Bunkers secretos em Curitiba não são lenda. Conheça
Não é história da Carochinha: Curitiba tem abrigos antiaéreos. Depois que o mundo descobriu os horrores das bombas aéreas na Guerra Civil Espanhola a partir de 1936, o medo de que bombardeios chegassem a qualquer dia deste lado do Atlântico foi o que impulsionou a construção de diversos bunkers privados e públicos pela cidade.
“O medo de ataques aéreos habitava o imaginário da época e ganhou contornos cada vez mais assustadores com o estouro da Segunda Guerra Mundial”, lembra o historiador Marcelo Sutil, da Fundação Cultura de Curitiba.
Apesar da distância segura dos conflitos que se alastravam pela Europa, África e Pacífico, por aqui a paranoia também se traduziu em hábitos de racionamento de alimentos e exercícios públicos de blecaute. O empresário Luiz Groff, 80, viu isso acontecer com o próprio pai, João Batista Groff, um dos pioneiros do cinema documental brasileiro, que veio a falecer na década de 1970.
Do dia para a noite o pai foi acusado de ser espião alemão e ficou encarcerado por 18 dias, entre outras coisas, por desrespeitar um blecaute na casa da família na Rua Nunes Machado. “Um oficial montado em uma bicicleta começou a apitar em frente à residência porque estávamos com as luzes acessas. Meu pai saiu à janela e gritou: ‘Os alemães não têm avião para chegar a Curitiba. E não desperdiçariam uma bomba aqui. Sairia mais caro do que o valor da cidade’”, relata Groff.
Nossos abrigos
Além de testemunhar a desventura do pai, Groff trabalhou e morou em um casarão com bunker no Alto da XV, logo atrás do Museu do Expedicionário, na esquina das ruas Saldanha da Gama e Benjamin Constant. A mansão de linhas ecléticas resiste até hoje. E o abrigo antiaéreo também, com os tradicionais respiros (pequenas aberturas) na base de pedra da residência.
Porém, há quem diga que esses espaços subterrâneos não passam de solução estrutural e higiênica para afastar a construção da umidade do chão. Como é o caso do antigo Clube Concórdia, hoje parte do Clube Curitibano, e do Edifício Marumby, em frente à Praça Santos Andrade. De autoria do arquiteto curitibano Romeu Paulo da Costa, o prédio virou lenda nesse quesito. A arquiteta Lauri da Costa, filha de Romeu, não sabe confirmar a verdadeira intenção do pai com a área subterrânea, mas ressalta que o projeto foi um dos primeiros que ele fez, em 1948.
O abrigo do Moinho Rebouças, atual sede da Fundação Cultural de Curitiba, também desperta dúvida. A curva do teto e o fato de não estar no subterrâneo indica que a estrutura não era um abrigo, mas um depósito de grãos, o que se encaixa com a vocação do lugar, que desde 1930 produziu farinha de trigo e biscoitos sob a marca Soberana. Hoje é um arquivo da instituição.
Com o Colégio Estadual do Paraná (CEP) é diferente. Pesquisa acadêmica recente do arquiteto Marco Nogara na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) prova por A+B que a arquitetura do colégio foi adaptada do projeto de 1938 da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman) no estado do Rio de Janeiro e confirma a existência do abrigo antiaéreo no CEP. “O projeto arquitetônico foi oferecido ao governador da época, o interventor Manoel Ribas, e foi adaptado localmente. Por isso a escola tem o mesmo tipo de arquitetura racionalista e monumental para inspirar a disciplina e organização esperada de uma instituição militar”, explica Nogara. “E com bunkers de aproximadamente 300 m² ladeados por fossos de contenção para resistir ao impacto de qualquer bomba aérea.” Hoje a área subterrânea é espaço multiuso para o colégio.
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