domingo, 19 de março de 2023

O INÍCIO DA LITOGRAFIA EM CURITIBA

 O INÍCIO DA LITOGRAFIA EM CURITIBA

"Na Curitiba de 1880, o desejo de ser moderno passava pela revigoração dos meios gráficos locais, o que fez com que o carioca Luis Coelho, proprietário da primeira livraria da cidade e freqüentador de rodas literárias, colocasse para funcionar o primeiro prelo mecânico, gerando mudanças técnicas que implicaram diretamente na melhoria da qualidade e na ampliação das possibilidades de impressão do que se publicava no Paraná.
Não obstante, informado sobre os recursos disponíveis em centros como o Rio de Janeiro, Coelho aspirava por uma oficina litográfica para o seu projeto de modernização, e isso só se tornaria possível em 1884, com a chegada em Curitiba do artista, ilustrador e litógrafo catalão Narciso Figueiras. Bacharel em belas artes, Figueiras nasceu em Gerona, na Espanha, tendo residido em Cuba antes de vir ao Brasil, vindo a atuar como ilustrador de importantes revistas do Rio de Janeiro como Entre’acto, Bohemio e a Comédia.
Atraído pelas possibilidades de aplicar a técnica de impressão de imagens nos impressos locais, o artista logo percebeu a necessidade de melhorar a qualidade gráfica do material produzido nas tipografias, o que o motivou a abrir, em 1885, a Litografia do Comércio, na rua Trajano Reis, “em cujas dependências montou um ateliê de iconografias, onde se formaram os primeiros litógrafos do estado”.
Como ilustrador em vários periódicos, foi também responsável pelo surgimento de toda uma geração de caricaturistas e ilustradores. Atuando na formação de profissionais em seu próprio estabelecimento, orientou jovens artistas como o escritor e jornalista Silveira Netto (1872-1942), os quais aprendiam o ofício na prática, no cotidiano da oficina.
Em anúncio publicado na Revista do Paraná em 23/10/1887, as oficinas da "Litografia do Comércio" eram descritas como "montadas a capricho, possuindo todos os melhoramentos modernos admittidos na arte litographica, dispondo de excellentes machinas para todos os trabalhos de impressão, gravura, corte e perfuração e papeis, variadíssimo sortimento de papeis, tintas, cartões e um pessoal habilitado a desempenhar qualquer obra." Realizava tambem "ilustrações de jornaes, dezenhos, mapas e todo e qualquer trabalho concernente a esta arte".
No contexto do Paraná oitocentista, a oficina de Figueiras ofereceu as condições necessárias para que o educador e jornalista paranaense Nivaldo Braga (1852-1924) fundasse a Revista do Paraná, considerada a primeira revista ilustrada da Província. Curitiba era assim inserida em um período de educação do olhar e de redefinições de valores estéticos, em que já havia acontecido o boom de cartões postais ilustrados e afins, nos quais estão incluídos a litografia e as revistas ilustradas - que circulavam como poderosos aliados na difusão da imagem fotográfica impressa em seu momento de massificação.
O primeiro número da Revista do Paraná saiu em 23/10/1887, fato que levou Figueiras a ser considerado o precursor da litografia no cenário paranaense. Mesmo tendo sido acolhido com entusiasmo pela sociedade e pelos intelectuais paranaenses, o periódico teve existência curta, tendo apenas sete números publicados.
Sensível ao momento cultural vivido por Curitiba, movimentada pelo aumento do fluxo migratório e com a resultante fundação de grêmios artísticos, oficinas artesanais, associações recreativas, entidades assistenciais de toda sorte, Nivaldo Braga idealizou uma publicação com forte acento regional, nela atuando como redator-proprietário. A ele cabia a seleção dos textos e das ilustrações locais. Além dos textos sem assinatura, assumidos como sendo do editor da revista, outros eram escritos por Braga sob os pseudônimos de “Jacaná”, “Yta-uba”, “Tong-tong”, “Frege-moscas”, “Bentevi” ou “Ita-cyuna” aos quais por vezes acrescentava: “repórter da revista”.
Cabia a Narciso Figueiras a gravação das imagens em litografia, todas elas impressas em página inteira em sua oficina, e as partes contendo texto eram enviadas para serem impressas na tipografia de Luís Coelho.
Com formato de 27,5 X 38 cm e periodicidade semanal, a publicação manteve durante todos os números a mesma diagramação, apresentando o texto em três colunas e as imagens inseridas sempre às páginas 1, 4 e 5. O número de páginas variava entre 8 e 9, sendo uma delas dedicada a anúncios da Litografia do Comércio, da Tipografia da Revista do Paraná, então em processo de instalação, e da Tipografia de Luís Coelho.
Os originais das páginas da revista pertencem ao Instituto Neo-pitagórico, cujas ilustrações foram impressas em tons sépia, verde-claro e cinza, uma possível tentativa, por parte da editoria, de tornar os exemplares atraentes ao público leitor.
Em texto de abertura da revista, Nivaldo Braga ressaltou a importância da imprensa, por ele definida como um “terceiro Poder do Estado”:
"Ella age sobre o animo da massa popular, dirigindo-lhe a opinião, acerca dos acontecimentos côetanos, cuja contemporaneidade estiver sob a acção do dominio publico, do mesmo modo que Neptuno, no Paganismo, actuára outr’hora sobre as ondas oceânicas, incitando ou acalmando as tempestades athmosphericas. (REVISTA DO PARANÁ, Curitiba, 23/10/1887).
Continuando, o editor afirmou que a revista manter-se-ia “neutra na lucta política dos partidos militantes”, o que não significava abrir mão de criticar, “sem nunca descer a offensas pessoaes, e somente em thése, os seus erros e desmandos, ou applaudir, ecarecer e encomiar as suas acções meritórias”.
Com relação aos assuntos tratados, Braga declarou que a revista seria consagrada aos interesses gerais e locais da Província, ao clero paranaense, às ciências, letras, artes e indústrias, e às publicações “ineditoriaes, tais como annuncios, avisos, etc.”. Esses assuntos eram abordados em seções como a “Galeria Paranaense”, dedicada a biografias de paranaenses e assuntos regionais, “Alviçaras”, responsável pelas notícias da cidade, “Seção religiosa”, que contemplava biografias de eminências do clero e monumentos religiosos; e os “Ineditoriais”, com conteúdos mais críticos e satíricos em relação à sociedade paranaense.
Da mesma forma que outros periódicos da época, como a Revista Illustrada, do Rio de Janeiro, ou a Galeria Illustrada, de Curitiba, ambas em circulação em 1888, a Revista do Paraná se fazia identificar por meio de um frontispício, o qual apresenta, além do título, composto com uma grafia livre e irregular, também uma imagem repleta de conotações simbólicas. Em destaque, se vê as imagens de duas mulheres. A da esquerda, portando uma coroa, poderia estar representando a monarquia, hipótese reforçada pela presença de detalhe do brasão imperial do Brasil do segundo reinado, localizado no centro inferior da composição. Esse detalhe iconográfico contradiz, de certa forma, a neutralidade política afirmada por Braga. Já a figura da direita contém semelhanças com Minerva, deusa grega da sabedoria, a qual está ligada aos elementos que representam campos do conhecimento: a engrenagem (engenharia), o caduceu (medicina), o globo (geografia) e a bigorna (metalurgia).
A presença deste elemento denota a intenção inicial, não totalmente concretizada ao longo dos fascículos, de abordar assuntos relacionados a conhecimentos de caráter mais universal. Ao fundo do frontispício, podemos ver representadas paisagens litorâneas e montanhosas, relacionadas à topografia paranaense. A imagem contém o monograma com as letras “NF”, iniciais de Narciso Figueiras, e a inscrição “Lith do Commercio Coritiba”, identificando a oficina e a cidade de procedência da imagem."
(Adaptado de: anpap.org.br)
Paulo Grani

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Funcionários da firma de Alexandre Schroeder, produziam litografias em geral.

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Interior da Impressora Paranaense, década de 1920.

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Interior da Impressora Paranaense, década de 1920.

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Sede da Impressora Paranaense, inaugurada em 1888, na esquina da rua Riachuelo com Presidente Carlos Cavalcanti, em foto de 1905.
Foto: Acervo Casa da Memória

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Litografia de Narciso Figueras, reproduzindo gravura de Curitiba em 1855, publicada na Revista do Paraná, de 30/10/1887.

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Litografia reproduzindo desenho do episódio da batalha entre o navio inglês Cormorant e a Fortaleza de Paranaguá, publicada na Revista do Paraná, de 15/11/1887.

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