e já não nos encontramos mais com elas.
Até o porto de Hamburgo viajamos por nossa conta e de Hamburgo até o Rio já fomos por conta do governo. Embarcamos no navio no dia 6 de junho e chegamos ao Rio no dia 23 de agosto. Viajamos tanto tempo, porque naquele período no Brasil ocorria a revolução entre os federalistas e os “pica-pau”. Por isso, ficamos muito tempo parados na África e depois no Rio uma semana inteira não nos deixavam sair do navio. Do navio, com pequenos barcos nos levaram para a Ilha das Flores, onde tivemos que ficar em segurança por seis semanas. Da Ilha das Flores nos levaram de navio para o Porto de Paranaguá e dali para Curitiba. Curitiba naquele tempo era muito pequena, cheia de banhados e barro. Ruas estreitas, e na atual rua Rio Branco se podia atolar. A estrada de ferro existia somente de Paranaguá a Curitiba. – Em Curitiba nos alojaram em barracas fora da cidade, na rua 7 de setembro. Ali nós moramos 3 meses. Meu pai trabalhava temporariamente numa fábrica de mate, onde recebia 2,50 mil réis por dia. E nós com a mãe ficávamos na barraca. Nossa permanência em Curitiba se estendeu, porque naquele tempo estavam abrindo a estrada para Porto Amazonas. Finalmente concluíram a estrada, nos colocaram em carroças e levaram para Porto Amazonas, onde embarcamos numa balsa – e seguimos rio abaixo pelo Rio Iguaçu. Viajamos seis dias até Barra Feia. Em Barra Feia nos alojaram em cabanas de taquara. Ali, naquele tempo estavam abrindo a estada para a Colônia Rio Claro. Depois de duas semanas colocaram nossas coisas sobre mulas e nós a pé fomos para a Colônia Rio Claro. E lá de novo, nos alojaram em cabanas de taquara. Novamente tivemos que permanecer ali por dois meses. Naquele tempo estavam medindo as chácaras. Quando concluíram a medição, a nós coube o terreno n° 64, nós pegamos as coisas nas nossas costas e pelas picadas estreitas rumamos para o número 64. Na chácara nós já encontramos um barraco maior de taquara, que devia servir-nos como nossa casa. Como já em Rio Claro nós recebemos foices, enxadas e machado, meu pai começou a limpar o lugar perto do nosso rancho. Mais tarde roçamos e cortamos o mato, para poder plantar alguma coisa. A floresta era densa e escura, cheia de cobras e animais selvagens. Os animais selvagens chegavam até na frente da nossa casa, por isso passamos muito medo e preocupação, para espantá-los dali. No roçado meu pai semeou manualmente 5 litros de centeio. A terra era nova e a primeira colheita foi muito grande, porque desses 5 litros nós colhemos 96 quartas. Meu pai fabricou uma mó manual ‘zhorna’ e nela nós moemos a primeira farinha. Até hoje sinto o gosto do primeiro pão – porque nós não tínhamos comido pão desde a Haletchená. No começo nos sentíamos muito estranhos, porque ficamos por 3 anos em ambiente puramente polonês. Só após três anos chegaram à colônia Rio Claro os primeiros ucranianos (8 famílias), a família dos Povidaiko, Scheremeta, Bilenkyi, Pasko, Koszan, Krassovskyi, Maruschka, Justechen. Quando soubemos que eles chegaram a Rio Claro, nós todos de casa fomos visitá-los e saudá-los com o nosso pão. Porque por esse tempo nós já tínhamos organizado nossa propriedade, já tínhamos um pouco de terra limpa, o próprio pão e sua própria vaca, que compramos com o dinheiro que eu ganhei com meu trabalho, - por 60 mil réis (uma vaca com uma novilha de um ano e um pequeno terneiro).
Igreja, no começo nós não tínhamos nenhuma. O Natal e a Páscoa nós comemorávamos em casa. Meu pai benzia a ‘paska’ com água benta e nós todos juntos rezávamos o Pai-Nosso “Otche Násch’, e isso era toda a nossa cerimônia de comemoração. Só em 1897, com a vinda do Padre Rosdolskyi, na Colônia 5 foi construída a primeira Igreja. Duas ou três vezes ao ano nós íamos a pé pelas picadas até à Igreja na Colônia 5. Geralmente caminhávamos dois dias. No ano de 1899 começamos a construir a Igreja na Serra do Tigre.
O primeiro tronco do fundamento da Igreja nós cortamos com meu pai e depois todos o carregamos nas costas. Até o Padre Rosdolskyi ajudava. E assim nas costas o povo carregou todo o material, dos fundamentos até às taboinhas do telhado. Concluímos em 1900.
Nesse tempo já até as estradas eram melhores, e era mais fácil chegar à Igreja. Estrada-de-ferro ainda não havia nenhuma. Dorizon e Mallet ainda não existiam, havia só floresta negra e taquaral. Em 1892 começaram a construir a estrada-de-ferro de Curitiba a Ponta Grossa e dali a Porto União. Só em 1907 a estada chegou a Mallet e em 1908 no Porto. Foi então que começaram a construir casas perto das estações da estrada-de-ferro e assim começaram a surgir aqui as primeiras cidadezinhas. Não havia nenhuma escola, não havia professores. Ensinavam aqueles que sabiam escrever. Em 1905 construíram a primeira escola em Serra do Tigre e o primeiro professor era Mykola Futerko. Ali também existia a primeira Sociedade de Mohyla. Essa Sociedade se desenvolvia muito bem. Infelizmente durou só até à morte do Pe. Rosdolskyi. Em Curitiba, em 1907 era publicado o jornal “Zoriá”, e pagava-se a assinatura anual por 7 mil réis. E assim os anos iam passando. Nós já tínhamos a estrada-de-ferro bem pertinho e Dorizon aos poucos ia crescendo. Ali foi construída em 1910 uma escola e o primeiro professor foi o Sr.Valentin Kutz, que veio ao Brasil em 1911. Ali também foi fundada a primeira Sociedade em nome de Tarás Chevtchenko – e a escola também era denominada de Sociedade Chevtchenko. O mais atuante era o senhor Antin Firman, em cuja casa se concentrava toda a vida da comunidade. Em Dorizon aconteceu em 1912 o primeiro Congresso dos Ucranianos no Brasil.
Agora, após 60 anos de minha vida, tudo o que nós primeiros imigrantes passamos aqui me parece um sonho. E como no sonho vejo a floresta negra, tocos queimados e picadas estreitas. Os mais velhos já morreram e deixaram o lugar para os mais novos. Mas também a esses os anos já estão curvando para o chão. É uma pena que se está esquecendo tudo o que nós passamos e tudo o que nós fizemos, porque aos mais jovens não interessam muito os primeiros anos de nossa vida no Brasil. Mas é uma pena, porque tudo o que aqui existe, campos limpos e estradas, tudo isso está coberto com o nosso suor, e por vezes sangue. Nas páginas do jornal só se consegue recordar piedosamente em breves fragmentos – mas seria muito importante que alguém fosse para as colônias e procurasse por aqueles que foram testemunhas vivas do corte das florestas e em base ao testemunho deles escrevesse a história de nossa colônia no Brasil. Porque os anos passam – e cada ano mais e mais nos derruba e nos deixa cada vez menos numerosos. Ivan Pacevich.".
(Fonte: rcub.com.br - Fotos: Pinterest, novomilenio.inf.br, mobile.radionajua.com.br)
Paulo Grani

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